Lula X Aécio: A batalha em Minas

O belicismo que impera na disputa pela prefeitura de Belo Horizonte extrapolou para um embate entre Lula e Aécio Neves, potencial adversário da presidenta Dilma Rousseff em 2014. Lula, no entanto, não dá bola para o azar. Disposto a arregimentar votos para o candidato petista Patrus Ananias, ele escolheu a capital mineira para subir pela primeira vez em um palanque nessas eleições no último dia de agosto. Pela manhã, ainda em São Paulo, Lula telefonou para seu amigo e ex-ministro Walfrido dos Mares Guia. Queria jantar na casa do ex-ministro – e levar as seis pessoas que viajariam com ele. Pediu ainda que o anfitrião convidasse Patrus para o encontro.

Dono de uma casa de altíssimo padrão no bairro Mangabeiras, aos pés da Serra do Curral, Mares Guia é também o presidente estadual do PSB. Incentivado pelo PSDB de Aécio, o partido protagoniza cenas de agressividade explícita com o PT de Belo Horizonte. Líder nas pesquisas, o candidato do PSB é o prefeito Marcio Lacerda, que se aliou ao PT por quase quatro anos e agora virou desafeto. Ainda assim, Mares Guia nem pestanejou. No final daquele mesmo dia, estava no hangar da Líder Táxi Aéreo, no Aeroporto da Pampulha, à espera de Lula e acompanhantes. De lá, seguiram direto para a casa do Mangabeiras.

Foi uma noite memorável. Uma longa “contação de casos” entre amigos, permeada por risadas. Lula estava tão à vontade que tomou algumas taças de vinho tinto, as primeiras desde que fez um tratamento contra um câncer na laringe, descoberto em outubro do ano passado e em fase de remissão. O grupo relembrou episódios antigos, dos primórdios da militância à chegada ao poder. Mares Guia contou como se surpreendeu com o convite para integrar o ministério de Lula. Foi a deixa para lembrarem que Patrus quase não foi ministro do Desenvolvimento Social por excesso de parcimônia. Ao ser sondado para o cargo, ele foi tão cuidadoso na resposta que o emissário de Lula, Gilberto Carvalho, atual ministro-chefe da Secretaria da Presidência, entendeu que ele estava recusando o posto.

Como sempre acontece, a estrela do encontro foi Lula. O ex-presidente só deixou de ser o alvo das atenções por alguns momentos, com a chegada da filha de Walfrido, a estilista Erika. Ela se encantou ao encontrar o escritor Fernando Morais entre os convidados do ex-presidente, por causa do livro Olga, sobre a vida da mulher do líder comunista Luiz Carlos Prestes, deportada pelo governo Getulio Vargas para a Alemanha nazista, onde morreu em um campo de concentração.

Hoje escrevendo uma biografia de Lula, o escritor também ficou encantado em saber como o livro marcara Erika, que o lera aos 13 anos. Com exceção de Fernando Morais, os outros convidados de Lula eram todos vinculados ao PT. O dono da casa, como se sabe, é do PSB. Em território conflagrado pela batalha entre os dois partidos, Lula evitou falar sobre política partidária. Só fez uma recomendação a Patrus: “Não responda às provocações do adversário”.

Na noite seguinte, no palanque armado na Praça da Estação, no centro de Belo Horizonte, Patrus seguiu a orientação do líder petista. Lula, em contrapartida, destilou veneno contra os adversários. Falou por quase 13 minutos. Ainda em tratamento com uma fonoaudióloga, ele não deveria discursar por mais do que cinco minutos. Sendo como é, esticou o tempo. Contou que, ao saber do câncer, não teve medo da morte, pois “se morreu, enterra, vai embora e acabou”. Ficou, no entanto, assustadíssimo com a ideia de perder a voz e a capacidade de falar com as pessoas, um “dom” que acredita ter recebido de Deus: “Eu não poderia viver sem fazer discurso”.

