No território dos afetos

Um baú cheio de sonhos e memórias de vivências. Assim é o livro Moscouzinho, do fotógrafo pernambucano Gilvan Barreto. Um pequeno relicário, uma tentativa de reencontrar sua infância, mas acima de tudo uma delicada homenagem ao pai dele.

O nome, que à primeira vista pode parecer estranho, é na verdade a alcunha que o município de Jaboatão ganhou, em 1947, ao eleger o primeiro prefeito comunista do Brasil. “Cresci no meio político. Meu pai foi um homem de esquerda, aquele mundo marcou a minha vida”, conta Gilvan.

E a ideia partiu de uma pesquisa documental simples, clássica: recontar por meio de imagens a existência do lugar. O projeto começou a se delinear com imagens de álbuns de família, outras encontradas nos arquivos do DOPS, fotografias produzidas por Gilvan, imagens de lugares, objetos, fotos de fotos, colagens. O reencontro do olhar de uma criança que trabalha no território dos afetos.

O resultado são imagens oníricas, que narram por meio de detalhes de súbitas aparições e repentinos sumiços a própria história de um projeto que desapareceu: a história de Moscouzinho recontada no livro “Quem passou por uma história dessas cria uma maneira de olhar”. Uma fábula que se desenvolve à nossa frente à medida que olhamos para, ou melhor, que voltamos as páginas do livro. Mais que fotografia, cinema. Mais que cinema, poesia, delicadeza. Um livro sutil que convida o leitor a mergulhar em cada fotografia. Um eterno retorno. Livro que foi construído como um pequeno relicário. Um livro antigo que guarda a ideia de cidade que um menino inventou. O povoado de Jaboatão, fundado em 1593, foi palco de batalhas contra a ocupação holandesa. Em 1873, passou a vila e, em seguida, em 1884, se tornou cidade. Desde 1989, agrega o nome de Guararapes.

Mas é para a Jaboatão dos anos 1940 que Gilvan retornou para fazer esse ensaio. Foi em busca de um pai, recentemente morto, do qual herdou o nome. Uma pessoa humanista que lutou por um mundo mais justo, talvez mais digno. O livro criado por Gilvan Barreto, às vésperas de completar 40 anos, é quase um diário em que imagens do presente e do passado se misturam. Não é um livro de fotografia no sentido clássico, mas um livro de memórias.

Pequenas narrativas que se sucedem, uma história reinventada: “O sonho simbólico de um país inventado”.


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.