Maria Alice Setubal, mais conhecida como Neca, está preocupada com o turbilhão político que atinge o País. Radicalismos da esquerda e da direita incapazes de dialogar entre si ganham força, diz ela, que se coloca em um “meio de campo”. Outra preocupação de Neca é com a legalidade, a manutenção do Estado de Direito e o fortalecimento das instituições. Mas para ela, herdeira do Banco Itaú, coordenadora de campanha à Presidência de Marina Silva em 2014 e educadora há 30 anos, nada disso está em jogo.
“Pode ter havido avanços na Lava Jato que talvez tenham sido desnecessários, mas estavam pautados pelas leis. Obviamente as leis têm uma interpretação, elas não são totalmente neutras, mas acho que nada da operação fere a Constituição de 1988.”
A educadora é filiada à Rede, partido de Marina Silva, de quem se diz próxima, mas avisa que não fará parte de uma possível campanha à Presidência da ex-senadora. “Tenho uma visão política e estratégica sobre o País e as áreas nas quais trabalho, mas a minha militância é na sociedade civil. Estar na campanha da Marina foi uma experiência muito importante, rica, aprendi muitíssimo, continuo ao lado dela, mas vou estar em um lugar da sociedade civil, continuando nas organizações que eu sempre militei: Cenpec e Fundação Tide Setubal.”
Sobre a legalidade de um possível impeachment da presidenta Dilma Rousseff, Neca diz não ter uma opinião a respeito, já que não é deputada nem votará sobre a questão. Limita-se a dizer que, “se houver indícios de crime de responsabilidade, não será golpe”.
Em caso de impedimento, Neca afirma que a posse de Michel Temer, ainda que legal, “dificilmente terá legitimidade”, já que em pesquisas mostrou baixa intenção de votos dos eleitores, além de fazer parte de um governo desaprovado por maior parte da população. “É muito difícil também o PMDB ter essa legitimidade porque está envolvido na Operação Lava Jato”, a educadora acredita.
Nas manifestações contra o governo Dilma, diversos políticos foram hostilizados, inclusive nomes da oposição que convocaram a população a ir às ruas, como os tucanos Aécio Neves e Geraldo Alckmin. Neca, no entanto, não considera isso um sintoma de negação da política por parte da sociedade. Tampouco acredita no fortalecimento de figuras de extrema direita, como o deputado federal Jair Bolsonaro, do PSC.
“Existe um desejo de mudar o sistema. Essa crise de representação política não é só do Brasil. É do mundo inteiro. Nós temos um sistema partidário criado no século XIX, não dá mais conta do que o mundo hoje aspira. Acredito que as pessoas estão rechaçando o que está aí, mas não é o anarquismo nem uma ditadura. Estamos vivendo uma sociedade de transição. Angustia porque ninguém tem clareza de para onde estamos transitando.”
Neca diz que a maioria da grande imprensa está se posicionando contra o governo federal, mas acha “um absurdo” responsabilizá-la por colocar as pessoas nas ruas e insuflar a radicalização política. “Não é a imprensa que gera o radicalismo. É essa superficialidade na argumentação, a falta de discussão porque as redes sociais só fazem as pessoas interagirem com aquelas que pensam de maneira semelhante a elas. E de outro lado, o que a Lava Jato está mostrando é seríssimo. Não acho que o PT inventou a corrupção, isso vem desde 1500, em todos os partidos isso deve existir. A Lava Jato está trazendo à tona muita coisa e, se não começarmos a mudar, não vamos mudar nunca. Tenho muita tranquilidade de estar em um partido que não quis aumentar seus integrantes a qualquer custo. Vamos ficar com poucos parlamentares, ter pouco tempo de televisão e pouco fundo partidário. É o preço para ter uma posição ética, correta, seguir seus princípios e não abrir mão deles.”
Apesar de não enxergar uma saída clara para a crise política, Neca diz que a educação da população será necessária: “Temos de formar uma geração que questione essa cultura política, que aprenda com o que está acontecendo e tenha mais capacidade de pensar, refletir e ter argumentos. São poucas as pessoas que têm argumentos consistentes”.
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