No discurso feito sob medida para estimular a militância mineira, Lula voltou a citar Deus, repetindo o ditado popular de que “Ele escreve certo por linhas tortas”. Lembrou que há tempos o PT de Minas “estava brigando demais”, que “tinha muita gente desgostosa”. Ele se referia aos desdobramentos da aliança que reuniu em 2008 o PT, o PSB e o PSDB em torno da candidatura de Marcio Lacerda. Articulada por Fernando Pimentel, atual ministro do Desenvolvimento, a aliança foi um sucesso nas urnas, mas rachou o PT mineiro. Uma parte dos petistas cerrou fileiras com Pimentel, enquanto outra, ligada a Patrus, renegou a associação com o PSB de Lacerda e o PSDB de Aécio Neves. Eram os desgostosos, que andavam de “cara feia”, na definição do ex-presidente.

Convocado seguidas vezes para interferir na discórdia fratricida, Lula costumava ponderar que o problema deveria ser resolvido entre as montanhas de Minas: “Eis que Deus mais uma vez colocou o dedo no lugar certo. Aqueles que o PT ajudou a chegar ao poder não querem mais ficar com o PT. Tudo bem. O PT não vai ficar chorando”. O rompimento se deu de forma repentina no momento em que a aliança de 2008 estava prestes a ser reeditada.

Na manhã do sábado 30 de junho, durante convenção do PSB, o partido estava aliado ao PT e PSDB. A chapa da coligação, encabeçada por Lacerda, tinha como vice um petista, o deputado federal Miguel Corrêa Junior. Lacerda e Corrêa chegaram a posar para fotos, ladeados por lideranças de ambos os partidos. No final da tarde, a aliança do PSB e PSDB não incluía o PT. Cada lado tem a sua versão para explicar o rompimento, cuja gota d’água foi a decisão do PSB de não fazer coligação proporcional de vereadores.

Às 17h27 daquele mesmo sábado, o presidente do PT, Rui Falcão, que estivera pela manhã na convenção, recebeu um torpedo de Lacerda em seu celular: “Prezado Rui, Infelizmente não consegui convencer PSB e PSDB da importância da aliança proporcional com o PT. Espero que os sábios encontrem uma saída”. A resposta de Rui Falcão foi curta: “Acho que o nosso acordo deveria ser honrado por você”. A Câmara Municipal de Belo Horizonte tem 41 cadeiras, que estão sendo disputadas por 1.287 candidatos. Ao PT interessava ter a coligação na disputa majoritária – para prefeito – e na de vereadores. Prevendo que a aliança teria uma avalanche de votos, o partido lidaria com um quociente eleitoral confortável o suficiente para emplacar um maior número de vereadores.

No começo do ano, durante um almoço no restaurante Tordesilhas, em São Paulo, o PT deixara claro que não bastava a indicação do vice da chapa de Lacerda. Para manter a aliança, queria coligação proporcional para vereadores. À mesa, o PT era representado por Rui Falcão. Pelo PSB, estavam o próprio Lacerda e Mares Guia, o presidente estadual do partido. “Lacerda relutou no começo, depois acedeu e a palavra dele foi passada para o papel”, lembra-se Rui Falcão. Com a data de 9 de abril, o documento levou a assinatura de Mares Guia, o mesmo que recebeu Lula para jantar na casa do Mangabeiras.

Rui Falcão reconhece que a direção nacional enfrentou resistência entre os petistas mineiros e precisou “agir com muita determinação” para manter a aliança de 2008. “Seria estranho negar o apoio ao PSB em Belo Horizonte e, ao mesmo tempo, querer que eles nos apoiassem em Recife e Fortaleza”, diz o presidente nacional do PT, referindo-se a capitais que acabaram não fechando coligação com o partido (leia mais à página 74). Ao mesmo tempo, ele garante que foi Lacerda quem rompeu com a palavra. “Isso é uma falácia”, afirma o prefeito. “A história é longa, mas os outros partidos não aceitaram a proporcional com o PT. Não foi só o PSB.”

