Lula X Eduardo Campos

Foto: Hélio Campos Mello.
O PT vende seu peixe rio Capibaribe, em frente à rua da Aurora… Foto: Hélio Campos Mello.

PT de Humberto Costa chama o governador Eduardo Campos, fiel aliado do governo federal, de “traidor do Lula”. E o PSB de Geraldo Julio culpa os rachas do PT pernambucano pela implosão da Frente Popular do Recife, o que levou cada partido a lançar um candidato próprio. Quem primeiro roeu a corda? PT e PSB acusam-se mutuamente pelo rompimento da antiga aliança formada por 18 partidos (14 ficaram com os socialistas e quatro do lado petista).

O clima esquentou de vez no começo de agosto, quando o presidente nacional do PT, Rui Falcão, deputado estadual em São Paulo, deu uma entrevista ao Jornal do Commercio, de Pernambuco, em que fala do caráter nacional da disputa: “É uma questão de honra para nós ganhar a eleição no Recife”. Se ainda não era, passou a ser também uma questão de honra para Eduardo Campos, que não consegue falar com seu amigo Lula desde o começo de julho, quando tiveram um rápido encontro em São Paulo, depois de definidas as duas candidaturas. De olho em 2014, o que ambos os partidos negam, o fato é que a disputa eleitoral no Recife acabou jogando em campos opostos o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o neto e herdeiro político de Miguel Arraes, três vezes governador de Pernambuco, fiel aliado do PT desde a primeira eleição presidencial, em 1989.

Na chamada “guerra dos padrinhos”, os dois principais candidatos acabaram virando coadjuvantes de uma disputa nacionalmente radicalizada. De um lado, está o médico, jornalista e senador Humberto Costa, 55 anos, ex-ministro da Saúde de Lula, que vai para a sua sétima eleição majoritária (perdeu cinco); de outro, o administrador Geraldo Julio, 41 anos, principal secretário do governo Campos desde 2007, que disputa sua primeira eleição.

No final de agosto, quando a reportagem da Brasileiros esteve em Recife para conversar com os principais personagens dessa história, o resultado da disputa entre PT e PSB era imprevisível, com o DEM e o PSDB, os antigos inimigos dos dois partidos, agora destinados a apenas fazer figuração.

Pesquisas locais mostravam uma tendência de queda de Humberto Costa, líder desde os primeiros levantamentos, e a vigorosa curva ascendente de Geraldo Julio, desconhecido do eleitorado no início da campanha. Os números divulgados pelo Ibope em 3 de setembro, já sob efeito do horário eleitoral, confirmaram o que sentimos nas ruas. O candidato do PSB deu uma vigorosa arrancada e conseguiu ultrapassar o petista, passando de 16% das intenções de voto, em meados de agosto, para 33%, enquanto Humberto Costa caiu de 32% para 25%. Onipresente nos programas de rádio e televisão e nos cartazes de propaganda do PT espalhados pelas ruas e até em barcos no rio Capibaribe, Lula ainda não tinha ido ao Recife. Eduardo Campos também estava limitado ao programa eleitoral na TV, ainda sem sair às ruas para acompanhar o seu candidato. Nas páginas seguintes, os principais pontos da nossa conversa de quatro horas com o governador pernambucano e as andanças dos candidatos Humberto Costa e Geraldo Julio por morros e feiras dessa bela, mas maltratada cidade do Recife.

... e o PSB hasteia sua bandeira na Avenida Engenheiro José Estelita. Ao fundo, a mitológica Brasília Teimosa, hoje urbanizada. Foto: Hélio Campos Mello.
… e o PSB hasteia sua bandeira na Avenida Engenheiro José Estelita. Ao fundo, a mitológica Brasília Teimosa, hoje urbanizada. Foto: Hélio Campos Mello.

