“Tive um dos meses mais agitados dos últimos tempos”, conta, animado, Leonardo Salvador, de 18 anos, quase trinta dias depois do primeiro contato dele com a reportagem de Brasileiros, do qual foi personagem da reportagem de capa deste mês que se vai. De fato, a vida de Salvador mudou neste período: sua mãe, Fabiana, passou por uma cirurgia para retirada de uma das mamas, depois de um longo tratamento contra um câncer; ele conseguiu o seu primeiro emprego, de auxiliar administrativo em uma loja de peças para veículos, em Santo André, no ABC Paulista, onde mora; e se viu pela primeira vez na frente de uma urna para participar de uma eleição presidencial.
A votação no primeiro turno foi mais tumultuada, conta ele. “Decidi ir para a sessão eleitoral à tarde, porque queria almoçar com a minha família e também porque imaginei que encontraria a escola onde voto (EMEIF Cidade de Takasaki, na Vila Alzira Franco, em Santo André) lotada nos primeiros horários do dia. Acertei: cheguei sozinho e, de fato, não havia fila nem ninguém votando naquela hora. Fiquei ansioso no procedimento obrigatório antes de entrar na cabine de votação, aquela coisa de dar o título de eleitor ao mesário, assinar o caderno, ver o outro mesário digitando um número no equipamento, enfim. Quando entrei na cabine, o número 1 não funcionava. Fiquei apertando, apertando, e a urna não reconhecia. Avisei o pessoal que estava na retaguarda, que me ajudaram. Depois deu tudo certo: estava com todos os números anotados, então eu acho que demorei, no máximo, uns 40 segundos para votar em todos os meus candidatos”, diz. “No segundo turno, foi ainda mais rápido. Fui no mesmo horário, mas já estava com o número na cabeça. Entrei, digitei e saí. Não deu nem dez segundos”, completa.
Leonardo votou em Dilma Rousseff (PT) para presidente nos dois turnos, depois de alguns poucos debates com a família. Segundo ele, a família inteira vota, historicamente, no partido. Quem mais conversou sobre política com Leonardo foi um amigo professor de história e que também defendia o voto na atual presidenta. “Eu não queria a mudança que o Aécio falava na televisão, porque eu sabia que, se ele ganhasse, ele ia fazer coisas apenas para os ricos, e os pobres, gente necessitada, como eu, voltaria a ser como era antes do PT”, observa.
Salvador, negro, de uma família de classe baixa e com instrução básica em escolas públicas, foi personagem da reportagem de capa de Brasileiros de outubro, que esmiuçou os 25 anos de democracia no Brasil, contados a partir da eleição presidencial de 1989, quanto uma ampla camada de pessoas tiveram acesso ao voto direto para presidente e passaram a gozar – por meio da Constituinte de 88 – de maiores liberdades civis. Na matéria, Brasileiros mostra que Leonardo, na maior parte da história do País, não teria sequer direito ao voto. “Todo mundo da minha família leu a revista, além dos meus amigos e alguns colegas do curso (Salvador estuda Farmácia por meio do Pronatec na Universidade do Grande ABC). Eu nunca tinha participado de algo assim, então todos ficaram felizes”, conta.
Apesar da felicidade em ter participado das eleições, Leonardo se mostra preocupado com os recentes episódios pós-pleito. “Essa história de separação de São Paulo do resto do País me deixou muito incomodado. Confesso que fiquei até com medo”, revela. Após a divulgação do resultado e a reeleição de Dilma, vários grupos protestaram contra a vitória da petista, pedindo o impeachment da presidenta e condenando nordestinos, onde o partido tem votação mais expressiva. “Gente que não entende o que é democracia, né?”, finaliza.
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