FHC acorda oposição com velhas receitas

Despertada do sono profundo em que se encontrava, a oposição reagiu de forma confusa às palavras de ordem do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que acha melhor esquecer o “povão” para investir na nova classe média, como se isso fosse uma grande novidade para os seus aliados.

Desde que nasceu de uma costela do antigo MDB dominado por Orestes Quércia, o PSDB sempre foi um partido das classes médias, distanciado do movimento social, dos sindicatos e dos setores mais populares.

No manifesto “O papel da oposição”, que escreveu para a revista “Interesse Nacional”, a ser publicada esta semana, FHC incomodou alguns líderes oposicionistas ao constatar que “enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT influência sobre os movimentos sociais ou o povão, isto é, sobre as massas carentes, e pouco informadas, falarão sozinhos”.

Os tucanos, pelo jeito, continuam achando que Lula e Dilma só se elegeram graças aos pobres ignaros que não lêem jornal e recebem alguma ajuda do governo.

Por mais que o sociólogo FHC possa ter razão na sua análise, esta afirmação incomodou até os seus mais fiéis seguidores na elite paulistana. “Ele pode até pensar isso, mas jamais escrever”, comentou comigo um grande empresário, antigo eleitor tucano, que não se conformava com o que chamou de “tremenda bola fora”.

Com todo cuidado, líderes tucanos procuraram explicar o que FHC quis dizer, como o ex-governador de São Paulo José Serra. “O problema do PSDB e da oposição é de rumo, de clareza, de coerência. Como um todo, não se sabe o que o partido defende, nem de que lado está”.

Pelo jeito, está surgindo a oposição da oposição. O sempre bem humorado jornalista Carlos Brickmann comentou logo que o problema da oposição não é encontrar um rumo. “Primeiro, é preciso encontrar a oposição”, sugeriu ele.

O deputado Roberto Freire (PPS-SP), até outro dia abrigado numa boquinha em conselhos municipais paulistanos, antes de o prefeito Gilberto Kassab resolver criar um novo partido, sentiu-se à vontade para corrigir o ex-presidente: “Não vejo na política quem abanone qualquer segmento da sociedade. Há 17 anos, ele foi o candidato que recebeu os votos dos setores pobres”.

O eterno presidente do PPS só se esqueceu que os pobres de 17 anos atrás talvez possam agora ser encontrados justamente na nova classe média que FHC quer cortejar. Do ponto de vista numérico, o ex-presidente não deixa de ter sua razão: no governo Lula, afinal, a classe C passou as classes D e E, tornando o Brasil, pela primeira vez, um país predominantemente de classe média.

Para o presidente do PSDB e grande estrategista político Sergio Guerra, o ex-presidente foi mal interpretado, pois apenas “constatou que é mais fácil para a oposição se comunicar com a classe média do que com os beneficiários do Bolsa Família”. Ah, bom. Agora está tudo esclarecido. O problema, mais uma vez, é só de comunicação. Basta encontrar um novo marqueteiro.


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