Mal pisamos no saguão do aeroporto dos Guararapes, saindo do finger, tocou o celular. “O governador está convidando vocês para almoçar com ele”, avisou a gentil secretária Rosa, que nos explicou como chegar ao Centro de Convenções, onde Eduardo Campos estava despachando, enquanto o Palácio do Campo das Princesas passa por uma reforma. Não poderia ter começado melhor esta viagem que nos levou ao Recife para retratar uma das mais polarizadas disputas da campanha eleitoral deste ano, que acabou antecipando os embates da sucessão presidencial de 2014. Afinal, o governador Eduardo Campos, 47 anos, ministro de Ciência e Tecnologia do primeiro governo Lula, presidente nacional do PSB, está no centro dos debates sobre o futuro político do País.

No táxi a caminho do Centro de Convenções, reparo na quantidade de retratos do ex-presidente Lula sorrindo ao lado de Dilma nos cavaletes de propaganda do petista Humberto Costa espalhados por toda a cidade. “O nosso povo gosta muito de Lula, mas o PT vai ter trabalho para ganhar aqui”, vai me dizendo o motorista Adiel, que justifica em seguida: “Sabe como é, Eduardo é Eduardo…”.

De bom humor e animado como sempre, o governador pernambucano mostrou apetite para repetir o prato e não parou de falar de política durante o longo almoço com cardápio trivial: peixe ao molho de maracujá, bife a rolê, arroz enfeitado e panqueca de ricota com espinafre. Para acompanhar, sucos de frutas da terra e refrigerantes.

Só depois do cafezinho, conforme o combinado, peguei meu caderno e a caneta e fui direto ao assunto desta reportagem: como ele está analisando o cenário da disputa de 2012, principalmente nas capitais onde se enfrentam PT e PSB, tendo como pano de fundo a sucessão presidencial em 2014.

“A eleição municipal é apenas municipal, sempre foi assim, mas eu sei que todo mundo quer fazer agora alguma ligação que remeta a 2014. Na verdade, os eleitores querem discutir os assuntos locais, embora alguns sejam comuns às grandes capitais: saúde, educação, segurança. Já teve hora em que a questão central foi o emprego, depois chegou a vez da segurança, agora é a saúde”, começa falando o governador, sem mostrar pressa para chegar onde quer.

Antes de entrar no episódio da ruptura com o PT para contar a sua versão, Eduardo defende e explica o papel do seu partido. “O PSB faz parte da frente que governa o País, e não é de hoje. Vem lá de trás, de 1989, quando Arraes apoiou a primeira candidatura presidencial de Lula. Fazemos parte desta caminhada. Apoiamos Lula no segundo turno em 2002 (no primeiro, o partido apoiou Ciro Gomes) e agora estamos no governo Dilma. Isto não pode ser apagado por conta de uma eleição municipal. Desde sempre o PSB fez uma opção clara pelo campo da esquerda. Nosso partido vem crescendo a cada eleição, defendendo a participação popular e a eficiência da gestão e por isso temos os prefeitos e governadores mais bem avaliados do País.”

Para mostrar sua lealdade ao “projeto político liderado pelo presidente Lula”, lembra que o PSB foi o partido que mais fez alianças com o PT nas eleições municipais deste ano e o primeiro a apoiar Fernando Haddad, em São Paulo. Em Fortaleza e no Recife, o governador diz que seu partido também procurou um entendimento em torno do candidato do PT, até o último momento, “mas fomos atropelados pelos fatos”. Nos dois casos, o governador atribui à falta de unidade do PT a decisão de lançar candidatos próprios, e não a uma estratégia previamente definida pelo PSB pensando em voo próprio já para 2014, como desconfiam os petistas.

Neste ponto, Eduardo Campos dá um exemplo e faz uma revelação: “A crise interna do PT atravessou todo o mandato do prefeito João da Costa, colocando em risco a hegemonia da Frente Popular do Recife. Para você ter uma ideia, em outubro do ano passado o ex-prefeito João Paulo, que bancou a candidatura de Costa, e rompeu com ele logo no início do governo, me procurou dizendo que queria sair do PT e vir para o PSB. Fui ao Lula e relatei a conversa com João Paulo”.

A exemplo do que fez ao bancar Haddad em São Paulo para evitar a disputa interna, Lula resolveu indicar um nome novo do PT na eleição do Recife, e lançou o deputado federal Maurício Rands, que era secretário de Campos. O resto da história é conhecido: João da Costa não aceitou a imposição e foi para a disputa com Rands na prévia do partido, que acabou sendo anulada pelo diretório nacional.

