Estado de Direito ou racismo?

A esta altura o mundo já sabe: no Estado da Flórida – assim como em outros 19 Estados americanos – uma pessoa pode alvejar outra, apenas por se sentir ameaçada. Seja lá o que provoque tal sentimento. É a chamada lei “Stand Your Ground” (“mantenha seu território”, em tradução livre). Porém, o cidadão George Zimmerman foi absolvido, no sábado, 13 de julho, por um júri de seis mulheres sob outra alegação: a de legítima defesa. Ele havia matado a tiro o adolescente Trayvon Martin, 17 anos, em 26 de fevereiro de 2012.

Pouco importa agora a estratégia adotada com sucesso pela equipe de advogados de defesa. Outras questões surgem nos corações e mentes americanos. A primeira, antiga e ainda sem resolução, diz respeito ao racismo no país. Trayvon era negro. Se fosse branco teria morrido? A cor de sua pele influiu ou não na decisão de Zimmerman em acionar o gatilho? Há enormes desconfianças, nas multidões que saíram às ruas de várias cidades, e no Departamento de Justiça, de que o disparo teve muito a ver com a herança étnica da vítima. Estuda-se agora uma ação legal federal contra o matador pela violação dos direitos civis do morto.

E mais: mesmo num país onde a Segunda Emenda da Constituição garante aos cidadãos o direito de possuir armas, qual é o limite para o uso delas? Imagine que um turista brasileiro está passeando em Sanford – centro da Flórida, onde Trayvon morreu. Ao encontrar um nativo o brasuca faz cara feia. Isso pode ser interpretado como ameaça e justificar disparos da arma do cidadão local? Caso o atirador tenha um advogado de defesa razoavelmente competente, o ato extremo será justificado e o réu absolvido. Portanto, caro turista, pense bem antes de sua próxima viagem à DisneyWorld. Recomenda-se que sua aparência seja das mais submissas. Vai que o Pateta está maquinado e se apavora com sua presença…

Por outro lado, confirma-se mais uma vez, que no sistema jurídico dos Estados Unidos impera a máxima de que um réu só pode ser condenado caso tenha sido provada sem sombra de dúvida a sua culpa. Trata-se de uma regra exemplar, num mundo onde tantos cidadãos inocentes estão presos, mesmo sem que se tenham certezas de que eles cometeram de fato o crime de que foram acusados.

O que aconteceu no julgamento de Zimmerman foi exatamente a aplicação dessa regra. A promotoria não conseguiu provar sem sombra de dúvida a culpa do réu. E antes mesmo de iniciados os trabalhos no tribunal, vários analistas, aparentemente imparciais, já alertavam que o veredicto tinha enormes possibilidades de ser o de inocência. Não era possível provar sem dúvidas razoáveis as intenções e atos do matador. Estado de Direito pleno tem dessas coisas.


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