Numa época em que boa parte do noticiário da velha e da nova mídia agora é produzida em entrevistas por telefone ou e-mail, com os repórteres saindo pouco de casa ou da redação, não deixa de ser alentador encontrar nas bancas uma revista como a Brasileiros, onde eu também trabalho, e que pode ser lida aqui no site ou mesmo no iG.
A edição de junho, com o cineasta José Padilha na capa – “Garapa – Cinema contra a fome” – já está nas bancas de São Paulo e, na próxima semana, vai ser distribuída nas principais cidades brasileiras.
Brasileiros não telefona nem manda recados para saber o que está acontecendo de novo neste nosso imenso país: vai lá. Desde o número zero, o objetivo de sua pequena equipe é mostrar personagens e cenários de um Brasil que não está na mídia.
Mês que vem, o sonho acalentado por toda uma geração de jornalistas brasileiros inspirados pela lendária revista Realidade, da Editora Abril, a melhor publicação impressa já criada no país, vai completar dois anos de vida.
É quase um milagre que uma revista mensal de reportagens, fora do main stream, sem a retaguarda de qualquer investidor capitalista, tocada apenas por jornalistas, sobreviva tanto tempo num mercado dominado por duas grandes empresas editoras e duas distribuidoras.
“Revista Brasileiros. Entenda profundamente.” Este é o tema da belíssima campanha criada pelo Sergio Valente, da DM9DDB, já exibida na televisão e nos cinemas, que resume bem o espírito da revista. De fato, Brasileiros vai fundo nos assuntos e não economiza no espaço quando tem uma boa história para contar.
Na edição de junho, além da matéria de capa produzida no sertão do Ceará, onde Padilha filmou “Garapa”, que ocupa 16 páginas, escrita por mim e com fotos antológicas de Manoel Marques, Brasileiros publica belas reportagens:
*”Revelações do assessor de Jango” – Contada por Washington Luiz de Araújo, a história de mais de meio século de vida do ex-deputado Cláudio Braga, cassado pela ditadura, que foi secretário particular de Jango em quase todo o tempo de exílio do ex-presidente e que hoje vive em Montevidéu.
* “O dia em que Sartre fundiu a cuca” – O repórter Alex Solnik resgata as cinco horas de entrevista, ao vivo, em francês, sem tradução e sem intervalo comercial levada ao ar numa TV brasileira no começo da década de 1960.
* “Os dois lados da Raposa Serra do Sol” – Com textos de José Cesar Magalhães e Daniel Veloso Hirata, e fotos de Fábio Braga, três jovens que se dedicam a “descobrir e registrar situações problemáticas e importantes do Brasil, mas nem sempre evidentes”, a revista conta o que há por trás do conflito entre índios e arrozeiros em Roraima, no extremo norte do país.
Tem muito mais na 114 páginas da edição número 23, ainda com poucos anúncios, mas o suficiente para que a gente vá sobrevivendo nesta floresta de títulos que cobrem as nossas bancas de jornal.
Tema de várias teses de mestrado e TCCs (Trabalhos de Conclusão de Curso) em diferentes faculdades do país, a revista contraria a velha história de que brasileiro não gosta de ler textos mais longos. Se a história for boa e bem contada, lê, sim – e ainda faz pesquisa acadêmica
Por ter fé no Brasil e certeza de que este país tem jeito, apesar de todos os seus problemas e desafios seculares, os editores da revista comandada por Hélio Campos Mello, meu velho parceiro, fotógrafo de respeito, que foi por muitos anos diretor de redação da IstoÉ, publicam na última página, desde o primeiro número, a pergunta “Você acredita no Brasil?”. Destaco duas respostas na edição que está nas bancas:
Danilo Santos de Miranda, diretor regional do SESC São Paulo:
“Sim, acredito! () “Em todos os meus papéis desempenhados como gestor, pai, eleitor e cidadão, atuei sempre com fé e segundo os princípios de que contribuímos de muitas formas para mudar o Brasil, a começar pela transformação do próprio olhar e pela forma como desejamos e expressamos ao mundo nossa maneira peculiar de lidar com a criatividade, com os prazeres e as dificuldades”.
Danielle Matos Santos, 29 anos, assistente de cozinha:
“No Brasil eu acredito, mas não nas pessoas. Aqui ninguém respeita mais ninguém, as coisas estão muito difíceis. O Brasil é um país rico em terra, florestas e, principalmente em água doce. Já temos tudo, está aqui, mas as pessoas estão acabando com isso, não somente no Brasil, mas no mundo () Quer saber? Às vezes eu acho o Brasil uma bosta e, às vezes, uma maravilha, assim como a minha vida”.
O preço da mercadoria? Apenas R$ 7,90, nas melhores bancas.
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