Férias paulistanas: frio, chuva, gripe, fretados…

Caros leitores,

este post foi atualizado às 17:40 para publicar ao final do texto uma bela crônica enviada ao Balaio pelo leitor Simei de Almeida, do Acre, que muitos de vocês já conhecem. Vejam lá, sob o título “Mundo bão, sô!”.

Ufa! Ainda bem que julho está acabando. Juntou tudo neste mês de férias: muito frio com muita chuva, gripe suína, pessoas andando com máscaras cirúrgicas na rua 25 de Março, protestos dos passageiros de ônibus fretados, muita confusão, congestionamentos no trânsito

Nesta época do ano, sempre gostei de ficar na cidade. Habitualmente esvaziada de carros e gente, São Paulo fica mais serena e habitável. A grande metrópole nos convida a fazer passeios por lugares aonde a gente não costuma andar, as filas desaparecem e dá até para ir sem susto ao cinema e ao teatro.

Mas, desta vez, foi melhor ficar em casa. Foi um mês de julho para se esquecer. A cidade virou um inferno. Quando todo mundo voltar das férias com seus carros, deve ficar tudo pior ainda, sem que o problema dos ônibus fretados tenha sido resolvido, no vai e vem da Prefeitura.

Vamos ter ainda mais carros circulando pela cidade em lugar dos ônibus proibidos, que atrapalhavam mesmo o trânsito em alguns pontos, mas ao menos eram uma alternativa ao transporte coletivo público, que todos sabemos caótico e insuficiente.

De uma hora para outra, sem planejamento e sem oferecer alternativas aos milhares de passageiros dos fretados, a Prefeitura resolveu simplesmente proibir estes ônibus de circular e estacionar.

Os congestionamentos e transtornos que eles causavam nas grandes avenidas foram apenas transferidos para ruas residenciais, os moradores reclamaram e a Prefeitura teve que voltar atrás.

Depois de mexer com a vida de muita gente, sem pensar nas consequências, agora acho que nem o prefeito Gilberto Kassab sabe o que vai fazer na segunda-feira, quando São Paulo voltar à sua rotina, depois das férias de julho.

Para complicar ainda mais o cenário de agosto, a epidemia de gripe suína fez com que a maioria das escolas adiasse a volta às aulas por duas semanas, causando mais transtornos para milhões de famílias.

E a previsão do tempo para os próximos dias não é nada boa: continua instável, com temperaturas baixas e o céu nublado escurecendo às vezes no meio do dia, sujeito a chuvas e trovoadas.

Como trabalho em casa, não ando de ônibus fretado, nem tenho filhos em idade escolar, não há nada de pessoal neste desabafo. Uma das tarefas do repórter, com ou sem diploma, é justamente se colocar no lugar dos outros para registrar e contar o que seus leitores estão sentindo.

É bom, mas não é nada fácil ser paulistano. Se alguém tiver boas notícias das férias em outros lugares do país, pode mandar que eu agradeço – até para melhorar o astral do Balaio cinzento como o tempo desta quinta-feira de fim de julho.

MUNDO BÃO, SÔ!

Neste mundo novo da internet, em que todo mundo é, ao mesmo tempo, emissor e receptor de informações, leitor e autor, autor e leitor, não importa a ordem, acontecem coisas fantásticas.

Mal coloquei no ar o post acima sobre a minha cidade, recebo uma belíssima crônica do nosso fiel leitor Simei de Almeida, lá do interior do Acre, em que ele fala das as diferentes vidas entre as grandes e as pequenas cidades.

Simei é um cidadão brasileiro de 54 anos, ex-paulista de Ribeirão Preto e ex-metalúrgico, que mora há 25 anos foi para o Acre, onde exerce a atividade de micro empresário e micro pecuarista, além do ofício de escritor amador pelo prazer de escrever.

Conta ele: “Troquei a vida de progresso dos centros chamados civilizados, de ônibus lotados, de batida de relógios de ponto, por esta vida humilde aqui da Amazônia.

Aqui consegui, honestamente, certa independência econômica, formo no ano que vem um filho em Direito pela UFAC e tenho uma filha de 11 anos com deficiência física causada por uma lesão cerebral.

Aqui tenho plena convicção de que posso dar à menina melhor qualidade de vida. Ela está cursando a 5ª séria em escola normal. Não tenho curso superior, apenas o nível técnico.

Nem sempre sou a pessoa que demonstro ser nos debates calorosos de política e politicagens. Gosto de coisas muitas amenas. Acho que assim a gente vive melhor.

No Acre, conheci e vivi a política velha dos coronéis da política e estou vivendo a nova política de progresso deste estado, implantada pelo PT, por seu mentor aqui do Acre, o ex-governador Jorge Viana. Sou PTzinho e Lula do pé rachado e como defeito sou corithiano”.

Para entrar no blog de Simei:

http://www.somosdaselva.blogspot.com

Abaixo, reproduzo a crônica “Mundo bão, sô!”, de Simei de Almeida:

Existem dois mundos: o mundo de quem gosta de agitação, corre-corre, buzinações, gás carbônico, diferente do mundo dos “oi sô”.

