Uma série de telas, que enchem os olhos com suas cores vivas e traços puros, chama a atenção no escritório de Wolf Kos. As telas foram pintadas por crianças e jovens com Síndrome de Down. “Quando você vê esses meninos em uma exposição, alegres, mostrando a sua obra, explicando a técnica que usaram, é uma emoção muito forte, só comparada à do nascimento de um ente querido. Marca muito”, diz ele. As obras são resultado do trabalho do Instituto Olga Kos, criado há três anos em São Paulo por Wolf, que promove oficinas de arte, sob a orientação de artistas consagrados, em dez entidades que dão apoio a deficientes intelectuais, entre elas, APAE e Pestalozzi. Há um ano, também realiza atividades na área do esporte. “A maior dificuldade de quem tem Down é a comunicação. E por meio da arte, você abre esse canal”, afirma. “O esporte dá consciência corporal, equilíbrio e autoestima”, completa.

Wolf fala com alegria do menino que vivia trancado em seu próprio mundo e começou a se expressar, da jovem que passou a se sentir socialmente incluída, da menina que melhorou a coordenação motora e aprendeu a se concentrar. “A gente recebe cartas dos pais dessas crianças agradecendo todos os dias. Mas, não há dúvidas de que o amor que elas dão para a gente é muito maior que o que damos a elas”, afirma.
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Diferentemente da maioria das histórias de vida que levam à criação de instituições desse tipo, Wolf não passou por uma experiência relacionada à Síndrome de Down. Não tem familiares com a deficiência. Até 2006, quando decidiu que iria desenvolver um trabalho nessa área, nunca tinha tido contato com deficientes intelectuais. “Você não precisa ter um filho com deficiência para se envolver em uma causa”, argumenta ele, que tem dois filhos.

Como engenheiro e corretor de imóveis – atividades que exerce até hoje -, Wolf relembra que dedicava muitas horas ao trabalho. “Meu hobby era trabalhar. Gostava de tomar um bom uísque e de ir a um bom restaurante. Era bom de comer.” Até que teve de passar por uma cirurgia no coração. Ponte de safena. A operação foi bem-sucedida, mas Wolf sofreu uma infecção hospitalar e teve de amargar 12 longos meses em uma cama. “Comecei a me questionar: ‘O que você deu de si para fazer o bem a alguém?’. Daí, você começa a refletir por que razão entesourar 1.200 obras de arte em casa”, afirma. Colecionador desde a década de 1980, Wolf colocou seu acervo, que conta com obras de Aldemir Martins, Lasar Segall, Mário Gruber, entre outros, à disposição da instituição que, no ano passado, realizou seu primeiro leilão.

A inspiração para criar o Instituto Olga Kos surgiu nessa fase, de balanço da vida. “Eu passava o dia na cama, tinha tempo de sobra e ficava vendo novela.” Era época de Páginas da Vida, trama de Manoel Carlos que trazia uma personagem com Síndrome de Down. “Na novela, havia um instituto cultural. Pensei: é isso que vou fazer.” Wolf mergulhou no tema e consultou até a cabala. Segundo ele, para a cabala, o “Down é um anjo que Deus manda a sua semelhança em amor e carinho para fazer o mundo um pouco melhor”. “Eles são especiais, falam direto com Deus.”

Entre ter a ideia e colocar o projeto em prática foram três anos. Em 2007, no bairro dos Jardins, em São Paulo, Wolf inaugurou o instituto, o qual batizou com o nome da mulher, a médica pediatra Olga. “Foi uma homenagem. Graças a ela, eu não desisti da vida. Ela fica à frente de tudo hoje. Eu só vou atrás de dinheiro e dou entrevistas”, brinca.

Cada ano, o Instituto elege um artista para ministrar a oficina de arte para os jovens com Síndrome de Down – em 2010 foi Gustavo Rosa. A diferença entre a atividade desenvolvida pelo Instituto Olga Kos e pelas entidades para as quais eles colaboram – APAE, Pestalozzi, etc. – é que a oficina de arte é mais do que uma atividade lúdica. Ela ensina uma técnica de arte. Cada oficina dura dois meses. “Em um ano, faço quatro oficinas em cada instituição. No total, atendemos 800 pessoas”, contabiliza. Além do artista convidado, as oficinas contam com uma equipe multidisciplinar, que inclui psicólogo, pedagogo e arte-educador. “Não trabalho com voluntários. Infelizmente, no Brasil, voluntário um dia pode, no outro, não pode. Não posso lidar com isso, as crianças estão esperando. Por isso pago e pago bem.”

Chama a atenção a organização e o planejamento dos programas do Instituto e sua grande preocupação com o aprimoramento de suas metodologias. O Olga Kos conta com o trabalho de empresas especializadas em pesquisa, para fazer a avaliação dos programas aplicados. “É importante para ver o que melhora na vida desses jovens e crianças”, afirma. Entre os itens avaliados estão autoagressividade, linguagem, memória, fala e compreensão.

Com base nessas pesquisas, o Instituto traçou um perfil dos deficientes intelectuais e desenvolveu um projeto para incluí-los no mercado de trabalho. O Instituto Olga Kos é responsável pelo primeiro concurso público nacional para pessoas com deficiência intelectual, uma conquista obtida em parceria com o Creci (Conselho Regional de Corretores de Imóveis), em 2009. “Dois jovens trabalham no Creci, desempenhando funções administrativas.”

Percebendo dificuldades também físicas em muitos dos jovens com deficiência intelectual, o Instituto criou no último ano oficinas esportivas, mais precisamente, aulas de caratê e tae kwon do. “Diferentemente das oficinas de arte que acontecem durante dois meses, as aulas de artes marciais são ministradas o ano todo. Elas são abertas a quem estiver interessado e acontecem na própria academia.”

Ao ingressarem na aula, os alunos ganham uma mochila com agasalho, quimono, sandália e toalha. “Depois do treino, há um lanche. Por programas como esses, que integram saúde física e mental, além de promover a inclusão social, o Instituto Olga Kos coleciona prêmios. Um deles é o Cultura e Saúde, concedido pelo Ministério da Cultura, em 2008. O Instituto foi o único a ganhar nota máxima na região Sudeste.

“A pessoa que dispõe do seu tempo para fazer uma obra beneficente está fazendo um ato de amor. Porque tudo na vida se resume a um segundo. Amar ou desamar, abraçar ou rejeitar. É a mudança de atitude naquela fração de segundo que faz com que as coisas mudem. O que você faz depois é pensar na atitude que tomou. E nesse, segundo, a gente opta pelo amor”, conclui.

Guimarães ao vivo

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