Nova prévia chegou a ser marcada, mas como os ânimos se acirraram, com graves acusações mútuas entre os vários grupos do PT, Lula e Rui Falcão acabaram optando por Humberto Costa, mas a sua indicação, da forma impositiva como aconteceu, com a intervenção da executiva nacional, dividiu ainda mais o partido.

Humberto tinha sido secretário das Cidades durante os quatro anos do primeiro governo de Eduardo Campos, com quem sempre teve uma relação muito boa. Com João Paulo, duas vezes eleito prefeito do Recife apoiado pelo PSB, o atual senador sempre andou às turras nas disputas internas do partido. Agora, surpreendendo a todos, João Paulo aceitou ser vice de Humberto, que desde o início já sonhava em ser o candidato de conciliação, chegando a pedir o apoio de Eduardo Campos junto a Lula.

“Fiquei sabendo pela imprensa que Humberto seria o candidato do PT com João Paulo de vice”, conta Eduardo, que não se conformou com o fato consumado. Quando Humberto anunciou que Lula falaria no dia seguinte sobre a nova candidatura do PT no programa de Geraldo Freire, um dos mais populares radialistas do Recife, Eduardo ligou para o ex-presidente. “Estou falando do gabinete onde o doutor Arraes recebeu os milicos, não sou homem de ser enquadrado por ninguém. Posso ser convencido, mas enquadrado, não.” Lula acabou não falando na rádio.

O governador atribui à falta de unidade do PT a decisão de lançar candidatos próprios, e não a uma estratégia previamente ao PSB pensando em 2014. Foto Hélio Campos Mello.
O governador atribui à falta de unidade do PT a decisão de lançar candidatos próprios, e não a uma estratégia previamente ao PSB pensando em 2014. Foto Hélio Campos Mello.

Foi neste ponto, depois de vários desencontros, que se deu a ruptura entre os dois velhos amigos, um magoado com o outro. E começaram os ataques mútuos de líderes dos dois partidos pela imprensa, que só pioraram as coisas, a ponto de Eduardo não conseguir mais falar com o ex-presidente. “As informações chegam filtradas a Lula, que fica isolado lá no instituto dele, falando com assessores e dirigentes do PT, como o Rui Falcão, e só quer saber da eleição em São Paulo. Eu esperei até o último dia para conseguir um entendimento com o PT aqui, ficamos de conversar, mas tive que escolher um candidato no meu partido porque já estávamos correndo o risco de perder a eleição para a direita, com a cidade sangrando e o PT brigando. Acharam que eu estava blefando…”.

A gota d’água, segundo os petistas, teria sido a aliança de Eduardo Campos com o senador Jarbas Vasconcelos, do PMDB, um antigo desafeto de Miguel Arraes e de Lula, mas o governador contesta esta versão. Num jantar de Eduardo com a presidente Dilma, em Brasília, do qual também participou o governador cearense Cid Gomes, na época em que o PT e PSB começaram a se estranhar, ela tocou no assunto: “Você precisa conversar com o Lula, ele está muito chateado com essa história do Jarbas”.

Atendendo ao conselho de Dilma, o governador ligou para Lula, mas lhe disseram que o ex-presidente estava em um sítio descansando e só poderia entrar em contato depois do dia 20 de julho. “Estamos no dia 24 de agosto e até hoje ele não ligou…” Segundo Eduardo, antes de Jarbas lhe dar apoio, “sem pedir nada em troca”, Lula tinha feito uma visita ao senador quando ambos estavam em tratamento no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. “Uma vez, tempos atrás, na casa do Lula, eu cheguei a colocar o Jarbas para falar com ele no telefone, sem problemas.” Depois do segundo café, o governador chega a 2014, ergue o tom de voz e fala firme o que gostaria de dizer a Lula quando encontrá-lo, mas sem querer criar mais polêmicas.