O fato é que, com o rompimento, Lacerda ficou à frente de uma coligação com 19 partidos, a começar pelo PSDB. Coube ao PT aliar-se com outros três – PMDB, PDT e PCdoB. Em contrapartida, o fim da aliança uniu o PT de Minas. Impulsionado pela presidenta Dilma Rousseff e por Lula, o partido levou apenas três dias para lançar a candidatura de Patrus, cujo vice é o peemedebista Aloísio Vasconcelos. Outro provável efeito colateral do rompimento foi liberar a agressividade represada no decorrer dos quatro anos da conturbada aliança. Lacerda já disse que Patrus usa a técnica “nazista” de repetir mentiras para que se tornem verdades. O petista, por sua vez, classificou como “esquizofrênica” a relação do socialista com o governo Dilma Rousseff, alternando elogios e ataques.

Escudado por uma imagem enorme de Dilma no palanque, Lula entrou no clima de “bateu, levou”. Antes dele, nove entre dez oradores haviam feito referência à bela noite de Lua Cheia, já que Lacerda dissera que iria “torcer para chover” na hora do comício. Como forma de gozação, algumas lideranças e militantes chegaram até a levar guarda-chuvas e sombrinhas para a Praça da Estação. Lula deu maior ênfase à comparação entre o seu candidato e o adversário, que classificou como “um tocador de obras que parece uma pedra de gelo”. Também provocou o senador Aécio Neves, padrinho político do governador Antonio Anastasia (PSDB): “Se o Anastasia pudesse falar, diria que o Estado de Minas está quebrado”.

Conhecido pela cordialidade e bom trânsito entre políticos de diferentes tendências, Aécio soube do ataque na mesma noite e amanheceu atravessado. Em um primeiro momento, expressou sua felicidade pelo restabelecimento da saúde de Lula. Depois, disse que o ex-presidente estava desinformado: “Minas vai muito bem. Poderia estar melhor, talvez, se o governo federal tivesse cumprido as promessas”. Na faceta positiva, citou os bons resultados

do Estado no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). A negativa dizia respeito a obras do governo federal que não saíram do papel, como a expansão do metrô.

Na sequência, Aécio elevou o tom, trazendo para a campanha o julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF). Como Lula havia afirmado no comício que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não mandava dinheiro para os municípios, o senador rebateu dizendo que o PT tinha um “viés equivocado” em relação a investimentos: “Ele trata os recursos públicos como seus”. O caso concreto apontado pelo senador foi a condenação do ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, por peculato, corrupção ativa e lavagem de dinheiro: “O PT se apropria das empresas públicas, como fez agora, comprovado pelo STF em relação ao Banco do Brasil. Uma vergonha. Uma instituição secular. Utilizada, como foi provado pelo STF, para atender a interesses do partido”.

Nenhum dos lados da contenda mineira havia usado antes o mensalão para atacar o adversário. Lula não tocou no assunto nevrálgico em seu discurso. Sequer foi questionado, pois não falou com a imprensa, como fez questão de frisar no palanque. Patrus costuma dizer que não tem nenhuma ligação com o episódio e evita comentar os possíveis impactos do escândalo na campanha. A Lacerda também não interessa falar em mensalão. Embora não tenha se tornado réu, o prefeito chegou a ser investigado por supostamente intermediar uma entrega de dinheiro para uma campanha do ministro Ciro Gomes, de quem foi secretário-executivo.

À primeira vista, o próprio Aécio não se beneficia com a exploração do tema, que pode jogar os holofotes sobre o chamado mensalão mineiro ou mensalão tucano. Articulado em 1998, durante a campanha fracassada pela reeleição do governador Eduardo Azeredo (PSDB), o esquema é considerado pela Procuradoria Geral da República como o “laboratório” do valerioduto petista. No processo, o ex-governador e outros dez réus são acusados de desviar para a campanha eleitoral recursos transferidos por estatais mineiras às agências de Marcos Valério. Azeredo nega envolvimento no esquema, sob o argumento de que não tinha conhecimento nem responsabilidade sobre o financiamento da campanha.

