“Não vi ninguém pedindo para darem uma surra no FHC!”

Definido por Jorge Ben Jor como alguém “entre o hippie e a Tropicália”, na letra de Cosa Nostra – uma homenagem do cantor à trupe de O Pasquim encartada em compacto no tabloide em 1970 -, Luiz Carlos Maciel assinava a polêmica coluna Underground do jornal que fez a cabeça de uma ala livre daquela geração. Acusado pelos mais ufanistas de colonizado por falar de política com o mesmo entusiasmo que discorria sobre a obra de Jimi Hendrix, Maciel confrontou tabus, em pleno AI-5, e plantou novas ideias comportamentais, reinterpretando no Brasil os conceitos de pensadores como o filósofo Marshall McLuhan e o psicanalista e guru do LSD Timothy Leary. Em breve conversa telefônica, o escritor, jornalista e filósofo, autor de Nova Consciência e A Morte Organizada, opinou sobre a polêmica em torno da prisão dos três estudantes flagrados fumando maconha no campus da USP. Aos 73 anos, Maciel se diz otimista com a nova geração e as manifestações ao redor do mundo e ainda defende a desobediência civil.

Brasileiros – Há 40 anos, você já propunha debates sobre o uso recreativo de drogas, como a maconha. Por que ela ainda é um tabu?
Luiz Carlos Maciel – Timothy Leary dizia que a maconha é uma erva que transtorna muito mais a cabeça das pessoas que não a fumam e isso é fato, quem não fuma fica muito mais doido do que quem fuma! Isso é algo que não vem de hoje, mas é inegável que houve mudanças. Não por acaso, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso vem defendendo outras políticas para a maconha. Aliás, não vi ninguém pedindo para darem uma surra no FHC! Só porque ele é tucano ninguém quer a PM atrás dele?

Brasileiros – Mas o repúdio da opinião pública aos três alunos flagrados com maconha na USP não sugere um retrocesso?
L.C.M. – Há 40 anos, o FHC jamais teria feito esse filme (o documentário Quebrando o Tabu) e o STF não teria liberado a Marcha da Maconha. Mas essa desmitificação ainda não foi suficiente para acalmar os mais perturbados e a internet se tornou refúgio dessa gente. Acompanhei a repercussão desses fatos da USP e tive que concordar com o (jornalista) Gilberto Dimenstein, que classificou os comentários de leitores como um “esgoto virtual”.

Brasileiros – Com relação à USP, a maconha jogou “cortina de fumaça” em questões urgentes, como o déficit de segurança no campus.
L.C.M. – Quem forçou essa coisa da maconha foi a própria PM que, ao invés de planejar estratégias para garantir a segurança dos alunos, entrou no campus para fazer revistas ordinárias, com aquela delicadeza herdada de uma tradição de brutalidade policial vinda de duas ditaduras.

Brasileiros – Você defenderia, então, que convênio USP/PM e a ação da Tropa de Choque foram escolhas equivocadas?
L.C.M. – Talvez, por saudade dos dias de ditadura, é o próprio Rodas que está armando esse sistema repressivo. A Direita brasileira quer fazer pequenas “ilhas de ditadura” no País.

Brasileiros – O que pensa das acusações de esvaziamento político dessa geração?
L.C.M. – Essa nova geração dá evidências de que é participante, como vemos acontecer agora ao redor do mundo. Achei fantástica a ocupação da reitoria e é bobagem dizer: “A assembleia decidiu uma coisa e eles fizeram outra”. As vanguardas de desobediência civil sempre foram feitas por pequenos grupos que se dispuseram a arcar com as consequências.


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