Mesa sobre José Lins do Rego se destaca na Fliporto

fliportoA Fliporto tratou muito bem de seus homenageados. Se o mestre Edson Nery da Fonseca, pioneiro  nos estudos multidisciplinares de Biblioteconomia, escritor e critico literário, foi o patrono da Feira de Livros, sempre lotada, a obra do escritor e cronista José Lins do Rego foi discutida em várias mesas com brilho, em particular aquela que reuniu na sexta, dia 15, os estudiosos Ivan Marques, Bernardo Buarque de Hollanda e Luciano Trigo, com mediação empolgante de Zuleide Duarte.

Cada qual soube destacar alguns aspectos menos conhecidos do escritor paraibano de forma didática, mas nunca simplista e/ou acadêmica, sem cair na chatice. Quem esteve lá conheceu o Zé Lins cronista esportivo, apaixonado pelo Flamengo e por Leônidas da Silva, a ponto de tornar-se dirigente do clube e da extinta CBD, Confederação Brasileira de Desportos. Conheceu também o Zé Lins rival dos modernistas de 22 – ao lado de Gilberto Freyre -, mas também admirado por Mário de Andrade. E, por fim, o grande escritor da memória, o “Proust rústico” de nossa literatura.

Saramago
Outro grande momento da Festa Literária em Olinda, conduzida com elegância pelo curador e escritor Antonio Campos e pelo coordenador literário Mário Hélio, foi a abertura do Congresso Literário, com Pilar Del Rio, viúva de Saramago e, em que pese a presença também da bela e talentosa Maitê Proença, a verdadeira musa do evento. Dela partiram as frases mais contundentes e emocionantes da Fliporto. Ao comentar, por exemplo, a onda de crises financeiras, ela foi enfática e disse: “Não há crises financeiras, o que há é uma grande crise moral”. Falou também de como Saramago a fez entender a diferença entre caridade e solidariedade – esta superior – e da importância da amizade. 

Maitê Proença. Foto: Divulgação
Maitê Proença. Foto: Divulgação

Bem-humorada e cativante, Pilar revelou ainda o que inspirou Saramago a escrever Alabardas, alabardas! Espingardas, espingardas!, livro sobre o tráfico de armas que deixou incompleto e que deverá ser lançado em breve. Segundo ela, foram as histórias que leu a respeito de sabotadores de fábricas de armas; no caso, um grupo de italianos na Segunda Guerra Mundial, que terminaram sendo fuzilados, e o episódio de uma bomba não explodida na Guerra Civil Espanhola, a qual, aberta, continha o seguinte bilhete: “Essa bomba não foi feita para matar”. 

Futebol e crianças
Na sexta, o futebol adorado por Zé Lins do Rego, também entrou em campo em outros horários. Juca Kfouri, comentarista esportivo, colunista e autor do livro Porque não desisto – Futebol, poder e política, entre outros, falou em duas mesas sobre o onze contra onze. Na primeira, juntou-se ao romancista, crítico e tradutor Marcelo Backes, que lançou recentemente O último minuto, romance cujo protagonista é um técnico de futebol e Francisco José Viegas, autor do policial Morte no Estádio, em que um jogador do Porto é assassinado. Show de bola. No dia anterior, já tinha falado às crianças, que, aliás, assim como os jovens adolescentes, têm sido protagonistas na Fliporto.

Onde quer que se vá nos belos cenários montados no Parque do Carmo em Olinda, o que se vê e ouve é a algazarra dos pequenos, que tornam a festa mais animada. Lotam o parquinho, brincam em volta do coreto da literatura de cordel, participam ativamente das atividades ecológicas, das oficinas de leitura, das brincadeiras e gincanas e das mesas, onde cantam com os músicos que se apresentam e fazem perguntas aos autores. Foi assim com as ótimas escritoras Alessandra Roscoe e Ana Cláudia Ramos, e também com a veterana Ana Maria Machado, presidente da Academia Brasileira de Letras.

Pena que Machado não tenha entrado tanto no espírito festivo da Fliporto, cujo tema principal é “A literatura é um jogo”. Na mesa deste sábado, em que iriam discutir se “escrever é retornar à infância” mostrou-se indisposta em relação às perguntas, ainda que tenha dito coisas muito interessantes. O simpático Ronaldo Correia de Brito, que, como ela, é escritor premiado tanto no gênero infantojuvenil quanto no adulto, “jogou” com mais empenho, colocando reflexões aprofundadas sobre sua experiência. A jornalista Mona Dorf mediou a mesa com a elegância e inteligência, e não deixou o clima esfriar.

Atividade para as crianças na Fliporto. Foto: Divulgação
Atividade para as crianças na Fliporto. Foto: Divulgação

Bauman
Ontem também foi dia de uma mesa bastante curiosa, da qual o sociólogo Zygmund Bauman participou em vídeo gravado em sua casa na Inglaterra – ele não pode vir devido à idade avançada, 88 anos. O assunto não podia ser mais atual: “Consumir, protestar, espionar e outros temas incômodos, no jogo da sociedade moderna”. Após o vídeo, realizado pelo jornalista Sillio Boccanera, o próprio Boccanera assumiu o microfone para comentar com a plateia e o economista Sergio Besserman Vieira as provocações levantadas. Entre elas, a crescente separação entre poder, hoje globalizado, segundo Bauman, e política. E a descaracterização da identidade do ser humano, que cada vez mais se define como consumidor. 

Ao final do dia, como era de se esperar, muita gente fez fila para ver e ouvir Maitê Proença falar sobre seu livro de crônicas É duro ser cabra na Etiópia, ao lado do também cronista Francisco Azevedo, com mediação de Gerson Camarotti.


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