No Rio, “justiça” é feita com as próprias mãos, de novo

foto rio
Imagem tirada do vídeo que mostra execução em rua do Rio

Depois de um jovem de 15 anos ser espancado e deixado preso a um poste no bairro do Flamengo, no Rio, no último dia 31 de janeiro, mais um acontecimento na Baixada Fluminense chocou por sua violência e crueldade. Dessa vez, a execução de um garoto em plena luz do dia, com três disparos, foi filmada em Belford Roxo em janeiro e caiu esta semana na internet (o jornal Extra veiculou o vídeo, com imagens fortes).

De novo, a ideia de “justiça feita pelas próprias mãos” parece estar por trás da tragédia. Segundo os relatos de testemunhas, a vítima seria um ladrão que estava atacando comerciantes e pedestres na ocasião. No caso do espancamento, o jovem também era acusado de roubos, e tinha passagem pela polícia. Para aqueles que quiseram fazer justiça, em nenhum momento chamar a polícia pareceu ser a melhor opção.  

As opiniões estão divididas nas redes sociais, jornais e até mesmo entre políticos. Na TV, o comentário preconceituoso de Rachel Sheherazade, do SBT, deixou claro que “bárbaros” não são apenas os executores nas ruas, mas também profissionais que, com espaço conquistado na grande mídia, incentivam a violência e o comportamento brutal fora da lei. (saiba mais e veja vídeo aqui). Direitos humanos não valem para quem ataca a propriedade dos outros, e um celular parece valer mais que uma vida.

Em Brasília, a deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) protestou na Câmara contra o espancamento do adolescente no Flamengo: “Mais uma vez, como mulher negra, olhei e vi a casa grande e a senzala. Já vimos esse filme no Estado do Rio de Janeiro. Ele é estarrecedor, é triste, é perverso”. Fazendo seu papel, o caricato reacionário Jair Bolsonaro (PP-RJ) reagiu com ironia. Ele se dispôs a presidir a Comissão de Direitos Humanos da Casa e sugeriu que Benedita adotasse o garoto, a quem chamou de vagabundo e ladrão.

O presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Wadih Damous, mostrou preocupação: “Fazer justiça com as próprias mãos é retroceder à barbárie. O episódio mostra como os princípios civilizatórios estão sendo, cada vez mais, ignorados e mostra também a ausência do poder público que opta por concentrar a força policial para guardar shoppings e esquece a segurança das pessoas em seus bairros”.

Se não bastasse uma polícia muitas vezes despreparada e violenta, milícias e traficantes que praticam execuções e presídios superlotados – no País todo –,  agora temos também grupos de “justiceiros” no Rio. Em todos os casos, as principais vítimas – pobres de favelas e periferias – não têm condições de se defender dentro da lei. E, como disse o colunista da Carta Capital, Matheus Pichonelli, o discurso do “a lei só protege bandidos” ou do “tá com dó, leva pra casa” prolifera nas redes.

Não, não se trata de levar ninguém para casa – o que significaria, de outro modo, “fazer justiça com as próprias mãos”. O que está em questão, neste caso, é o mais básico: a simples defesa dos direitos humanos e do Estado de Direito, que surgido há tantos e tantos séculos ainda pena para se estabelecer.


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