No Bom Retiro, teve até campanha coreana

São Paulo é mesmo uma cidade plural. No momento em que Fernando Haddad contabilizava os votos da guinada no comando da prefeitura de São Paulo, a líder da oposição na Coreia do Sul, Han Myeong Sook, se movimentava em busca de mudança similar em seu país. Mais de 18 mil km separam São Paulo de Seul, a capital sul-coreana, mas a reunião liderada por Han aconteceu no bairro paulistano do Bom Retiro. Ocupado por imigrantes desde 1867, o Bom Retiro abrigou primeiro italianos. Depois, judeus e gregos. Hoje, 70% do comércio local é controlado por coreanos, que começaram a imigrar para o Brasil nos anos 1960. São ao todo 50 mil pessoas. “Mesmo distantes, aproveitem a oportunidade de votar para presidente. Independentemente do partido, votem nas eleições de dezembro”, disse Han para o grupo de conterrâneas reunido pela Korean Women’s Internacional Network, a associação de lideranças femininas coreanas em todo o mundo.

A nacionalidade não era o único ponto comum entre as mulheres. Em diferentes escalas, todas se destacam como empreendedoras, seja no comércio, na construção civil ou na área da saúde. Ainda assim, havia uma nítida reverência em relação a Han. Além de ter sido a única mulher a ocupar o posto de primeira-ministra na Coreia do Sul (entre 2006 e 2007), a atual parlamentar tem um histórico a favor da democracia. Em um país antes marcado pela submissão feminina, ela também se notabilizou pela defesa dos direitos das mulheres. Hoje com 68 anos, Han garantiu às conterrâneas radicadas em São Paulo que a situação mudou no país: “Com as possibilidades educacionais, as mulheres se adaptaram mais rapidamente do que os homens em muitas áreas. Agora, a Coreia tem mais juízas que juízes.”

Durante muito tempo, Han brigou sozinha pela causa. Seis meses depois de se casar, em 1968, seu marido foi preso. Acusado de crimes políticos, ele passou 13 anos na prisão. “De certa forma, o fato de ter ficado sozinha me deu a possibilidade de trabalhar por meus ideais”, disse à Brasileiros a parlamentar, que também foi presa política durante a ditadura de Park Chung Hee (1961-1979). Quando o marido deixou a cadeia e passou a se dedicar ao ensino, Han continuou a militância partidária. Ela não é candidata nas próximas eleições, mas roda o mundo para angariar a participação nas urnas dos 7,5 milhões de coreanos expatriados. No país de 50 milhões de habitantes e abstenção eleitoral na casa dos 50%, cada voto conta. “Sinto uma ponta de inveja ao ver que no Brasil o voto é obrigatório”, disse Han, sem saber que, nessas eleições, o índice de abstenção no Brasil chegaria a 19%.

Como argumento para unir os expatriados, ela também lembrou que a Coreia “é o único país dividido do mundo”. Referia-se à partilha feita no final da Segunda Guerra Mundial, que também criou a Coreia do Norte. Dona de uma loja de bijuterias na rua 25 de Março, a meca do comércio popular paulistano, Suzy Yang saiu animada do encontro com a ex-primeira-ministra. Aos 46 anos, os últimos 27 em São Paulo, ela tem três filhos, todos nascidos no Brasil. “Dentro de casa, tenho dupla missão”, diz Suzy. “Educar os filhos como coreanos e como brasileiros.” Na sequência, ela conta que seus dois filhos mais velhos haviam votado para prefeito naquele domingo, mas não revelaram a escolha registrada na urna eletrônica. O motivo, explica Suzy, foi simples: “No Brasil, é segredo”


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