Num fim de semana prolongado, no final do inverno passado, o Centro velho de São Paulo parou. Em plena Praça da Sé, o ator Kiefer Sutherland, o astro do seriado 24 Horas, encenava o comercial criado pela agência Euro RSCG Brasil para o lançamento do C4 Pallas, da montadora Citroën. “É uma forma de exportarmos o talento brasileiro. O filme seguirá do Brasil para a Argentina e de lá para outros mercados”, disse Jader Rossetto, vice-presidente de criação da Euro RSCG Brasil, uma das mais importantes redes de publicidade européias.
“O Kiefer não topa fazer qualquer comercial, nem precisa mais disso, mas adorou o roteiro, o que prova nossa capacidade de criar e dirigir atores internacionais”, afirmou Rossetto. O caso da Euro RSCG Brasil não é isolado. As produtoras nacionais criaram a Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais (Apro), para provar, na prática, que o Brasil é aquilo que definia Darcy Ribeiro: lindo pela própria natureza, fruto de sua diversidade racial, cultural, religiosa e geográfica.
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E foi essa pluralidade que levou a Apro e profissionais como Rossetto, incluindo diretores de filmes publicitários e cinema, como Fernando Meirelles, Andrucha Waddington, Paula Trabulsi, Paulo Schmidt e muitos outros, a criar, há quatro anos, o projeto FilmBrazil, que está transformando o perfil do País de importador a exportador de filmes publicitários.
A diretora executiva da Apro, Sônia Regina Piassa, lembra que, de um fluxo de receita de exportação de US$ 800 mil no início desta década, chegamos a US$ 6 milhões em 2005, passando para US$ 15 milhões no ano passado. “A previsão, em que pese a desvalorização do dólar em relação ao real, é de encerrarmos o ano com exportações de US$ 18,5 milhões e mais de 240 filmes comerciais feitos aqui, exibidos em outros mercados”, calcula ela.
O projeto FilmBrazil reúne 65 produtoras, assim como empresas de locação, casting (elenco) e som. “As agências internacionais e os anunciantes começam a perceber que o Brasil pode ser uma excelente rota para suas produções, por conta da criatividade e da diversidade brasileiras”, diz Sônia.
Um novo atalho para o mercado externo foi aberto com o convênio firmado com a Apex-Brasil, a agência de fomento das exportações, que está apoiando, dentre outras ações, a participação das produtoras brasileiras em festivais internacionais como Cannes, Londres, Nova York e outros.
“O saldo é extremamente positivo. Os investimentos em torno da marca FilmBrazil são por volta de US$ 1 milhão, divididos entre a Apex e as produtoras em partes iguais, e as exportações devem render quase US$ 20 milhões”, avalia a diretora. “Os Estados Unidos são uma potência porque priorizam o cinema e a produção audiovisual, a partir dos quais propagam mundialmente sua cultura, seus valores. E o Brasil tem muito mais a mostrar, tem a fusão de raças, crenças, regiões geográficas e produção diversificada. Só falta ganhar dinheiro com isso”, filosofa Sônia.
Para além da filosofia, ou colada a ela, o que a Apro deseja é que o País abocanhe uma fatia um pouco maior dos US$ 9 bilhões que circulam por ano no mercado publicitário em produções internacionais de audiovisual. A chilena Irma Palma, sócia da produtora Bossa Nova Films e da Be Bossa Nova, é entusiasta defensora do Brasil como destino para produções internacionais.
Há oito anos no País, ela tem convencido agências e realizadores externos a fechar negócios para ampliar a fatia da Bossa Nova no mercado internacional. Em três anos, a produtora produziu 30 filmes para agências de outros países, além de convidar e convencer diversos diretores estrangeiros a filmar aqui.
“Temos gente de todos os tipos, de todas as raças; cidades que têm inverno e chalés europeus; castelos e palácios; favelas, casas coloridas, praias, cânions, deserto, sertão, cerrado. Enfim, o que for preciso está ao alcance da mão”, conta Irma.
Para Lorenzo Giunta, sócio da produtora Ioiô, que também tem exportado filmes audiovisuais, o País deve pisar ainda mais forte no “acelerador” da exportação de comerciais e filmes. “Hoje, há uma demanda pelo novo, e o novo é o Brasil nesse cenário. Nossa liberdade de linguagem e criação é o que encanta o olhar estrangeiro. Agora estamos aprendendo a transformar isso em negócio”, conta Giunta.
Os irmãos Francesco e Adriano Civita e o diretor Caíto Ortiz, sócios da produtora Prodigo, destacam, por sua vez, o “sotaque” da publicidade brasileira. “Estamos exportando comerciais produzidos para uma grande multinacional de alimentos para países como Rússia, Polônia e Índia. Isso estimula a busca por uma linguagem universal, mas preservamos o ‘tempero’ local, que é bem apreciado por nossos clientes”, diz Francesco Civita.
Outro exemplo desse acento local pode ser observado no comercial feito pela produtora Jodaf Mixer especialmente para a marca de refrigerantes alemã Punica. Encomendado pela rede de publicidade Grey World, da Alemanha, teve como cenário o Rio antigo. A Jodaf, que tem dentre outros clientes a Perdigão, exporta principalmente para países da América Latina.
“O Brasil ainda tem muito espaço para crescer no mercado internacional”, diz Irma. Mas, para avançar, segundo ela, é preciso seguir o refrão de Querelas do Brasil, a canção de Maurício Tapajós e Aldir Blanc, popularizada por Elis Regina: que o Brasil conheça o Brasil e os brasileiros, a sua riqueza cultural, racial, religiosa e geográfica, teclas de uma única música e retórica de Darcy Ribeiro: o brasileiro.
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