Embora tenha ocorrido antes do mensalão petista, o caso ainda não tem previsão de julgamento no Supremo. Outra diferença é que no mensalão tucano apenas o ex-governador será julgado pela Corte máxima do País. Os outros dez réus respondem ao processo na Justiça de Minas. “Caixa dois costuma ser o início de toda corrupção administrativa no Brasil”, afirmou o ministro Carlos Ayres Britto, atual presidente da Corte, na sessão de abertura do processo tucano no Supremo. Na ocasião, ele apontou como similares dos dois casos “os protagonistas, o modus operandi, o tipo de benefício”.

A reação imediata ao ataque de Aécio com as armas do mensalão foi mais silenciosa do que era de se esperar. Naquela altura, Lula já tinha voltado para São Paulo. Escalado para responder à acusação, o coordenador da campanha de Patrus, Roberto Carvalho, foi sucinto: “O esquema de corrupção teve início em Minas, como sustenta o Ministério Público Federal. O mensalão surgiu aqui, mas não queremos discutir isso. Cabe à Justiça decidir”.

Talvez por suscitar fartas conexões, o tema não entrou na agenda visível da política mineira. Pelo menos por enquanto. Em Belo Horizonte, os dois principais adversários mantiveram o ritmo frenético de campanha. Lacerda começou a primeira semana de setembro com uma frente sobre Patrus que variava entre 16 e 20 pontos, dependendo da pesquisa. Existem ainda outros cinco candidatos, mas de pouca expressão.

Cientista político e diretor do instituto Vox Populi, Marcos Coimbra acredita que a disputa em Belo Horizonte vai terminar no domingo de 7 de outubro. Para ele, só um fato extraordinário faria Lacerda e Patrus ficarem com votação tão próxima que a pequena proporção de eleitores dos demais candidatos seja suficiente para levar a decisão para o segundo turno. Embora destaque que “é sempre melhor estar na frente”, o cientista político pondera que raramente a dianteira na fase inicial da campanha significa uma certeza de que o resultado final será igual: “As eleições municipais são eleições de decisão tardia. O eleitor decide sistematicamente mais perto da eleição. A vantagem que Marcio Lacerda tem é considerável, mas a eleição vai acontecer no dia 7 de outubro”. É justamente essa a aposta de Lula. Ao se despedir de Patrus no aeroporto, antes de embarcar de volta para São Paulo, o ex-presidente fez uma segunda recomendação ao seu candidato: “Põe o pé no acelerador que nós vamos ganhar a eleição.” Quem viver, verá. Ou não.

 

O abraço de Lacerda

O socialista Marcio Lacerda passou três anos e nove meses preso por atuar na resistência à ditadura militar. É um assunto sobre o qual ele não costuma se estender. Em conversa com a Brasileiros, no decorrer de um deslocamento de carro na capital mineira, Lacerda baixou a guarda. Contou que vem da época da cadeia a amizade com Fernando Pimentel, o ministro do Desenvolvimento de Dilma Rousseff. Por cerca de 18 meses, os dois ocuparam celas que ficavam de frente uma para a outra, na Penitenciária de Linhares, em Juiz de Fora. Lacerda e Pimentel conversavam muito, em especial das 18 às 22 horas, quando eram mantidos trancados, mas não precisavam fazer silêncio: “A distância entre as celas era de dois e meio, três metros”.

Durante uma boa temporada, Pimentel acompanhou de perto uma incursão de Lacerda pela marcenaria. “Resolvi fazer uma mesa para mim. Fui catando pedaço de madeira. Não tinha lixa. Raspava com caco de vidro. Depois, consegui que me arrumassem um serrote e cortei os pedaços. Alguém me trouxe o verniz.

Fiz uma bela de uma mesa e um tamborete”, lembra Lacerda. “Quando fui transferido para Belo Horizonte, doei a mesa e o tamborete para o Pimentel.”

Mais de três décadas depois, o petista Pimentel foi um dos artífices da aliança que levou Lacerda à prefeitura de Belo Horizonte, unindo o PT ao PSB de Lacerda e ao PSDB do senador Aécio Neves. Com o recente rompimento da aliança, pelo menos no plano partidário, os dois ficaram em posições opostas.

