Livros perigosos

No romance O Nome da Rosa há um misterioso livro cujas páginas tinham um veneno mortal para os que passavam a página e depois levavam o dedo à língua. Era uma obra de Aristóteles sobre o riso.

Os historiadores costumam associar livros perigosos a eventos importantes. Normalmente, a obra está vinculada a uma revolução ou à rebeldia geracional. Seja o Livro Vermelho, de Mao Tsé-Tung, erguido em punho pelos jovens, em maio de 1968, ou a obra do general português António de Spínola, que esgotou em oito horas nas livrarias de Lisboa e abalou o salazarismo às vésperas da Revolução dos Cravos.

Dos livros às ideias e destas à prática revolucionária, o salto pode ser mortal. O editor e aristocrata italiano Giangiacomo Feltrinelli abandonou a edição de livros e mergulhou na revolução que abalava o mundo depois de 1968. Foi morto pela explosão de uma bomba quando intentava destruir uma torre de alta-tensão.

Mas os livros podem estar associados a fatos cotidianos igualmente explosivos.

Em 20 de dezembro de 2009, um jovem de 21 anos foi ferido gravemente por um tresloucado personal trainer e seu taco de beisebol. O agredido, que infelizmente veio a falecer, estava agachado na seção de arte da Livraria Cultura, em São Paulo. De certa forma, ele morreu por amor aos livros.

Importantes personalidades políticas não ficaram imunes aos livros. O primeiro-ministro José Canalejas (1854-1912) foi assassinado por um anarquista enquanto olhava a vitrine de uma livraria em Madrid. Lee Oswald atirou em Kennedy de um depósito de livros.

Fidel Castro despachou um telegrama revolucionário em nome de uma livraria no México. O telegrama dizia apenas: “Obra pedida esgotada – Editorial Divulgación”. Mensagem disfarçada na pele de uma correspondência comercial editorial. Outra foi a sorte (ou azar) da correspondência comercial de um revolucionário na África. Eduardo Mondlane encomendou um livro em Paris. Ao chegar-lhe às mãos a encomenda, ela explodiu e o matou. Um presente da PIDE (a truculenta polícia fascista de Salazar, em Portugal).

Johann Georg Tinius (1764-1846) foi o caso mais espetacular. Conta-nos o historiador Luciano Canfora que Tinius era dono de uma biblioteca teológica e linguística. Quando se apaixonou pelos livros, passou a comprá-los compulsivamente. Gastou seus vencimentos, a fortuna de sua falecida esposa e também o dinheiro de sua segunda mulher. Insaciável por livros, desviou dinheiro da igreja da qual era sacerdote e, por fim, teve de dedicar-se a roubo e assassinato, até ser preso. Tudo para tê-los (os livros).

A essa altura, o leitor já deve estar se perguntando qual o interesse da pessoa ao lado pela revista que tem ele em mãos…


*Professor de História Contemporânea na Universidade de São Paulo.

 


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