Em homenagem às comemorações dos 60 anos da Declaração dos Direitos Humanos, o Ministério da Cultura organizou em Brasília o III Encontro Nacional dos Pontos de Cultura do País, a TEIA 2008 – que começou em 2006 em São Paulo. Com o tema “Direitos Humanos, iguais na diferença”, o evento atraiu, entre os dias 12 e 16 de novembro, mais de 2.500 pessoas de todos os cantos do País envolvidas com projetos culturais ou representantes de manifestações populares. Foram cinco dias de muita discussão, em especial a questão dos Pontos de Cultura, que é a ação prioritária do Programa Cultura Viva, um dos grandes programas do Ministério da Cultura criado há pouco mais de dois anos pelo secretário de Projetos e Programas Culturais, Célio Turino. Um Ponto de Cultura pode ser desde um terreiro de candomblé na Bahia, uma tribo indígena do Acre, um grupo de frevo de Pernambuco, um grupo de catira do Paraná, um centro de artes e inclusão social de São Paulo, até um grupo de teatro e arte lúdica da Favela da Rocinha. São associações que de alguma maneira independente já desenvolviam e disseminavam suas ações culturais, mas que não tinham relações entre si e nem recebiam verbas.
Esses pontos não seguem um modelo único, nem de instalações físicas, nem de programação ou atividade, há até um ponto em Guaraciaba do Norte, no Ceará, que se realiza no coreto de uma praça. O único aspecto comum a todos é a transversalidade da cultura, a gestão compartilhada entre poder público e comunidade, e a estrutura de comunicação. Graças ao programa Cultura Digital, já é possível mapear e preparar esses pontos com equipamentos tecnológicos com softwares livres e educação para a inclusão digital, o que possibilita o trabalho em rede. Para fazer parte do programa do MinC é preciso participar de uma seleção por meio de edital público. A idéia inicial do Ponto de Cultura é investir naquilo que já existe e não criar novas estruturas. O que o governo fez foi reconhecer e incentivar essas ações. A partir do convênio com o MinC, o ponto selecionado passa a receber a quantia de R$ 185 mil, dividida em cinco parcelas semestrais, para investir conforme o projeto apresentado. Parte do incentivo recebido na primeira parcela, no valor mínimo de R$ 20 mil, é utilizada para aquisição de equipamento multimídia em software livre, composto por microcomputador, miniestúdio para gravar CD, câmera digital, ilha de edição e o que for essencial para que o Ponto de Cultura possa ter autonomia e criar sua própria estrutura de comunicação. Em troca, ele deve prestar contas ao governo. “Quando assumi, existia um projeto em andamento que priorizava a estrutura física de centros culturais padronizados pelo País. O que fizemos foi mudar o foco para o fluxo, ou seja, para o conteúdo existente em cada comunidade”, diz Turino. Atualmente, são reconhecidos pelo MinC 850 Pontos de Cultura. Desses, delegados representantes de 670 vindos de 23 estados brasileiros estiveram na Teia. Alguns pontos, por sua semelhança cultural, afinidade ou conteúdo, são agrupados nos chamados Pontões de Cultura. São eles que vão direcionar as ações comuns a essas comunidades e impulsionar a troca de informações e experiências entre eles.
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Um dos resultados concretos do encontro foi a formação de uma comissão de representantes nacionais e estaduais desses pontos para fazer a ponte entre o poder central e a sociedade civil. Paralelamente às discussões políticas, vários eventos culturais aconteceram no Museu Nacional, no Teatro Nacional e em mais três palcos montados nas praças e arredores das imponentes obras de Oscar Niemeyer. Entre eles, espetáculos de dança, de canto, shows de grupos folclóricos e de grupos de maracatu, apresentações indígenas, um coletivo de DJ’s de Goiás, mostra de cinema e vídeo, circo, música e alguns encontros inusitados, como o de um grupo de rap de Brasília com o violino de Jorge Mautner. Segundo o ministro da Cultura, Juca Ferreira, a meta para o Programa Cultura Viva é que até o final de 2010 o Brasil tenha 20 mil pontos. Não será fácil, mas como ele mesmo diz “só pensando longe para se alcançar as coisas”. A próxima Teia se realizará em março de 2010, no Ceará.
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Da aldeia para o mundo
Zezinho Yube, nome que adotou em português, hoje é um cineasta. Tem três curtas-metragens e um média já finalizados e está participando de três festivais internacionais. Mas sua trajetória é bem diferente da maioria dos cineastas brasileiros: Zezinho nasceu em uma aldeia indígena Hunikui, no Acre. Seu pai era professor da aldeia e até os 11 anos Zezinho morou com sua família em uma terra isolada e bem preservada à beira do Rio Jordão. Apenas quando a família se mudou para a primeira terra indígena demarcada, na década de 1990, é que ele teve contato com o homem branco.
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Aos 17 anos, Zezinho passou a falar o português fluentemente e foi também a primeira vez que entrou em um cinema. “Pensava que tudo aquilo era real, não tinha noção do que era realidade e ficção”, lembra. Desde então, tem o desejo de pegar em uma câmera. Foi a partir de um projeto desenvolvido pelo Pontão de Cultura Vídeo nas Aldeias, que roda o Brasil fornecendo ferramentas e materiais para que os índios possam contar suas próprias histórias por meio da linguagem audiovisual, que ele pôde não só segurar como aprender a manusear uma câmera pela primeira vez. O primeiro filme de Yube, que já foi três vezes para os EUA, é o média-metragem Novos Tempos, que conta a história cotidiana de um pajé. Com esse filme já ganhou dois prêmios no Festival de Documentário da Bahia e o Fórum Doc 2006. O segundo, é um curta de 15 minutos que narra a história de seu pai, que há alguns anos foi a Mato Grosso cursar faculdade de ciências sociais. O Já me transformei em imagem, seu terceiro trabalho, que conta a história do seu povo, ganhou o prêmio no Festival de Documentário da Bahia e está concorrendo ao Festival de Jovens Realizadores do Mercosul. O quarto curta de Zezinho é o Katxa Nawa, que em português significa festa da fertilidade. Trata-se da história da retomada dessa festa à sua comunidade. Multimídia, Zezinho editou e produziu todos os seus filmes e tem um equipamento em sua aldeia onde fez chegar a internet. Seu próximo projeto cinematográfico é o Kene, um documentário sobre os padrões das pinturas de seu povo, uma catalogação de todas as 60 formas de desenhos existentes. Hoje, além de novos projetos, de exercer sua função de agente agroflorestal, ele está terminando o ensino médio em Rio Branco, pois crê que para fazer algo pela sua comunidade é importante ser reconhecido fora dela. Continua filmando seu povo, além de ter um gosto especial pela fotografia. Ele pretende criar uma escola de vídeo dentro de sua aldeia para repassar o seu conhecimento.
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