O Citation PR-AFA que mergulhou em Santos matou Eduardo Campos e abriu o caminho para que sua vice chegasse às nuvens.
Com a tragédia, Marina Silva atropelou a candidatura tucana e transformou a polarização PT versus PSDB em PSB versus PT. Ao candidato Aécio Neves restou a tarefa quase impossível de controlar uma queda vertiginosa. Para Dilma Rousseff, manter essa nova polarização até o final, com razoável equilíbrio, será lucro precioso. Como disse Lula, esse será o segundo turno mais longo da história.
Marina foi aos céus também pela insatisfação com o governo. Entre as explicações para isso, além de algumas marchas e contramarchas, estão o desgaste de quase 12 anos no poder e o acirramento do preconceito inato das grandes metrópoles – principalmente São Paulo – e da grande mídia contra o PT.
Mas isso não explica por que o preconceito se transforma em ódio. O que sim, talvez explique o ódio é que nem quatro, nem oito, nem dez, nem vinte anos de foco no desenvolvimento social ou na luta contra as desigualdades serão suficientes para consertar uma realidade secular da sociedade brasileira.
País atrasado, sem cultura, sem educação, portanto preconceituoso, o Brasil ainda tem muito que se trabalhar.
Sempre é bom lembrar que fomos os últimos a libertar os escravos.
Como diz Criolo, não por acaso o personagem de capa desta edição: “Todo mundo merece ser feliz”.
Nem um balanço comparativo que traz cifras como os 42 milhões de pessoas que saíram da miséria, ou os quase 380 bilhões dólares de reservas internacionais contra 37 bilhões em 2002, os quase 200 milhões de toneladas da safra agrícola contra 97 milhões em 2002, ou os menos de 6% de taxa de desemprego contra 12%, em 2002, para citar alguns, é suficiente para aplacar a ira.
Graças ao preconceito, provavelmente acirra ainda mais.
É insensato, mas pouco importa tudo o que se fez.
Dilma Rousseff passou quatro anos sob ataque. Suas características, digamos, menos flexíveis que as de seu antecessor e criador, não foram perdoadas.
Do outro lado, até os garimpeiros do Acre sabem que bancos não param de bamburrar. Mas não é a presença de uma das acionistas do Itaú como coordenadora de campanha, o maior problema da candidatura Marina Silva, que foi aos céus como novidade, mas logo no dia seguinte ao lançamento de seu programa de governo despencou na realidade.
A política como ela realmente é trouxe a candidata de volta à terra e, junto com ela, os constrangedores retoques públicos a seu programa de governo, frutos da pressão de um pastor da igreja evangélica naquilo que pode se considerar o primeiro gol a favor do criacionismo, do fundamentalismo. E isso, para suas pretensões, pode ter sido fatal.
E quanto à sua coordenadora de campanha, Neca Setubal, mais que banqueira ela é, sim, como disse sua candidata, uma socióloga, uma educadora. Formada em Ciências Sociais pela USP, Neca é doutora em Psicologia da Educação pela PUC e autora de dez livros, entre eles Terra Paulista, que ganhou o prêmio Jabuti na categoria Melhor Livro Didático, em 2005. Está à frente do CENPEC (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), criado e respeitado há 25 anos na área de educação.
Única mulher entre os sete filhos do banqueiro Olavo Setubal, dono do Itaú, morto em 2008, Maria Alice Setubal era chamada de Boneca pelo pai. Detestava. Acabou virando Neca. Por outro lado, o tratamento diferenciado que recebia do pai ajudou Neca a percorrer caminho próprio, sem precisar se integrar ao cotidiano do Itaú, o maior banco privado da América Latina. Dos sete irmãos, apenas ela e José Luiz, que é médico, não atuam diretamente na instituição. Coordenadora do programa de governo da candidata Marina Silva, ela se aproximou da ex-senadora em 2009, então filiada ao PV. Durante a campanha de 2010, viajou pelo Brasil com Marina e ajudou a elaborar o plano de governo, na área da educação.
Sacrificá-la por seu sobrenome é tão insensato quanto despejar o ódio que se despeja no PT.
Então, como sempre fiz nesses sete anos de vida da Brasileiros, declaro aqui a minha escolha: apesar de simpatia pela Luciana Genro, candidata de meu filho, pelo Eduardo Jorge e pela própria Neca Setubal, meu voto irá, mais uma vez, para Dilma Rousseff.
*Hélio Campos Mello é diretor da redação.
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