Foram mais de 400 horas de material bruto, 176 pessoas entrevistadas e dois anos de produção para se chegar ao documentário Quebrando o Tabu, de Fernando Grostein Andrade, que estreia nesse dia 3 de junho nos cinemas de todo o País. Quando pensou na ideia de fazer um filme que tratasse da questão das drogas, há mais de dez anos, Fernando Grostein Andrade sempre era desestimulado a ir adiante. “As pessoas chegavam para mim e diziam que ninguém iria querer financiar um filme que tratasse de um assunto tão polêmico na sociedade. Me mandavam pensar em outro tema, caso quisesse fazer o filme”, falou o diretor na coletiva de imprensa que aconteceu no início da semana em São Paulo, na exibição do filme para convidados.
Não foi o primeiro filme do diretor, ele já fez um documentário com o cantor Caetano Veloso. Mas a viabilização do projeto se deve única e exclusivamente ao ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, que foi procurado pelo diretor, depois que esse tomou conhecimento que ex-presidente e outros ex-chefes de Estado estavam participando de um encontro para discutir a questão das drogas e do seu combate. FHC preside a Comissão Global de Políticas sobre Drogas, juntamente com autoridades e alguns ex-presidentes, como Bill Clinton e Jimmy Carter, dos Estados Unidos. Depois de uma reunião com o jovem diretor, Fernando Henrique Cardoso decidiu aceitar a participação no filme. “Como já estava envolvido em um assunto, decidi participar do filme”, revelou na coletiva. E foi por meio da notoriedade e reputação do ex-presidente da República, que viabilizou o andamento da empreitada. O documentário foi rodado em oito países: Brasil, Estados Unidos, Portugal, Holanda, Colômbia, Suíça, França e Argentina e teve um orçamento bastante alto para os padrões de documentário brasileiro, dois milhões e setecentos mil reais.
Um momento oportuno
Em 1971, há exatos 40 anos, os Estados Unidos, no governo Nixon, declararam guerra às drogas. E foi essa cruzada de tolerância zero, orquestrada pelos EUA, que moldou quase todas as políticas públicas de combate às drogas ao redor do mundo. Depois de quatro décadas, os problemas que envolvem o mundo das drogas continuam a avançar. “Estamos vendo que as políticas de guerra às drogas não estão funcionando. Então, temos de procurar outras formas de combatê-las”, sentenciou no relatório da Comissão Latino-americana sobre Drogas e Democracia, Fernando Henrique Cardoso. No documentário Quebrando o Tabu, FHC viajou o mundo para saber como alguns países lidam com a questão, principalmente no tocante ao tratamento de usuários de drogas, como em Amsterdã, na Holanda, onde as pessoas podem comprar, em Coffee Shops, pequenas quantidades de maconha para serem consumidas lá mesmo. Em Portugal, o governo decidiu descriminalizar o usuário de drogas para que esse não seja tratado como criminoso e possa, caso queria, ser tratado como um doente pelo sistema de saúde. “A princípio, eu defendo no Brasil a descriminalização de todas as drogas, porque todas fazem mal. E, a partir daí, podemos tratar qualquer usuário de drogas como um doente e não como um bandido que merece ser punido e que, por isso, muitas vezes entra no narcotráfico”, disse FHC na coletiva.
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Muitas vozes
O documentário trata o assunto de forma bastante transparente e lúcida, muito em função dos esclarecedores depoimentos de personalidades como Bill Clinton, Ruth Dreifuss, presidente da Suíça, o escritor Paulo Coelho, que diz: “Seja aberto, seja honesto. Diga isso: É, realmente a droga é fantástica você vai gostar. Mas cuidado. Porque você não vai decidir mais nada. Basta isso. Basta isso.”, do médico e escritor Drauzio Varella, Gro Brundtland, ex-primeira ministra da Noruega e diretora -geral da Organização Mundial da Saúde, que fala sobre a necessidade de o combate ao tabaco servir como uma forma de tratar das outras drogas. “Por que não proibir o tabaco? Ponto final. Tornar o produto completamente ilegal. Mas chegamos à conclusão de que isso não seria viável, nem sábio da nossa parte. Precisávamos convencer as pessoas para isso não ficar em todos os lugares. Estávamos ‘`ilegalizando’` o uso da droga em diversas circunstâncias sem tornar o produto em si ilegal”. Mas de todos os depoimentos, o do artista, ativista e escritor, Anthony Papa, que estava na coletiva de imprensa, foi o mais contundente e definitivo ao colocar o assunto da seguinte forma: “Se não conseguimos controlar o uso de drogas em um presídio de segurança máxima, como podemos controlar o uso em uma sociedade livre?”. A frase-síntese de Anthony Papa – que foi preso e condenado a 15 anos de prisão em Sing Sing, por porte de drogas – foi parar no cartaz do filme e serve como um ponta pé para levantar o debate em todo o mundo, assim como o documentário dos Fernandos: Fernando Henrique Cardoso e Fernando Grostein Andrade.
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