O prestígio do Judiciário brasileiro anda meio abalado nos últimos tempos, com a profusão de habeas corpus, suspensões de julgamentos e manobras protelatórias em geral, que levam à impunidade e ao descrédito nas instituições.
Mas há exceções, exemplos dignificantes de magistrados que cumprem sua obrigação e pagam por isso, arriscando a própria vida em nome da lei.
De Ponta Porã, no Mato Grosso do sul, fronteira com o Paraguai, me chega a história do juiz federal Odilon de Oliveira que, depois de condenar 114 traficantes, foi ameaçado de morte e agora vive preso, morando no Fórum, sem poder sair às ruas. Só sai quando extremamente necessário, sob forte escolta.
Quem me mandou o relato sobre a saga do juiz Oliveira foi meu irmão Ronaldo Kotscho, também jornalista, que agora mora em São Sebastião, no litoral Norte de São Paulo, onde encontrou tempo para fazer o que mais gosta: lutar contra as injustiças e tudo o que acha errado.
Ele recebeu o texto em e-mail enviado por outro juiz, primo de sua mulher – coisas da internet. Por confiar nas fontes, reproduzo abaixo a história do juiz que perdeu a liberdade:
“Odilon de Oliveira, de 56 anos, estende o colchonete no piso frio da sala, puxa o ededron e prepara-se para dormir ali mesmo, no chão, sob a vigilância de sete agentes federais fortemente armados.
Em um ano, o juiz condenou 114 traficantes a penas que, somadas, chegam a 919 anos e 6 meses de cadeia, e ainda confiscou seus bens. Como os que pôs trás das grades, ele perdeu a liberdade.
“A única diferença é que tenho a chave da minha prisão”, diz, conformado.
Traficantes brasileiros que agem no Paraguai se dispõem a pagar US$ 300 mil para vê-lo morto. Desde junho do ano passado, quando o juiz assumiu a vara de Ponta Porã, porta de entrada da cocaína e da maconha distribuídas em grande parte do país, as organizações criminosas tiveram muitas baixas.
Nos últimos 12 meses, sua vara foi a que mais condenou traficantes no Brasil. Oliveira confiscou ainda 12 fazendas, num total de 12.832 hectares, 3 mansões – uma em Ponta Porã, avaliada em R$ 5,8 milhões _ 3 apartamentos, 3 casas, dezenas de veículos e 3 aviões, tudo comprado com dinheiro das drogas.
Por meio de telefonemas, cartas anônimas e avisos mandados por presos, Oliveira soube que estavam dispostos a comprar a sua morte.
“Os agentes descobriram planos para me matar, inicialmente com uma oferta de US$ 100 mil. No dia 26 de junho, o jornal paraguaio La Nación informou que a cotação do juiz no mercado do crime encomendado tinha subido para US$ 300 mil.
“Estou valorizado”, brincou o juiz. Ele recebeu um carro com blindagem para tiros de fuzil AR-15 e passou a andar escoltado. Para preservar a família, mudou-se para o quartel do Exército e, em seguida, para um hotel. Há duas semanas, decidiu transforar o próprio prédio da Justiça Federal em moradia.
“No hotel, a escolta chamava muito a atenção e dava despesa para a Polícia Federal”, explica. É o único caso de juiz que vive confinado no Brasil. A sala de despachos de Oliveira virou também quarto de dormir. No armário de madeira, antes abarrotado de processos, estão colchonete, roupas de cama e objetos de uso pessoal. O banheiro privativo ganhou chuveiro.
A família – mulher, filho e duas filhas -, que ia mudar para Ponta Porã, teve que continuar em Campo Grande. O juiz só vai para casa a cada 15 dias, com seguranças.
Oliveira teve de abrir mão de restaurantes e almoça um marmitex, comprado em locais estratégicos, porque o juiz já foi ameaçado também de envenenamento. O jantar é feito ali mesmo. Entre um processo e outro, toma um suco e come uma fruta. “Sozinho, não arrisco a sair nem na calçada.”
Uma sala de audiências virou dormitório, com três beliches e televisão. “Estou aqui há um ano e nem conheço a cidade”. Na última ida a um shopping, foi abordado por um traficante. Um agente teve que intervir.
Azar do tráfico que o juiz tenha de ficar recluso. Acostumado a deitar cedo e levantar de madrugada, ele preenche o tempo com trabalho. De seu “bunker”, auxiliado por funcionários que trabalham até alta noite, vai disparando sentenças.
Já condenou, entre outros, o mega traficante Erineu Domingos Soligo, o Pingo, a 26 anos e 4 meses de reclusão. Doze réus foram extraditados do Paraguai, a pedido do juiz, inclusive o “rei da soja” do país vizinho, Antonio Dametto, e Sandro Mendonça do Nascimento, braço direito do traficante Luiz Fernando da costa, o Fernandinho Beira-Mar.
O juiz não se intimida com as ameaças e não se rende aos apelos da família que quer vê-lo longe desse barril de pólvora. Ele é titular de uma vara em Campo Grande e poderia ser transferido, mas acha dever de ofício enfrentar o narcotráfico”.
A mensagem que recebi veio com um apelo no final:
“Este merece nossos aplausos! Por acaso a mídia noticiou essa bravura que o Brasil precisa conhecer? Por favor, faça a sua parte! Divulgue o máximo que puder!!!”
O grande problema é que a mesma Justiça que condena e coloca os criminosos atrás das grades, baseada na lei, é a Justiça que muitas vezes manda soltar, baseada na mesma lei
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