It’s made out of people

Fiquei feliz em saber que o dinheiro que entrego todos os anos para o governo americano está sendo aplicado em segurança. Fui informado pela publicação Military Times, dedicada a assuntos milicos, de que mil soldados serão treinados para combater zumbis apocalípticos.

Isso mesmo: a tropa desembarcará na pitoresca cidade de San Diego e lutará contra hordas de mortos-vivos, devoradores de carne humana, que só são definitivamente despachados ao além quando têm suas cabeças espatifadas. Infelizmente, não foi possível achar zumbis autênticos para essa missão. Os combatentes terão de se contentar com atores interpretando as horrendas criaturas.

O milionário Mitt Romney, candidato republicano à Presidência americana nas próximas eleições, paga percentualmente menos imposto de renda do que eu. Ele desembolsa anualmente 20% daquilo que ganha, e eu estou em um patamar de 25%. Ambos, porém, não estamos satisfeitos com a aplicação da bufunfa que entregamos a Tio Sam. Tanto, que Mitt tem em sua plataforma política propostas para mudanças envolvendo cortes de despesas governamentais. O combate a zumbis, felizmente, não está na lista de economias do homem. Vamos continuar financiando ensaios de batalhas escatológicas.

Afinal, nunca se sabe quando um vírus desconhecido sairá do Haiti e atingirá a costa da Flórida, contaminando boa parte da população da América do Norte. Minha filha mora no Texas (ninguém é perfeito), estado vizinho. Provavelmente, terá de lidar com os zumbis antes de mim, aqui em Nova York. Ela é chef de cuisine e lida magnificamente com facas e cutelos. Tem grandes chances de fazer sushi do quengo de algum morto-vivo que se meta a besta. Mas e eu, que só tenho um canivete suíço? Mal consigo descascar batatas. Preciso de toda a proteção que o governo federal possa me dar.

É curiosa a evolução dos zumbis. No começo, eles eram uns sujeitos apáticos, sem apetite. Perambulavam pelo Haiti prestando serviços caseiros, cuidando da plantação, talvez levando roupas ao tintureiro. Não prestavam para dar recado, pois não falavam nada. Mas, de repente, os americanos descobriam que a tropa de tansos surtou e passou a caçar gente viva para comer-lhe as carnes. E ai de quem levar mordida de um morto-vivo! Entrará quase imediatamente para o exército de monstros.

O Military Times diz, lá pelas tantas, que zumbis não existem. Ora, se isso fosse verdade por que as Forças Armadas da maior potência militar do mundo estariam se preparando para o combate? Por que não treinam para lutar contra o bicho-papão? Comigo não, violão. Aí tem coisa.

Pelo que vejo nas ruas de Nova York, os zumbis já estão entre nós. Simplesmente, suas papilas gustativas ainda não desenvolveram apreciação pela carne humana. Mas é apenas uma questão de tempo. Afinal, os caras comem qualquer coisa: fried chicken do KFC, por exemplo. Como disse famosamente o grande Charlton Heston no filme clássico Soylent Green (1973): “It’s made out of people! It’s made out of people!” (“É feito de gente”). E todo mundo sabe que a gente tem gosto de galinha.

Pensando bem, por que o governo americano não pega o dinheiro do Romney, o meu, o de todo mundo, e compra uma porrada de galinhas? Era só soltar as frangas em um estado onde não mora ninguém – North Dakota, por exemplo – e mandar qualquer exército de zumbis para lá. Em telões estrategicamente colocados, passaria a cena do Heston dizendo It’s made out of people! Zumbis podem ser tudo, menos inteligentes. Iriam acreditar. Os caras ficariam o dia inteiro cercando penosas e nos deixariam em paz.


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