À frente de uma coligação de 19 partidos que inclui o PSDB e com mais tempo no horário eleitoral do que Patrus, o prefeito Lacerda lidera com folga as pesquisas de intenção de voto. Na manhã seguinte ao comício de Lula na capital mineira, ele promoveu um abraço simbólico à cidade. A avenida do Contorno, que circunda a Belo Horizonte projetada no final do século 19, amanheceu vermelha e amarela, as cores do PSB. Em referência ao número do partido, foram demarcados 40 pontos temáticos, como Emprego, Habitação e Segurança. A vocação da cidade para a indústria da moda também foi lembrada. O trecho no qual o estilista Ronaldo Fraga abriu sua primeira loja, na região da Savassi, foi batizado como Ponto 36, o “Marcio Tá na Moda”.

Na carroceria de uma camionete Ranger prata, Lacerda percorreu toda a avenida ao lado do tucano Aécio Neves e do vice da sua chapa, o verde Délio Malheiros. Na animação da carreata estava o locutor Dílson de Abreu e Silva, 69 anos, que começou a atuar em eventos políticos há três décadas, na campanha vitoriosa de Tancredo Neves, avô de Aécio, ao governo do Estado.

Assim como tem a face conhecida do locutor nos eventos públicos, a campanha de Lacerda conta nos bastidores com uma estrategista de peso. Trata-se da jornalista Andrea Neves, irmã de Aécio, que também herdou do avô Tancredo a paixão pela política. Ela acompanhou de perto o estilo Lacerda de atuar quando ele ocupou o posto de secretário de Desenvolvimento Econômico no governo Aécio Neves.

Nascido há 66 anos em Leopoldina, Lacerda passou parte da infância em outra cidade mineira, Inhapim. Lá, costumava acompanhar a movimentação dos moradores divididos entre a UDN e o PSD, os partidos rivais da época. “Quando um ia ter comício de um grupo, o outro falava que torceria para que chovesse”, conta Lacerda. O prefeito diz que se lembrou do detalhe ao final de uma entrevista coletiva na qual havia sido mencionado o comício a ser feito por Lula em Belo Horizonte: “Falei de brincadeira, rindo, quando já tinha terminado a entrevista”. O comentário, porém, acabou divulgado pela imprensa e virou mote do encontro liderado por Lula.

Quando deixou a pequena Inhapim, Lacerda jamais imaginaria que no futuro estaria no centro de disputas políticas. Chegou a Belo Horizonte aos 17 anos, para fazer um curso técnico. Pouco depois, passou a trabalhar na Companhia Telefônica de Minas Gerais. Em seguida, entrou para a faculdade de administração, mas perdeu o emprego e o curso ao ser preso pela ditadura. Colocado em liberdade quase quatro anos depois, Lacerda começou uma carreira de sucesso como empresário, na construção de redes telefônicas.

A atuação na indústria o levou à política, originalmente como secretário executivo de Ciro Gomes, no Ministério da Integração Regional do primeiro governo Lula. Em 2008, era secretário de Desenvolvimento no governo Aécio Neves quando partiu para a sua primeira campanha rumo à prefeitura municipal. Daquela vez, não se registraram farpas como agora. Praticante de meditação e ioga desde os 15 anos, Lacerda tem contribuído para elevar o tom da disputa, mas planeja adotar outra linha: “Vou seguir o conselho que ele (Lula) deu ao nosso adversário e não vou responder a agressões e acusações”.

 

A volta de Patrus

O petista Patrus Ananias estava há tempos envolvido com as eleições em Belo Horizonte. A estratégia era mergulhar de cabeça na primeira disputa eleitoral do filho Pedro, candidato a vereador pelo PT. Da noite para o dia, os planos de Patrus deram uma guinada – e Pedro perdeu o coordenador-geral de campanha. No começo de julho, três dias depois do racha do PT com o PSB, Patrus incorporou o projeto de voltar a comandar a prefeitura da capital, como já fizera entre 1993 e 1996.

Em uma tarde recente de muito sol, ele percorreu a pé ruas do polo de moda da capital mineira. São quase mil lojas de confecção que se espalham pelo bairro do Barro Preto e, há pelo menos 15 anos, garantem o sustento de revendedores de todo o Estado.