“Hoje, 2014 é da Dilma. Se não for dela, é do Lula. Até lá, ninguém sabe o que vai acontecer. Se daqui a dois anos a situação descarrilar, se o Lula não puder ser candidato… Estão futricando quem pode ajudar a não piorar a situação. Nós temos visão de campo político. Não vou permitir ser tratado com achincalhe político, tudo por causa de uma eleição municipal. Eu nunca disse que vou derrotar o Lula no Recife. Em 2006, eu dediquei minha eleição para governador a meu avô e ao Lula. O que não podemos é devolver o poder à direita. Se quiser ser candidato a presidente, vou dizer que sou candidato, não preciso pedir licença. Eu tenho 47 anos de idade e nunca mudei de lado político. Você acha que eu vou aderir à oposição? É isso que vou fazer? O Lula é que está transformando problemas locais em questões nacionais, precisa chegar mais perto da realidade.”

Como os dois não se falam pessoalmente, o diálogo é feito por intermediários, o que acaba gerando as tais futricas. O ex-ministro José Múcio, hoje no Tribunal de Contas da União, que esteve recentemente com Lula em seu instituto, levou este recado do ex-presidente ao governador: “Múcio, avise ele que vou ao Recife para eleger Humberto Costa”.

Outro intermediário relatou a Eduardo Campos uma frase que teria ouvido de Lula: “Eu queria fazer o Eduardo presidente pela minha mão, na hora certa, mas agora ele resolveu chegar lá sozinho”. O governador tem sobre a sua mesa um caderno de mais de 50 páginas com o título “PT X PSB” contendo a clipagem de notícias publicadas em revistas, jornais e blogs desde o dia 12 de junho.

Mágoas à parte, a parceria entre o ex-presidente e o governador permitiu a Pernambuco crescer acima da média nacional nos últimos anos, com obras para todo o lado. “Tem de entregar o produto, não basta fazer propaganda. É isso que me dá 90% de aprovação no Recife. Nós distribuímos 176 mil tablets nas escolas, o desemprego caiu de 16% para 5,5%, o número de homicídios caiu mais de 50%, os 500 melhores alunos das escolas públicas estão fazendo intercâmbio nos Estados Unidos e no Canadá, 3,5 milhões de pessoas saíram do racionamento de água no Recife, 2,5 milhões de pacientes já foram atendidos nas UPAs (Unidades de Pronto Atendimento)…” São números que Eduardo vai citando de cabeça, empolgado com o próprio governo e inconformado com os ataques injustos que ele diz estar recebendo do PT.

Logo, porém, ele abre de novo um largo sorriso e se permite fazer uma brincadeira com o ex-presidente Lula. “Ele falou que vem aqui para fazer campanha pelo Humberto… Pois no mesmo dia estou pensando em ir a São Paulo para fazer campanha pelo Haddad, que nós apoiamos…” Quando me dei conta, a conversa já tinha passado das cinco da tarde da última sexta-feira de agosto – hora de ir atrás dos candidatos em campanha.

Humberto sobe o morro

Humberto Costa. Foto: Hélio Campos Mello.
Humberto Costa. Foto: Hélio Campos Mello.

Final de tarde de sexta-feira no Recife. O trânsito lento e caótico chega a lembrar o de São Paulo nos piores momentos. Na rua Aloizio de Azevedo, 42, um casarão onde fica a produtora Center, encontramos Humberto Costa, que está há mais de três horas gravando seu programa de televisão. Com ar cansado, ele nos recebe no estúdio da produtora.

Não é para menos. O candidato do PT estava de pé desde as 5h30 da manhã, como faz quase todos os dias, para enfrentar mais uma romaria eleitoral, que só costuma acabar tarde da noite. Para ele, não chega a ser uma novidade. Virou quase uma rotina: esta é a sétima eleição majoritária na vida do candidato. A última tinha sido em 2010, quando ele foi eleito senador. Seu dia hoje começou cedo com uma entrevista à rádio Maranata, em Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana do Recife, e vai terminar no alto do Morro da Conceição numa caminhada que começa daqui a pouco. Esta entrevista à Brasileiros não constava da sua agenda, mas assim que terminou a gravação ele nos recebeu solícito para falar da campanha que ganhou importância nacional com a disputa aberta entre o seu padrinho Lula e o padrinho do adversário Geraldo Julio, o governador Eduardo Campos.

