Fome no cinema; livros no Mercadão

Saí do Cine Sesc zonzo, sem ter o que dizer, literalmente nocauteado, depois de assistir ao documentário “Garapa”, a convite do premiado diretor José Padilha, na noite desta sexta-feira.

Como a maioria do público, eu não tinha condições nem de bater palmas para esta brilhante reportagem apresentada no 14º É Tudo Verdade, festival de documentários criado e até hoje dirigido por Amir Labaki.

“Garapa” lembrou-me o Globo Repórter do começo, em formato de cinema, quando era comandado pelo grande mestre Eduardo Coutinho.

O filme, em preto e branco e sem firulas, só a câmera ligada registrando o cotidiano em busca de comida de três famílias em estado de extrema carência do Ceará, é angustiante, sufocante mesmo, da primeira à última cena.

Era exatamente isto que o diretor queria, como explicou depois da exibição num breve bate-papo com a platéia. Confesso que na hora não consegui articular nenhuma pergunta.

Como o filme só vai estrear em São Paulo em 15 de maio e já era mais de meia noite, sugeri a Padilha deixar para outro dia a conversa que tínhamos combinado para depois do filme. Ele foi jantar com milha filha e meu genro, os roteiristas Carolina Kotscho e Bráulio Mantovani, e eu voltei para casa pensando no que escrever.

O filme levanta tantos pontos para discussão, dos programas assistenciais do governo ao planejamento familiar, que é preciso primeiro digerir o que tinha acabado de ver e me preparar melhor para escrever sobre o tema do novo filme de José Padilha.

Não que aquilo tudo fosse novidade para mim, depois de tantas reportagens que fiz na região sobre fome e seca, seca e fome desde os anos 60 do século passado, quando Padilha nem tinha nascido.

Mas ele conseguiu entrar na intimidade da fome e dos dramas familiares daí decorrentes de uma tal forma, como eu nunca tinha visto antes, que não há como ficar indiferente a esta tragédia que atinge hoje um bilhão de seres humanos no planeta, alguns milhões deles ainda sobrevivendo no Brasil.

Este filme deveria ser exibido todos os dias no Palácio do Planalto, nos gabinetes da Esplanada dos Ministérios e nos plenários do Congresso Nacional, nas reuniões da Fiesp e nas redações dos jornais, nos sindicatos e nas faculdades, nas igrejas e nos presídios, nas raves e antes dos concertos na Sala São Paulo.

Certamente este não será mais um campeão de bilheteria e vai levar pau da chamada crítica especializada.

Ninguém gosta de ver um filme como “Garapa”. Mas todo mundo deveria fazer um sacrifício e ir ao cinema para conhecer melhor a terra em que vive e poder confrontar a realidade com a análise dos teóricos da fome e suas estatísticas que abundam na imprensa.

Apesar do título, podem chamar o filme de tudo, menos de ser água com açucar _ muitas vezes, garapa é o único alimento nas casas das crianças destas três famílias.

“Garapa ” é amargo que só, como diriam seus protagonistas.

Jornalistas e mortadela

Mudando de assunto, que hoje é sabado, e o dia está bonito.

Para celebrar o Dia Nacional do Jornalista (7 de abril, terça-feira), o projeto “O Autor no Mercadão” promove amanhã, domingo, um novo encontro de autores com seus leitores.

Ao lado das bancas de frutas, verduras e peixes da melhor qualidade, o público encontrará bons livros e ainda poderá matar a fome com o melhor sanduíche de mortadela da cidade. Para quem não gosta, tem também o famoso pastel de bacalhau.

Desta vez, foram convidados jornalistas-escritores. Entre eles, além do repórter deste Balaio e de outros novos e veteranos autores, participarão do evento dois dos maiores jornalistas brasileiros dos últimos 50 anos, Audálio Dantas e José Hamilton Ribeiro, que estarão autografando seus livros, a partir do meio dia, no hall de entrada do mezanino do Mercado Municipal (rua da Cantareira, 306).

Às duas da tarde, eles vão debater o jornalismo brasileiro hoje, com a participação livre do público e moderação do jovem Guilherme Azevedo, editor do Jornalirismo.

Segundo o programa dos organizadores, os jornalistas-escritores vão falar sobre os desafios atuais da profissão, as oportunidades abertas pela revolução digital, liberdade de imprensa, surgimento de novas vozes, necessidade do diálogo e como se forma o novo jornalista.

Participam da tarde de autógrafos e do debate os autores:

* Audálio Dantas ( O Chão de Graciliano Ramos)

* José Hamilton Ribeiro (O Repórter do Século, O Gosto da Guerra, Música Caipira e Tropeiros: Diário de uma Marcha)

* Ricardo Kotscho ( Do Golpe ao Planalto _ Uma vida de repórter, Uma Vida Nova e Feliz sem poder sem cargo, sem carteira assinada, sem crachá)

* Guilherme Azevedo (As Aventuras de Alencar Almeida)

*Flávio Carrança ( Espelho Infiel, o negro no jornalismo brasileiro)

* Iva Oliveira (A fôrça da Fé)

* Lucius de Mello (Eny e o Grande Bordel Brasileiro, A Travessia da terra Vermelha e Mestiços da Casa Velha).

O cartunista Júnior Lopes participa do evento fazendo caricaturas do público.

Apareçam! E bom fim de semana a todos.


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