Dono de sorriso aberto e olhar tranquilo, o ex-ministro de Desenvolvimento Social parecia muito à vontade ao entrar em lojas e conversar com clientes e comerciários. Estava acompanhado pelo ex-deputado Aloísio Vasconcelos (PMDB), candidato a vice de sua chapa. Ao seu lado estava também Jairo Faria Filho, 66 anos, motorista de “ônibus da Itapemirim” aposentado, que foi quase tão requisitado para fotos quanto Patrus.

Desde 2005, ele se dedica a imitar o ex-presidente Lula. A imitação da voz é realmente impressionante. A diferença física Jairo compensa usando terno e faixa presidencial. Com vínculos familiares e políticos no polo de moda, o deputado federal Diego Andrade, do PSD do prefeito paulistano Gilberto Kassab, estava entre o grupo de empresários que recebeu Patrus no Barro Preto. Como chegou bem antes do candidato à prefeitura, passou quase uma hora explicando aos lojistas que se aglomeravam em torno dele a situação do PSD na disputa municipal. “O PSB não queria coligar com o PT”, disse o deputado. “Encontrou um pretexto para romper em cima da hora e não dar tempo para o PT se organizar.”

Oficialmente, o partido do deputado integra a coligação que apoia Marcio Lacerda, o adversário de Patrus. Ocorre que os desdobramentos do rompimento PT-PSB são tamanhos que o PSD não está inteiro na coligação. “Assim que aconteceu o rompimento, nos reunimos em Brasília com Kassab, que tinha falado com a presidenta Dilma”, relata Andrade. “Decidimos nos aliar com o PT em Belo Horizonte. Só que o diretório municipal nos passou uma rasteira e se coligou com Lacerda.”

Lideranças do PSD recorreram ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE), mas não conseguiram reverter o quadro. “É que em Minas vale o TRécio”, brincou um lojista, em referência ao senador tucano Aécio Neves. O imbróglio está agora na instância superior da Justiça Eleitoral, em Brasília. “Quatro dos seis deputados federais do partido em Minas estão com Patrus”, enfatiza Andrade.

Assim que Patrus chegou, as picuinhas partidárias foram deixadas de lado. Afinal, o que interessa mesmo àqueles que atuam na região é tirar do papel um antigo plano de revitalização do polo de moda. A começar pelo presidente da associação local, José Paulino Pires, todos querem amplos calçadões e boa iluminação nas ruas do polo. Na prática, desejam algo similar ao que foi feito na Savassi, a região mais sofisticada da moda mineira.

Pouco depois da caminhada, Patrus recebeu a Brasileiros no comitê do bairro dos Funcionários. Ele estava satisfeito com o resultado da caminhada e cheio de planos para a cidade. Conhecido principalmente pela atuação junto aos movimentos sociais, Patrus discorreu sobre as mais diversas vocações da capital mineira, da tecnologia de ponta ao teatro: “Sou um homem de cultura, sou um consumidor de cultura”, definiu-se. “Sinto com angústia que Belo Horizonte está encolhida também nesse campo”.

Patrus, como Lacerda, não nasceu em Belo Horizonte. Natural da cidade de Bocaiuva, onde foi criado junto com 14 irmãos, ele chegou a Belo Horizonte aos 20 anos para fazer faculdade de Direito. No começo da carreira, atuou como advogado trabalhista. Foi quando conheceu Lula, então dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo.

No PT desde a fundação do partido, foi vereador, prefeito e deputado federal, além de ministro do governo Lula. Aos 60 anos, dividia-se entre as aulas de Direito na faculdade, o cargo de pesquisador concursado da Assembleia Legislativa e a campanha a vereador do filho, quando virou o nome de consenso para disputar as eleições. Para isso, também pesou o fato de ter deixado a prefeitura com 85% de aprovação. “Tenho consciência de que posso fazer ainda mais e melhor. E tem outra dimensão que me move. Eu sou avô”, diz, citando os netos Davi, seis anos, e Izabela, um ano mais nova. “Aumentou o meu compromisso com o amanhã.”


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