Ao final do livro, o prezado leitor não vai conseguir fazer um 4, na previsão mais otimista de um boêmio religioso. O recomendável, aliás, é que o luxuoso volume seja lido naquela mesa de canto mesmo, perto da janela, com muito chope, no final de uma tarde durante a semana. Se for uma segunda- feira, melhor ainda, em descarada libertinagem e fuga da chatice do universo. Afinal de contas, iremos morrer sem tomar conhecimento do que querem as mulheres, como previu o doctor Sigmund, mas sabemos muito bem, desde sempre, o que queremos dos nossos botequins e demais templos hedonistas. Queremos as orações solitárias para suportar o trabalho e os dias, queremos o encontro entre os amigos que perpetuam cada vez mais o mito da cordialidade envelhecida em barris de Salinas, queremos tudo que cabe entre o primeiro gole na cerva gelada até a saideira, a última instância humana de um homem de boa vontade.

Original – Histórias de um Bar Comum (Editora DBA), com texto de Nirlando Beirão e fotos de Rômulo Fialdini, é um roteiro afetivo e sentimental por grandes templos da boemia, do clássico Harry’s de Veneza ao Bracarense carioca. No passeio, graças à escrita cinco-estrelas de Nirlando, sentamos às mesas européias e cubanas do velho Hemingway, ouvimos o burburinho na suave noite de Scott Fitzgerald e na roda turbulenta de Dorothy Parker, grandes representantes das letras embriagadas da América.
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O bar Original, de São Paulo, é mote e ponto de partida para este bonde chamado hedonismo. Mote e uma bela desculpa – o bom bebedor é um mestre na arte de criar álibis nas suas bebedeiras – para contar boas histórias dos grandes bares do mundo, incluindo os tradicionais botequins paulistanos e cariocas. Como louva o publicitário Washington Olivetto, escalado para o texto aperitivo e a saideira, o livro tem misturas na dose certa do Harry´s Bar de Veneza com o Elídio Bar da Mooca. De Jean-Paul Sartre com Ismael Silva. De Isadora Duncan com Leila Diniz. De carpaccio do Cipriani com bauru do Ponto Chic. De São Paulo com o Rio. De Nova York com São Francisco. De Oscar Wilde com Hugo Carvana. De Ipanema com Vila Madalena.

Se bar é cultura, como diz um dos capítulos, algum maluco chato e abstêmio – claro! – pode até levantar suspeitas científicas, mas que o bar é a mais democrática, ecumênica e politeísta das igrejas, não temos dúvidas. Lá se encontram os verdadeiros homens de fé e boa vontade. Afinal de contas, como disse o irmão Groucho Marx, todo sujeito tem de acreditar em alguma coisa… Eu creio que vou tomar outro uísque.


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