Exibida pela TV Cultura em 2009, a minissérie Trago Comigo é a gênese do novo longa-metragem da cineasta paulistana Tata Amaral. O filme, homônimo, conta a história de Telmo Marinicov (Carlos Alberto Riccelli), um diretor de teatro às voltas com a memória rarefeita de sua atuação, no início dos anos 1970, em um grupo de guerrilha armada que lutou contra a Ditadura. Preso durante uma ação do grupo, ele foi submetido a sessões de tortura. Sobreviveu à sanha dos militares, mas a Reconstrução de SUA vida apos o Episódio traumático foi um processo tortuoso.
Quarenta anos depois, ele revira os escombros da memória em busca de reconstituir o que vivenciou naqueles dias sombrios e, sobretudo, de desvendar um enigma que o atordoa: afinal, que fim teve Lia, sua namorada?
Incentivado por Lopes (Emilio Di Biasi), amigo de longa data, que também aderiu ao grupo de guerrilha urbana, Marinicov decide voltar a dirigir um espetáculo. Determinado a construir uma dramaturgia baseada em sua experiência nos porões da ditadura, ele utiliza o processo de carpintaria da peça como forma de reconstituir o que, de fato, ocorreu a ele e aos amigos de luta armada. A formação do elenco inclui jovens como Mônica (Georgina Castro), namorada do diretor, que interpreta Lia, Miguel Jarra (Felipe Rocha), um ator de TV que, mesmo alheio às questões históricas abordadas na peça, faz o protagonista, um alter ego de Marinicov, e Marcelo (Julio Machado), integrante do grupo de guerrilheiros, ironicamente, ainda mais desinformado que Miguel.
Talvez resida no fato de incluir na trama personagens com esse grau de alienação o fato de Tata permear as sequências ficcionais de Trago Comigo com depoimentos reais de vítimas da ditadura. Ao longo do filme, a diretora expõe relatos contundentes do horror a que foram submetidos sete presos políticos, Criméia Alice Schmidt de Almeida, Rita Maria de Miranda Sipahi, Ivan Anselmo de Seixas, Maria Amélia de Almeida Teles, Sérgio Sister, Rose Nogueira e Elza Ferreira Lobo. O misto de ficção com documentário dá ao filme um caráter didático, pontual em tempos de ascensão do ultra-conservadorismo no País.
Em agosto de 2015, Trago Comigo teve uma pré-estreia no Festival Latino-Americano de Cinema. Na ocasião, em entrevista ao site de Brasileiros, Tata comentou as nuances entre filme e minissérie. “O foco da série tinha mais a ver com uma superação do Telmo e a relação dele e Mônica. Já no filme, a ideia é mais voltada para o trauma do protagonista com a ditadura militar. Temos dificuldade em falar desse passado traumático.”
Outro aspecto abordado pela diretora, que no final dos anos 1970 militou no grupo Libelu, Liberdade e Luta, foi a decisão de não mencionar o nome dos agentes de repressão, alguns deles facilmente identificáveis, como o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, para evitar retaliações jurídicas. “Não existiu um governo censurando, mas um Judiciário. O fato de nunca termos julgado e condenado os torturadores determina a violência que é praticada até hoje. Resta à Justiça fazero seu papel e condenar os anônimos de farda.”
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