Contar histórias, dizer o mundo aos jovens, tornou-se algo mais difícil, em tempos atuais.
O imaginário mudou: desde a oralidade na fase agrária, dos João e Maria, até as histórias das negras, dos empregados de casa, babás etc., passando para a fase urbana de Luluzinha, Bolinha, Gato Félix, etc. E entramos nas histórias espaciais ou marinhas, nos desenhos animados.
Hoje a literatura infantojuvenil vem a ocupar um lugar que tenta suprimir o contato verbal e luta com a imagem/movimento, tempo de enfrentamento das letras impressas, do livro, dos autores e seus temas.
Entre tantos autores e bons ilustradores, fez-se um álibi para concorrer com a mídia imagética; assim as editoras deram vazão à sua produção e consagraram o precursor Monteiro Lobato, passando por Ana Maria Machado, André Neves, Roger Mello, Marcelo Mansur, Lygia Bojunga, Leo Cunha, Ruth Rocha e tantos outros.
Em todos os quadrantes surgem novos autores, como é o caso de Alessandra Barcelos. Natural de Foz de Iguaçu, viveu uma intensa natureza, e lá começou sua inspiração, à qual aliou-se sua formação em Letras. Esteve na Itália e nos Estados Unidos, onde tomou bebida literária. Mas, no seu afã de ser uma andante pelo Brasil, o Nordeste marcou-a, no Rio Grande do Norte e na Bahia, onde se alimentou. Suas obras estão ligadas à ecologia, diz-nos, sempre escolhe um bioma para focar em seus livros, já em número de seis.
Ela também é alimentada por seus alunos, do ensino fundamental II, em Curitiba, onde mora, e com seu gosto de frutas na palavra faz banquete literário com os alunos.
Agora surge Cadu e as Histórias de Bantu (Ed. Kazuá, 2015), narrativa de um menino que cresce num vilarejo do sul da Bahia. Sua família tem uma fábrica de berimbau: atividade passada há gerações de pais para filhos e que não só é um negócio, mas forma de manter as tradições. Cadu cresce nesse ambiente, e vive o seu vilarejo como se ele fosse um lugar mágico, entre rios, árvores, lugares secretos, até que grandes eventos começam a transformá-lo.
Há em Alessandra uma prosa poética, sutil, que acompanha sua textualidade, compondo um lirismo que refresca, como o vento na natureza, que ela sempre cita.
“Meu pai sempre dizia para eu não apressar o tempo, sinta o vento soprar me dizia ele.”
Alessandra tem uma maestria na condução do texto que cola o leitor às paginas, do adulto ao jovens e crianças – aliás, pais deviam ler mais o livro infantojuvenil.
E, na sua poética, ela ainda nos diz em Cadu:
“E, foi lá que descobri que as mangas gostam de ouvir histórias antes de amadurecer.”
Não à toa, Alessandra é uma poetisa, já com livro lançado: Velho Talismã (Inverso, 2014). E vem novo livro, em 2016. Tomemos um pré-gole:
“Vértebras deformadas aguardam na sala de espera
eu tento reanimá-las com palavras…”
*É paraibano, mestre e doutor pela ECA-USP. Professor de Teoria Literária em universidades privadas e consultor editorial da área de Literatura, além de contista e poeta com livros publicados (paulovasconcelos@brasileiros.com.br).
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