Há quase nove anos, no dia 24 de junho de 2008, morreu Ruth Cardoso. Mulher de Fernando Henrique, dona Ruth tinha 77 anos e foi primeira-dama de janeiro de 1995 a janeiro de 2003. Sua morte foi assunto do número 12 da Brasileiros, em cuja capa publicamos a foto do abraço de Lula e Fernando Henrique no velório, na Sala São Paulo. Sobre a foto, no texto da capa, mais que defendíamos, augurávamos que aquele gesto entre dois adversários era tão forte quanto a dor da morte e que a perda de Ruth Cardoso reaproximava Lula e Fernando Henrique. Além disso, o abraço convidava a uma reflexão em meio àquele tiroteio político que assolava a Nação. Naquele momento, apesar de tudo, em meio aos vários ovos de serpentes espalhados, a Nação crescia.
Lula, então presidente da República, foi de Brasília ao velório, na Sala São Paulo, com dona Marisa e trouxe, também, Idalina, camareira do Palácio da Alvorada. Ela havia cuidado do casal Cardoso e queria despedir-se de Ruth. Dizíamos no fecho do editorial daquela edição: “Acreditamos que não se faz um país com mesquinhez. Acreditamos que um país se constrói com grandes gestos. Como o gesto da capa desta nossa edição de primeiro aniversário”.
No dia 2 de fevereiro de 2017, morreu Marisa Letícia Lula da Silva. Mulher de Lula, dona Marisa tinha 66 anos e foi primeira-dama de janeiro de 2003 a janeiro de 2011. Aqui na foto abaixo ela participa de uma passeata de mulheres em São Bernardo do Campo, em 1980, quando Lula estava preso pela ditadura militar que ele ajudaria a derrubar.
O tempo passou e, neste nosso número 114, perto do aniversário de 10 anos da Brasileiros, o tiroteio político é maior, o Brasil menor e a intolerância, bem, esta teve crescimento exponencial. O que mostra que os gestos são bem-vindos, mas não são suficientes. Além deles, necessitamos de ações. Ações concretas em direção ao entendimento. Para isso, de um lado o ódio tem de ser intensamente medicado e as serpentes – já não há mais só ovos – precisam ser domadas. Como aqueles médicos que se divertiram com a desgraça da paciente Marisa Letícia. No outro lado a nostalgia da perda e a ansiedade da recusa* têm de ser cuidadosamente trabalhadas. Antes que seja tarde.
* Leia na Brasileiros 113, à página 36, ou no site o texto de William Nozaki
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