“Escrevo serto por linhas tortas”

Marcar sempre foi uma atitude humana, isso nos propiciou uma aproximação com a linguagem gráfica, do desenhar na pedra aos marcos em terra para fazer o norte do caminho com rastros. O homem marcou seus animais, os cavalos, as bestas, as éguas. Nos caminhões não foi diferente. O motorista toma a arte da palavra e da pintura e marca seu transporte, criando uma identidade na estrada com uma poética.

Há pintores especializados em paralamas e parachoques de caminhões. Isso deu margem à arte de inspirar-se.

Clarice Lispector falou: “Quando vejo num caminhão uma placa dizendo: ‘Inflamável’ – me encho de glória” (Um Sopro de Vida, 1978).

Na música, compositores também se inspiraram no tema, como a canção Filosofia de Estrada, de Erasmo Carlos: “… Encontrei minha dama/Na linguagem da estrada/mulher que se ama/Corra menos rapaz/que é pra vê-la bem mais/Se amar é pecado/Eu não tenho perdão/Pois só faço o que manda/o meu coração/Como diz a legenda/do meu caminhão/Pelas curvas do caminho/Vou com a dama na cabeça/sei que eu não vou sozinho/minha ausência ela disforra ouvindo rocks/Mas na falta do seu corpo,/só me resta ler os parachoques”.

Há uma infinidade de frases que se misturam entre versos de amor, sexo, família, política, religião, questões econômicas, sempre permeadas de humor, clichês e reflexões. Veja algumas colhidas de parachoques brasileiros:

  • Pra que beijar no rosto se a boca está tão perto.
  • Triste a vida do homem que vive a vida envolvida na vida de uma mulher da vida.
  • No dia que chover mulher, quero uma goteira em casa.
  • Pobre é igual a pneu velho. Só vive na lona.
  • Por falta de roupa nova, passo ferro na velha.
  • Aos que falam pelas costas, obrigado. É sinal que estamos na frente.
  • Dinheiro não traz felicidade, mas ajuda a sofrer em Paris!
  • Deus iscréviu sértu… mais eu não!
  • Não sou orquestra, mas vivo no conserto.
  • Se o Bach é bom, o Chopin é Brahms!
  • Agora vou votar nas putas… Cansei de votar nos filhos delas.

 


*É paraibano, mestre e doutor pela ECA-USP. Professor de Teoria Literária na Anhembi-Morumbi, professor colaborador da ECA-USP, Fundação Escola de Sociologia e Política-FESP, além de contista e poeta com livros publicados (paulo@brasileiros.com.br).


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