Nessas voltas que a vida dá, em 2003 trabalhávamos todos juntos em Brasília no começo do governo Lula: Humberto Costa, ministro da Saúde; Eduardo Campos, ministro da Ciência e Tecnologia (Geraldo Julio, seu assessor) e este repórter, Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República. O mundo é pequeno…

Conto a Humberto que tínhamos acabado de sair de uma longa conversa com o governador Eduardo Campos, que responsabilizou o PT pela implosão da Frente Popular do Recife. Tranquilo, falando baixo, Humberto dá uma versão oposta. “O PT não fez nenhum movimento que não fosse para manter a unidade da Frente Popular do Recife. Toda a disputa interna que aconteceu teve isso como pano de fundo, sempre na busca de um nome capaz de unir o PT e a Frente, e ganhar a eleição. O PSB, por intermédio do governador, sempre disse que qualquer que fosse a solução apresentada pelo PT, marcharia ao nosso lado. E nós também queríamos essa unidade. Até por razões de equilíbrio político, era fundamental que a prefeitura ficasse com o PT e o PSB com o governo do Estado”.

O que deu errado, então, para que os dois partidos lançassem candidaturas próprias? “Depois da decisão tomada pelo PT de lançar a minha candidatura, com o João Paulo na vice, o PSB optou por trilhar um caminho próprio, fazendo um movimento inclusive para tentar isolar o PT. Queria simplesmente que o PT aderisse a uma alternativa apresentada pelo PSB”.

Humberto Costa contesta que o governador não tivesse sido comunicado sobre a decisão do PT e só ficou sabendo pelos jornais. Garante que conversou com ele antes da reunião da executiva nacional que indicou seu nome.

“O nome de consenso do PT e da Frente foi trabalhado pelo presidente Lula. Eu avisei ao governador que iria ser candidato. O governador conversou com Lula no dia seguinte, em São Paulo, antes da Rio+20, no começo de junho. O PT nada fez para romper com a Frente Popular. Quem pode dizer o que vai acontecer daqui para a frente é o PSB. Acho que eles querem demarcar uma posição em relação ao PT, fazer um movimento de fortalecimento do partido deles. É justo que o PSB se fortaleça, mas não em cima de um aliado político.”

Visivelmente contrariado com o rumo que as coisas tomaram, tendo de passar a maior parte do tempo respondendo a questões sobre a ruptura com o PSB e as sequelas das brigas internas do PT, Humberto cita como exemplo das desavenças entre os dois partidos a aliança de Eduardo com Jarbas Vasconcelos, do PMDB: “Como explicar a aproximação deles com o Jarbas, maior adversário político de Arraes, de Eduardo e, principalmente, de Lula?”.

Como a maior parte da Frente Popular ficou com o PSB, isso se refletiu também no tempo de televisão de cada candidato. O socialista Geraldo Julio, desconhecido no início da campanha, tem 12m30s na TV, praticamente o dobro de Humberto, com 6m12s, o que já o levou ao segundo lugar nas pesquisas, à frente do ex-governador Mendonça Filho, do DEM.

Por isso, o candidato do PT intensifica a campanha nas ruas com a militância e bota a maior fé na presença de Lula em seu palanque, que estava prevista para o início de setembro. “Nós temos uma chapa muito forte, com a participação do João Paulo, o melhor prefeito que a cidade já teve. Sou senador e tenho uma liderança expressiva na capital. Lula, Dilma e João Paulo são os três principais eleitores no Recife. Sem dúvida, Lula faz a diferença.” Enquanto Lula não vem, Humberto, que é maratonista e calcula já ter andado 35 km nesta campanha, junta forças.

Geraldo vai à feira

Geraldo Julio. Foto: Hélio Campos Mello.
Geraldo Julio. Foto: Hélio Campos Mello.

Manhã de sábado no Recife. Não foi fácil localizar o candidato Geraldo Júlio na confusão armada pelos militantes do PSB pelas ruas do comércio em torno do Mercado da Água Fria, na zona norte, com a chuva indo e voltando. Franzino e ainda tímido no corpo a corpo com os eleitores, Geraldo era ofuscado pelo vereador Antonio Luiz Neto, presidente do Santa Cruz, clube mais popular do Recife, cujo estádio fica aqui ao lado. Grandalhão e despachado, Neto seguia à frente da caminhada e ia cumprimentando todo mundo com tapas nas costas como se fosse ele o candidato a prefeito.

