Lá se vão cinco anos desde que Laís Bodanzky lançou um olhar renovado sobre a juventude em Bicho de Sete Cabeças. Quem acompanhou a carreira dessa cineasta talentosa e viu o que ela fez no sensível Cartão Vermelho sabe que o tema era inevitável. Chega de Saudade, no entanto, vai na contramão e centra o foco na terceira idade. Os personagens são os freqüentadores de um baile da saudade que se reúnem durante uma noite para dançar ao som de orquestra, embalados por ninguém menos do que Elza Soares e Marku Ribas, o rei do samba-rock. É um espetáculo de música e dança, com a marca do tempo esculpida na pele de quem participa.

E esse é o ponto que Laís quer discutir. Como essas pessoas conseguem superar os obstáculos do tempo, ter tanta disposição e a sensualidade tão exacerbada? É a pergunta que a diretora se fez em suas próprias baladas nos salões de baile, sempre acompanhada do marido e parceiro de dança, o roteirista Luís Bolognesi. A resposta surge na tela num balé de imagens (coreografado com habilidade por Walter Carvalho) em que os gestos e olhares se sobrepõem aos diálogos. A música e a dança compõem o quadro para mostrar que o peso da idade não imobiliza ninguém, ao contrário, pode até deixar as pessoas mais leves.
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Chega de Saudade é um filme-coral, com vários personagens, tramas e subtramas que se intercalam. Essa é a menor das novidades no filme de Laís. O que interessa, na verdade, é como tudo parece se integrar de forma orgânica, desde os dançarinos até a música, passando inclusive pelo salão de baile – mais um elemento fundamental nesse elenco. Tônia Carrero e Leonardo Villar como o casal de namorados “pé-de-valsa”, ela angustiada com a depressão dele por causa da perna quebrada, são a viga mestra em torno da qual giram todas as outras histórias. Eles, que foram astros do cinema em suas épocas áureas, carregam as marcas do tempo e lutam para não se deixar engolir pela paralisia.

Cássia Kiss e Stepan Nercessian são Marici e Eudes, um casal apaixonado que aparentemente respeita a liberdade individual um do outro. Maria Flor e Paulo Vilhena, respectivamente Bel e Marquinhos, estão juntos nesta noite porque ele trabalha como disc-jóquei e ela veio acompanhá-lo. Quando Eudes começa a se engraçar com Bel, muitas das perguntas que o filme faz começam a ser respondidas. Há ainda a personagem de Betty Faria, a coroa carente, entre o sofrido e o patético.

São esses os tipos que dançam ao som de samba, tango, foxtrote e forró em Chega de Saudade. Um microcosmo de uma tribo muito maior que, ao contrário dos estereótipos, sabe lidar muito melhor com as limitações que a vida impõe. Um filme que, se não chega a entusiasmar como Bicho de Sete Cabeças, emana ternura e faz refletir sobre essa fase pela qual a maioria de nós vai passar.


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