Nada sou contra quem gosta de ficar em cima de um viaduto vendo a sintonia dos carros se movimentando, frenagem por igual, uma fila vai e outra vem.

Chega ser contagiante ver a habilidade dos condutores dos veículos e motociclistas fazerem suas obrigações na condução de suas respectivas máquinas, às vezes até inconscientes do que estão fazendo, conduzindo seus carros por vias super movimentadas pela praticidade do dia-a-dia. Já fazem a condução pelo seu subconsciente pelo hábito de quem faz aquilo todos os dias.

Grandes metrópoles, progresso, grandes executivos, oferta de consumo e vítimas do consumo.

Alberto vai trabalhar, sai de casa as 04:00 horas da manhã para pegar o ônibus e depois o metrô. É possível que chegue ao trabalho lá pelas 07:00h. Antes de sair ele vai à cama de sua Aninha, sua filhinha, e lhe dá cheiro, ela ainda dormindo.

Alberto, devido seu computador ainda ser um Pentium ele trocou por um Dual Core, mais uma promoção de uma TV de LCD de 32 polegadas nas Casas Bahia, tem que fazer umas horas extras para ajudar no pagamento das prestações do Dual Core e da TV LCD.

Depois da hora extra, mais metrô, mais ônibus. Alberto chega em casa lá pelas 22:00h. Sua filhinha já está dormindo. Nesse corre-corre, talvez Alberto a verá acordada para lhe dar um abraço e um cheiro somente no final de semana.

E assim é a mesma coisa para João, Dna. Marta, Dna. Francielli e tantos Antónios.

Pô, mais tem uma coisa boa nisso tudo! Num domingão Alberto pode ficar em frente da TV LCD de 32″ para assistir estes programas de palco que rolam nas telinhas.

Uma pessoa que vem de fora, não adianta pedir informação pro Alberto no meio da rua. Ele tem muita pressa para chegar no trabalho ou fazer uns afazeres fora dele. Se pedir informação, talvez a receberá. Mas começa a ouví-la numa esquina e acaba de ouví-la na outra esquina, não dá para dar informação parado!

Vou à casa do Alberto e pergunto:

_ Você sabe onde mora o Sr. Custódio?

– Sei não, seu moço, vai aí no vizinho e pergunta!

Vou na casa do vizinho e pergunto:

_ Você sabe onde mora o Custódio?

– Custódio do quê?

– Custódio de Mato Arruda!

– Sou eu mesmo moço.O Alberto não conhece o vizinho.

Nas cidadezinhas, lá nos Rincão do Brasil, a coisa é bem diferente.

Sai-se na rua para resolver determinado assunto que você faria em trinta minutos, e você acaba gastando três horas para resolvê-lo. Não há contentamento em apenas dizer: boa tarde “Seu Jão”, como tem passado? Não, o problema é perguntar como tem passado. Porque o Seu Jão vai lhe dizer como está passando, ali vai um tempão. Mais na frente, oi Dona Crotilde, mais na frente, Dona Esmeraldaquanto tempo..como está Seu Firmino? Vai ali mais um bom tempo.

Sair pela rua principal da cidade é outro problema. De taberna em taberna, o proprietário lhe chama.Vem tomá um cafezinho moço! De comércio em comércio, você daqui apouco está esturricado de tomar cafezinho. Cafezinho você não nega, é falta de educação.

Vizinho você não só o conhece, você sabe literalmente da vida dele. Se o seu vizinho do outra lado da cidade der “uma puladinha de cerca” você saberá, com certeza saberá. Soltar gases é outro problema, tem que ser o mais discreto possível, se não a cidade ouve.

Político em cidade pequena tem que ser muito “cara-de-pau” ou ser muito transparente, pois o contato com o famigerado eleitor é comum nas ruas. O cabra não tem por onde escapar ou ficar no anonimato, o corpo a corpo é diário, e não é só em épocas de eleição.

Que bom, que bom, você na área rural poder pisar literalmente na bosta da vaca, sentir o cheiro da terra molhada, ouvir o gorjear dos pássaros e ouvir os gritos dos vaqueiros, ver carros fazerem malabarismo em estradas de barro. Dá diversidade, se vê algo contagiante. Bicho de pé também é bom. Bicho de pé não é chato, Bicho de pé dá no pé. “Chato dá noutro canto”, esse é chato pra dedéu.

Cidade pequena tem lá seus problemas, vizinho chato é um caso sério. Sei de uma história de um cabra que processou seu vizinho porque o galo dele cantava muito cedo e o acordava. Como ninguém processa galo, processou o dono do galo.

Ainda bem que existem grandes metrópoles, lá tudo se produz. O que seria se não tivesse quem não gostasse de buzinações, ônibus e metrô lotados, congestionamento, fábrica contratando para turno diurno e noturno. Se não existissem os Albertos, o que seria dos Jãos? O que seria de nóis, se não existissem vocês!


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