O dia em que a Brasileiros afundou o Barcelona

 

Uma torcida organizada do Barcelona em São Paulo reconhecida oficialmente!? Isso mesmo. Só esse fato já garantiria uma boa matéria. Pesquisando, descobrimos que os fanáticos se reuniam, religiosamente, em uma bar na Rua Mourato Coelho, a mesma da redação da Brasileiros, para assistir aos jogos do seu time. A pauta estava pronta.

Conversando na redação, ficou decidida a equipe que iria ao bar na fatídica tarde de 23 de abril de 2013: dois repórteres e um cinegrafista para assistir ao jogaço contra o Bayern de Munique, pela semifinal da Liga dos Campeões da Europa, o torneio de clubes mais importante do planeta.

Na segunda-feira, véspera de jogo, acertando todos os detalhes, decidimos que, por simpatia e para entrar no espírito do ambiente, todos iriam trajando o manto azul-grená. Afinal, que amante de futebol não tem uma camiseta do Barça?

Chegamos ao bar cedo e nos ajeitamos numa mesa central para sentir a atmosfera dos torcedores do melhor time do planeta. Ferran Royo, presidente da Penya Barcelonista de São Paulo, com quem havíamos marcado uma entrevista pré-jogo, ainda não estava no local. O catalão de nascença chegou poucos minutos antes do apito inicial e, na correria, abriu sua mochila para pendurar as diversas bandeiras do Barça pelas paredes do bar.

Nos apresentamos. Ele, muito animado, pediu para atrasar o bate-papo para o intervalo. Antes de se levantar, contou que São Jorge, para ele San Jordi, era padroeiro da Catalunha e que em seu dia, exatamente o dia 23 de abril, os homens de lá têm a tradição de distribuir rosas para as mulheres. Gentilmente, deixou três delas para que, mais tarde, entregássemos para a ala feminina da torcida. Mal sabia ele e todos os presentes, inclusive nós, que dalí a 90 minutos, as rosas estariam todas no chão, junto com punhados de cabelo, arrancados durante o massacre alemão.

Quando o juiz apitou o início da partida, o bar, em plena terça-feira, às 15h45, estava lotado! O Bayern pressionava desde o começo, porém, é possível dizer que nem o mais fanático dos bávaros esperava o que estava por vir.

Aos 25 minutos do primeiro tempo veio o primeiro gol alemão. Nos entreolhamos sem esboçar reação. Mas um golzinho tomado não seria de todo o ruim para nossa matéria, já que filmávamos o ambiente e seria interessante captar essa reação.

O jogo continuou quente, o Bayern pressionou, o Barcelona teve lá suas chances, mas o primeiro tempo terminou 1 a 0. A torcida ainda cantava, o placar era totalmente reversível.

“Infelizmente pegamos o Bayern em um momento complicado, especialmente da nossa defesa. Falta o Puyol, falta o Mascherano, falta o Adriano…”, assim, quase se justificando, Ferran Royo começou a entrevista prometida. Pensando agora e escutando o áudio da entrevista, é até injusto com a nossa equipe dizer que nós afundamos o Barcelona. Ele sim, no intervalo, “zicou” sua equipe.

Conversa vai, conversa vem, o segundo tempo começa e… “Goooool éééééé dooooo Baaaaayern”, anuncia a televisão. Ainda com a nossa equipe, Ferran tentava se consolar. “Tudo bem, assim fica um desafio melhor. Até 2 ainda dá, mais de 2 já fica complicado”. Ahhh Ferran, pobre Ferran…

Antes de o dispensarmos para ele voltar para frente da TV, perguntamos sobre o hino que eles compuseram, o hino da Penya Barcelonista de São Paulo. Ele nos prometeu que ao término do jogo faria o bar inteiro cantá-lo para que pudéssemos gravar.

O clima de festa do início do jogo já não estava mais lá. Os espetinhos, especialidade no bar, já nem estavam mais sendo consumidos. O segundo gol, de Mario Gomez, validado apesar da posição irregular do atacante, causou a ira dos torcedores, que pulavam e berravam contra o juiz. Na verdade a contestação e a indignação dos torcedores era meio estabanada, parecia que eles nunca haviam passado por isso.

Aos 28 do segundo tempo, mais um gol contestável. Robben pedalou pra cima de Jordi Alba e passou. O defensor Culé tentou correr, mas teve sua passagem interrompida por Müller e foi ao chão. Livre, Robben deu tapa no canto e fez o terceiro. San Jordi, não faça isso com a gente!

Nosso cinegrafista, o menos ligado em futebol entre os três, perguntava o que aquilo significava. Em uma atitude perigosamente profissional, ele tirou a câmera do pedestal e foi atrás das caras fechadas, das discussões acaloradas que aconteciam aos montes, do quebra-pau comum entre a mesma torcida, de um lado os que querem continuar apoiando, de outro os que mandavam os 11 jogadores para “el infierno”! No final das contas, ver o Barcelona tomando um passeio épico no meio da sua torcida, é sim um furo de reportagem.

Antes do apito final, mais um gol alemão, para o jogo, de fato, entrar para a história. A última vez que o time espanhol apanhou de tal forma na Champions League foi em 1997, em um 4 a 0 para o Dínamo de Kiev. O homem daquele jogo foi um garoto, Andriy Shevchenko, então com 21 anos. Hoje ele já está aposentado.

Como aquilo aconteceu? Prefiro pensar que o Barcelona entrou em um de seus piores dias e o Bayern, o oposto. Porém, para todos os outros presentes, o motivo era muito claro: os pé-frios da Brasileiros!

Apito final, silêncio absoluto, o bar esvaziou em poucos minutos. Ferran se aproximou de nossa mesa. “Desculpem meninos, não vou pedir pra eles cantarem o hino”. Completamente compreensível. Na verdade, quase agradecemos por ele não ter simplesmente nos expulsado do local.

Completamente constrangidos, deixamos o recinto e fizemos apenas uma promessa: para acalmar um pouco a alma dos barcelonistas, a Brasileiros se compromete, na semana que vem, a acompanhar a outra semifinal da Liga dos Campeões, entre Borussia Dortmund e Real Madri, no bar onde os madridistas  se reúnem.


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