Irmã Dilma e Beato Serra: quem vai rezar mais?

Ao final da primeira semana da campanha do segundo turno das eleições presidenciais, se alguém chegasse ao Brasil hoje, sem saber o que está em jogo, poderia imaginar que o país voltou à Idade Média e vive uma sangrenta guerra religiosa. De um lado, a irmã Dilma; de outro, o Beato Serra – e a unir os dois, um festival de hipocrisia.

Esta inacreditável maluquice começou ainda no final da primeira rodada, quando a internet foi inundada por mensagens apócrifas acusando a candidata Dilma Rousseff de defender o aborto.

Nunca se vai saber até que ponto isto foi decisivo para levar as eleições ao segundo turno, mas o fato é que a velha mídia e os estrategistas do candidato José Serra gostaram da idéia e transformaram a questão do aborto no tema central da campanha. Deus, o próprio, virou o principal cabo eleitoral. Quem promete rezar mais ave-marias?

Acuada pelos repórteres que lhe perguntavam sobre aborto toda vez que aparecia diante das câmeras em algum lugar público, a Irmã Dilma entrou no jogo e passou a falar das suas profundas convicções religiosas, como se agora fosse candidata a madre superiora. Só falta aparecer com um véu na cabeça. Satisfeito com os resultados, pleno de santidade, o Beato Serra, por sua vez, passou a fazer campanha, não apenas para ser eleito, mas canonizado.

Os programas de TV dos dois candidatos aderiram logo à onda. A guerra religiosa não deixou mais lugar para o debate de projetos para o país nos próximos quatro anos. A política cedeu espaço à religião. Templos e igrejas tomaram o lugar dos palanques; as bençãos de bispos e pastores passaram a ser mais cobiçadas do que o apoio de líderes populares; sermões substituiram os discursos e os eleitores passaram a ser tratados como um rebanho de fiéis.

É como se o país estivesse enfrentando uma epidemia de abortos, doença contagiosa que, de uma hora para outra, passou a ameaçar todas as mulheres grávidas. Saíram de cena todos os escândalos, não se fala mais em pedofilia na Igreja Católica, nem no destino dado aos milionários dízimos evangélicos que não pagam impostos.

O aborto se transformou na grande questão nacional. De onde surgiu esta sandice? Aonde se quer chegar com esta insanidade?

Confesso a vocês que não sei explicar o que está acontecendo, gostaria apenas de entender. Estou ficando meio assustado com tudo isso. O Brasil merecia uma campanha presidencial mais decente, menos indigente.

Em tempo:

Depois de publicar o texto acima, na noite de sábado, recebi algumas informações que podem anos ajudar a entender melhor a origem desta guerra nada santa. Já na reta final da campanha do primeiro turno, sem muito alarde, o pastor Silas Malafaia, da mesma igreja evangélica de Marina Silva, abandonou a candidata verde e ofereceu seu apoio a José Serra.

A súbita mudança político-religiosa de Malafaia, coincide com o início da ofensiva nos esgotos da internet acusando a candidata Dilma Rousseff de defender o aborto. O pastor justificou seu rompimento com Marina por ela defender um plebiscito sobre questão do aborto e outros temas polêmicos que dividem a sociedade.

Ainda não se conhecem quais foram os argumentos – baseados na fé religiosa, naturalmente – utilizados por Serra para ganhar o apoio de Malafaia.


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