Minha luta contra o cigarro: perdi

Gostaria muito de não ter que escrever este texto. Sempre busco contar histórias vitoriosas com final feliz. Desta vez, não deu.

Perdi a batalha contra o cigarro, depois de três semanas de abstinência, e me vejo agora na triste obrigação de dar uma satisfação aos leitores e aos amigos que tanto me incentivaram ao longo destes últimos dias.

Não tem desculpa nem explicação. Na vida aprendi a ganhar sem ficar besta e a perder sem colocar a culpa nos outros.

Lamento apenas decepcionar as pessoas que me querem bem e todas aquelas que escreveram para o Balaio contando suas histórias vitoriosas contra o fumo para me servir de exemplo. Espero que outras pessoas tenham se valido deste incentivo.

Não sou exemplo para nada nem ninguém. Por isso, aproveito este espaço para dar meu testemunho aos jovens que ainda não começaram a fumar: que nunca caiam na tentação de experimentar um cigarro.

E, aos que já fumam, para que larguem disso o mais rápido possível. Busquem ajuda médica, façam um tratamento. Quanto mais o tempo passa, mais difícil fica para se livrar do fumo, como aconteceu comigo.

Depois de 48 anos de vida de fumante, tantas coisas na minha rotina diária, como escrever, por exemplo, ficaram ligadas ao cigarro _ não gosto de usar a palavra dependência, mas é disso que se trata _ que a todo momento me voltava a vontade de dar uma tragada. Estava ficando mais ansioso, intransigente e chato do que de costume.

Muita gente me falou e me escreveu que ganhar a luta contra o cigarro só depende de força de vontade. Pois minha vontade de voltar a fumar foi mais forte em mim do que a força de vontade para me manter longe do cigarro.

Escrever este texto, creiam, foi o mais difícil para mim em toda a carreira. Mas sempre achei melhor falar logo a verdade. Não tenho mais idade para fumar escondido de ninguém, nem da família, nem dos meus fiéis leitores, que fizeram deste Balaio um agradável ponto de encontro e de troca de idéias e experiências.

Peço desculpas a todos, mesmo sabendo que estas coisas não têm perdão. Vida que segue.

Em tempo: depois que postei este texto, fui arrumar a bagunça na minha mesa de trabalho e dei de cara com um pedaço de velha lauda de jornal (dos tempos da máquina de escrever), havia anos esquecida num canto, em que se lê:

“Mais vale a tristeza de não ter conseguido do que a vergonha de não ter tentado”.

Não me lembro mais quando nem a propósito de quê escrevi isso, menos ainda porque guardei este papel amarelado por tanto tempo. Só agora encontrei a razão e o sentido desta frase. Por isso, tentei, mais uma vez.

Segundo tempo, já de noite: fiquei de farol baixo com esta história do cigarro. Assim que publiquei o “em tempo” acima, resolvi dar uma volta. Fui até a casa da minha filha mais velha, que fica a três quadras da minha, para ver os netos e tomar um pouco de ar.

Estava todo mundo já começando a arrumar os enfeites de Natal, mas voltei logo porque queria saber como os leitores receberam o que escrevi.

Ao passar pela portaria, me entregaram um envelope em que estava escrito: “Não precisa me devolver. Tenho outro exemplar. Rem: Denise Abdalla”.

Nem abri o envelope e vim direto para o computador. Já havia mais de cem comentários publicados. Fui lendo um a um até chegar à leitora das 17h36, que se assinava Denise.

Era a própria, informando que tinha deixado na portaria do prédio um livro que poderia me ajudar se tentasse novamente largar o dito cujo. São estas coisas fantásticas de interação que só a internet nos propicia.

“Como deixar de fumar” é um livro do médico Jean-Luc Roger, editado em 1984, pelas Publicações Dom Quixote, de Lisboa. Obrigado, Denise. Vou começar a ler hoje mesmo.

Se já estava muito feliz com a participação dos leitores neste Balaio, os comentários enviados hoje me deixaram com a certeza de que reinventei meu ofício de jornalista, aos 60 anos de idade e 44 de profissão. O que os leitores escreveram daria um outro livro.

Vocês não podem imaginar o bem que me fizeram ao dar sugestões e receitas para não desanimar e tentar de novo largar este vício. Vale a pena ler todos os comentários.

Tem de tudo, de cigarro eletrônico importado da China, passando pelo Santo Daime, até um remédio novo chamado Champix, que deve ser receitado por um médico.

Com exceção de um idiota chamado Heitor, que insiste em entrar no blog errado, e de alguns furiosos anti-tabagistas, a grande maioria deu testemunhos comoventes de como conseguiu parar de fumar após várias tentativas.

Em vez de críticas, como temia, recebi demonstrações de carinho e solidariedade de fumantes e ex-fumantes. No comentário das 18h12, o leitor Sergio, que continua fumando, escreveu: “Torço por você. Torça por mim.” Tá combinado, Sergio.

Muitos leitores falaram da sensação de vitória e liberdade ao conseguir, finalmente, atingir seu objetivo. O leitor Yan, por exemplo, no comentário das 18h31, conta que tentou nada menos do que 12 vezes até se tornar definitivamente um ex-fumante.

Pouco antes, às 18h08, Alice Juliani escreveu: “Tomara que amanhã seja você a relatar sua história do dia em que conseguiu se libertar do seu algoz”.

Da próxima vez, vou fazer como me sugeriu o leitor Flávio Batista, às 17h44: a primeira dica dele para alguém que quer parar de fumar é não contar para ninguém.

Prometo, portanto, não encher mais os saco dos queridos leitores com este assunto. Só volto a tratar dele se e quando acontecer o que a Alice Juliani me desejou. Agora vamos trocar o disco.

Muito obrigado a todos.


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