No meio do rolo, encontrei o velho conhecido Luciano Siqueira, deputado estadual do PCdoB e agora candidato a vice na chapa de Geraldo, depois de ter sido vice de João Paulo nos dois mandatos do petista à frente da prefeitura do Recife. Veterano de muitas campanhas, desde a primeira disputa presidencial de Lula, Luciano me apresenta ao candidato, que eu só conhecia dos cartazes espalhados pela cidade. A cacofonia de carros e bicicletas de som tocando jingles e a gritaria dos cabos eleitores impede qualquer papo, que fica para depois.

Geraldo Júlio de Mello Filho, 41 anos, nascido no Recife, administrador de empresas, três filhos pequenos, funcionário de carreira do Tribunal de Contas do Estado, secretário de Planejamento e Gestão e depois de Desenvolvimento Econômico, uma espécie de Dilma de Eduardo Campos, nunca pensou em ser candidato a nada na vida, muito menos a prefeito. Foi escalado para a tarefa pelo seu amigo governador depois do rompimento da Frente Popular do Recife. Com seu uniforme de campanha – camisa branca, calça de brim e tênis –, Geraldo vai esticando a mão e alugando a orelha a quem encontra pela frente, sem muito jeito para pedir voto, mas cativando as pessoas pela forma humilde como pede licença para entrar nas lojas, padarias, farmácias, botecos, o que encontrar pela frente.

A chuva aperta quando a caminhada chega à feira-livre, seguindo em meio às barracas de frutas, verduras, carnes, peixes, farinhas, raízes, feixes de goiamuns, uma fartura de produtos _ e muitos eleitores. O mais animado é o compositor Paulo Isidoro, 52 anos, autor de um dos jingles da campanha. “Já fazia música para doutor Arraes”, conta orgulhoso, referindo-se ao lendário avô de Eduardo Campos, padrinho de Geraldo Julio. Para disputar o voto de 1,1 milhão de eleitores, a Frente Popular formada por 14 partidos lançou 388 candidatos a vereador. O mesmo ritual da caminhada, uma tradição no Recife, já se repetiu por visitas a 38 comunidades e bairros visitados e 30 quilômetros percorridos a pé.

Após rápida entrevista coletiva em que não consegui ouvir nada, subimos na van do candidato, que promete pela janela: “Obrigado, pessoal, eu volto aqui…”. A caminho de seu escritório, no bairro de Casa Forte, Geraldo conta que, desde 1995, quando trabalhou no terceiro e último governo de Miguel Arraes, sempre foi chamado para ocupar alguma função pública, chegando à presidência do Complexo Portuário de Suape, o principal projeto de infraestrutura implantado no Estado, cargo que acumulava com o de secretário antes de sair candidato a prefeito. Sua boa fama de executivo chegou a Brasília, onde tinha sido assessor de Eduardo Campos no Ministério de Ciência e Tecnologia. Recentemente, foi convidado pelo empresário Jorge Gerdau Johannpeter para ser secretário-executivo da Câmara de Gestão que assessora a presidente Dilma Rousseff, mas não pode aceitar. Filho de uma família de classe média, Geraldo começou a pegar gosto pela política com 11 anos, quando já ia às ruas com os pais para participar de campanhas de Miguel Arraes. Apesar do seu perfil de tecnocrata, o candidato do PSB gosta mesmo é destas caminhadas.

“A parte mais agradável da campanha para mim é este contato com o povo no meio da rua. O resto é só reunião…”. Já na sala do seu escritório, que fica a 200 metros do comitê central de Humberto Costa, na Rua do Encanamento, Geraldo Júlio se empolga ao falar dos rumos da campanha. “Eu sinto na forma como as pessoas me recebem, pegando no meu braço, que elas precisam de uma esperança. As coisas não podem ficar do jeito que estão, elas me dizem. No começo, me diziam: ah, você é o amigo do governador, o candidato dele. Agora, não. Muitos já me chamam de Geraldo, sabem quem eu sou…”.

