Fotos Reprodução – Wilson Dias/Agência Brasil
Dor, lágrimas e muitas perguntas sem respostas. A terrível tragédia que deixou 234 mortos na boate Kiss, em Santa Maria, mobilizou o Brasil e deixou uma importante questão no ar: o que pode ser feito para que novas tragédias dessa natureza sejam evitadas?
Para o professor doutor Valdir Pignatta e Silva, especialista em segurança contra incêndios e docente da Poli/USP, os materiais utilizados nestes locais precisam ser mais bem analisados. “Todo o mobiliário, cortina, papel, inclusive o revestimento de piso, teto e parede, são materiais combustíveis. Isso alimenta o fogo, mas como é que eu resolvo esse problema? Existem maneiras de resolver, mas é uma questão de projeto”, afirma.
Segundo ele, os relatos noticiados sobre a tragédia dão a entender que o material utilizado no isolamento acústico da casa noturna não era seguro e adequado para o ambiente. “Você precisa saber o tipo do material, a quantidade. O que não pode, especialmente no teto porque o fogo sobe, é ter um material combustível. Por tudo que se viu leva a crer que havia um revestimento combustível no teto. Não era pra ter, não pode ter”.
Professor doutor da Unicamp e especialista em explosão e propagação de fogo e fumaça, Sávio Souza Venâncio Vianna acredita que o cerne do problema não está na legislação, e sim na maneira como ela é aplicada. Para ele, é necessário haver mais treinamento para as equipes de segurança que atuam nestes locais.
“Nós temos que ter profissionais treinados para ações emergenciais e de contingência, mas para que tenhamos uma ação energética e pontual nós temos que entender o que aconteceu. Pegar a legislação, ver o que estava sendo seguido e o que não estava pra ver o que está errado. No momento, a atitude certa não é propor nada, é entender o que aconteceu para ver as lacunas que precisam ser preenchidas na questão da segurança”, diz.
Vianna afirma que, em geral, os projetos arquitetônicos atuais já levam em conta o risco de acidentes, mas destaca que existem ferramentas eficientese precisas de prevenção que ainda são pouco utilizadas no País, como softwares que simulam a dinâmica dos incêndios em ambientes fechados, com os quais ele trabalha.
“O que está começando a acontecer agora no Brasil, que é uma coisa que já tem certo histórico na Europa e nos EUA, é a utilização de ferramentas computacionais que simulam situações de incêndio em ambientes confinados para entender a dinâmica do fogo e da fumaça, dimensionando adequadamente o tamanho das rotas de fuga, das portas, do caminho a ser tomado e da localização delas”, explica.
Além das medidas de melhoria estrutural e de fiscalização, o professor Pignatta e Silva crê que é necessário mudar o modo de pensar dos cidadãos brasileiros. Para ele, os habitantes precisam estar cientes dos riscos e preparados para enfrentar situações emergenciais. “Quanto mais fiscalização melhor, mas tem que ver o outro lado também. Não há cultura de segurança contra incêndio para nós brasileiros. Nós também devemos cuidar da nossa segurança. É preciso perceber que aquele local ali é um forno, como é que eu vou entrar em um forno? Não se deve entrar.”
Já Vianna também alerta para a necessidade de que os materiais utilizados nestas estruturas sejam especiais a fim de evitar tragédias. “Existem materiais diferenciais e tipos de revestimento que retardam a propagação de incêndio, geram menos fumaça. Também há grupos de pesquisadores científicos que trabalham nessa área de material exatamente nesse sentido, de usar materiais que possam fazer com que a queima seja mais lenta e gere menos fumaça, evitando que o acidente tome proporções como o de Santa Maria.”
Segundo Pignatta e Silva, é necessário que essa consciência de segurança seja ensinada aos brasileiros desde cedo. “Risco é a soma de perigo com consequência. Perigo de um incêndio é pouco, mas a conseqüência é catastrófica. A gente deveria ter mais cuidado com isso, as escolas deveriam ensinar alguma coisa sobre esse assunto. Embora existam muitos incêndios no mundo, um a quatro segundos, a probabilidade é pequena, porque nós não vemos incêndio todos os dias, então muita gente acaba não tendo preocupação com a segurança, o empresário economiza e os desastres acontecem”, conclui o professor da Poli/USP.
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