Nestes dois meses de campanha, o que mais o impressionou foi ver de perto as precárias condições de vida na comunidade do Caranguejo, na Ilha do Retiro. “As condições de moradia lá são sub-humanas, com o esgoto correndo na porta das casas. Nós temos 22% da população do Recife vivendo assim, em favelas e palafitas. Tenho notado uma mudança de expectativa da população em relação aos governos. A geração mais velha não acredita mais em ninguém, mas a geração nova não só tem esperança, como te cobra”. Para Geraldo, existem duas realidades a ser enfrentadas: a dos problemas históricos da cidade (alagamentos, habitações em áreas de risco, saneamento) e os mais recentes, ligados à mobilidade urbana.

“O trânsito aqui está parando não só nas grandes avenidas, por causa do volume de veículos, mas dentro dos bairros devido à falta de fiscalização, com carros estacionados dos dois lados da rua, impedindo a passagem dos ônibus e causando congestionamentos atrás deles”. O que mais incomoda o candidato é o sentimento de desesperança que domina boa parte da população. “Toda vez que se fala de alguma experiência bem sucedida em outras cidades, as pessoas respondem que aqui no Recife não vai dar certo”. Por isso, assim como Lula em suas campanhas sonhava com o dia em que todos os brasileiros pudessem ao final do seu governo comer três refeições por dia, quer dizer, acabar com a fome, Geraldo diz que se sentiria realizado se puder resgatar o orgulho do povo do Recife.

“Precisamos recuperar o sentimento de autoestima do recifense e isso não se faz só prometendo obras. Houve uma mudança na sociedade, uma transformação política, a cobrança aumentou: é preciso entregar o produto”. Geraldo Júlio, ao contrário de Eduardo Campos, gosta mais de falar de administração do que de política, mas o discurso do candidato nesta área está bem afinado com o do governador. Não aceita a acusação de que o PSB tenha traído Lula. “O PSB está com Lula, está com Dilma, é uma injustiça dizer o contrário. Nós esperamos até os 48 minutos do segundo tempo que o PT encontrasse um candidato de consenso da Frente Popular do Recife, mas o partido não está unido até hoje. Os 14 partidos da nossa coligação são da base da presidente Dilma. O que não podíamos era correr o risco de entregar o Recife para a direita”.


Comentários

2 respostas para “Lula X Eduardo Campos”

  1. Avatar de ADÃO LUIZ RIBEIRO NUNES
    ADÃO LUIZ RIBEIRO NUNES

    São uma maioria de defensores,disputando o seu próprio interesse e longe a ética,a moral,o respeito por aqueles que está representando.
    Os três e pré candidatos a presidente da República,tiveram a oportunidade em amenizar o problema da Saúde,Segurança e Educação e a situação em que está vivendo o país,demonstra que não houve interesse de vossa excelências,pois,o Brasil vive um caus e não é com bolsa esmola que resolve os problemas sociais e sim,dando incentivo fiscais aos empresários,exigindo deles condições de renda aos pais de família,na segurança pública,punir com rigor aos criminosos e que haja exemplo para que não aumente as estatísticas,pois aqueles que que fazem as leis e que podem mudar alguns artigos de leis tem medo de sofrer por elas e sendo assim,se omite e nada fazem e por isso não merecem o meu voto e senão aparecer candidatos a altura,será nulo o meu voto e de todos aqueles que estiverem de acordo com meu raciocínio.
    Na saúde não há investimento,o país está doente e o povo aguarda em suas casas o comunicado para uma consulta médica e para um agendamento de um exame e que chega a levar anos,até retornar ao médico novamente com o tal exame em mãos e que muitas vezes,a família diz que o paciente já faleceu.
    Parece brincar de fazer política,neste país,se gasta fortuna com processos,se acumula,pilhas e pilhas de prova contra políticos e na hora H e alguns ainda conseguem se livrar,se deveria acabar com nomeação de alto escalão na nossa justiça,isso é um mal a sociedade,não se pode misturar,em muitos casos é de desconfiança,caso mensalão,não tiveram suas condenações a altura dos crimes,os quais praticaram.

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