Na mesma sexta-feira, 8 de maio, em que fui internado no hospital com problemas variados, entre eles insuficiência renal e arritmia cardíaca, em consequência de uma infecção intestinal e uma gripe mal curada, meu amigo Delúbio Soares desistiu de pedir sua reintegração ao PT para não provocar uma divisão no partido que ajudou a criar.
Só nesta terça-feira, já em casa, tive oportunidade de ler as mensagens que recebi ao longo destes dias e, entre elas, encontrei o discurso que ele fez aos companheiros do Diretório Nacional do PT reunidos em Brasília para julgar o seu pedido.
Antes que o fizessem, Delúbio abriu mão deste direito pelo qual lutou bravamente nos últimos meses, buscando apoios em todas as instâncias do partido. Acompanhei desde o início esta sua caminhada para poder voltar à política partidária, sua razão de viver, desde que o conheci, faz 20 anos, durante a primeira campanha presidencial de Lula.
Posso imaginar quanto deve ter-lhe doído escrever este discurso, que é, ao mesmo tempo, uma declaração de amor à causa pela qual se entregou, e um libelo em que não pede perdão nem anistia, apenas justiça e o direito de apresentar as suas razões.
Mais uma vez, colocou os interesses partidários acima dos seus próprios, na certeza de que o tempo irá reparar os sofrimentos e as injustiças que sofreu nestes últimos anos.
Aos 53 anos, continua o mesmo sonhador irreverente, capaz de rir dele mesmo, sem abrir mão dos ideais em que acredita e bota fé. Somos amigos de graça, desses de tomar cerveja juntos, dar risada e falar mal da vida alheia – a ele nada devo, nem ele a mim. Comigo sempre foi correto.
Por isso, faço questão de abrir espaço neste Balaio para reproduzir trechos do discurso de Delúbio. Em palavras simples e sentidas, ele resume um raro gesto de grandeza, exatamente no momento em que antigos valores como lealdade e fidelidade partidária são motivos de chacota e se troca de lado com a facilidade de quem troca de camisa.
“São 38 anos de luta, 30 no PT. Esse é meu DNA. Compareço com o pouco que tenho a vos oferecer: toda uma vida na trincheira do único partido ao qual pertenci e ao qual, mesmo tendo sido expulso, paradoxal e ironicamente, ainda perteço”, apresenta-se ele, para em seguida dizer o que lhe vai na alma:
“Contrariando a modéstia de goiano simples do interior pobre, que desde a mais remota idade não conheceu senão a luta contra a oligarquia, em seu Estado, e a ditadura, em seu país, confesso a impagável paz de espírito de ter podido chegar até o dia de hoje sem trair meus compromissos partidários, meu credo ideológico, minhas alianças políticas, minhas convicções pessoais e um profundo e sincero sentimento de solidariedade para com todos os meus companheiros”.
Lembra do começo do PT:
“Fundei este partido. Tempo faz. Éramos alvos da descrença de uns, da zombaria de outros. Contamos nos dedos de uma das mãos os companheiros de então. Nos da outra, os votos conquistados num início que era só fé e pura teimosia.
Muitos pdoerão dizer que valeu a pena. Mas muito poucos podem dizer como o companheiro que vos fala: começaria tudo outra vez, se preciso fosse.
Não há glória maior do que a de se saber guerreiro fiel dos ideais acalentados na alma. A ficha de filiação, em assim sendo, vale menos do que a convicção de que todo sofrimento é nada diante da grandeza do ideal”.
“() Portanto, quem vos fala, meus companheiros, é um homem sem rancor, sem ressentimentos, sem medo e sem ódio”.
“Tragado ao centro de uma crise de proporções históricas, onde tudo se fez e nada se poupou na tentativa de desestabilizar o presidente que elegemos e seu governo de transformações sociais, mantive a integridade de caráter e fidelidade ao PT e aos meus companheiros”.
E explica os motivos da sua decisão de retirar o pedido de reintegração ao partido neste momento:
“Não pretendo ser motivo de qualquer divisão interna, muito menos de causar discórdia por conta de uma postulação política que muitos dizem ser pessoal, a de voltar ao PT. Nem devo causar tipo algum de embaraço aos companheiros que se colocaram, corajosa e generosamente, a meu lado no presente debate”.
Ao final, deixa uma pergunta no ar, que até agora ninguém se habilitou a responder:
“De que me acusam? Quantos são os políticos brasileiros que realizaram campanhas eleitorais sem que alguma soma, por menor que fosse, não tenha sido contabilizada?”
Dias de hospital
Como alguns de vocês devem ter notado, o Balaio ficou fora do ar, sem atualização, desde a última quarta-feira, 6 de maio, por motivo de força maior, como se dizia antigamente.
Começou com uma gripe acompanhada de forte desinteria, deu febre, tomei uns remédios e continuei trabalhando, passei quatro horas mediando um debate no II Fórum de Sustentabilidade e Comunicação, no Anhembi, com Premio Nobel e tudo na minha mesa, até que pifei de vez, e fui parar no pronto-socorro do Sírio Libanês, onde um jovem médico plantonista, o Cristian, providenciou rapidamente minha internação.
Antes de mais nada, quero agradecer ao empenho de toda a equipe do meu velho e bom amigo Roberto Kalil, que rapidamente foi me acudir, e só me largou quando me deu alta na noite de segunda-feira, com todos os sinais vitais em perfeito funcionamento, até onde isto é possível num jornalista sexagenário. Ao dedicado pessoal da enfermagem e a todos os funcionários do Sírio também deixo aqui meu muito obrigado.
Vida que segue. Nestes dias de hospital confesso que não me interessei em saber o que estava acontecendo lá fora. Só liguei a TV para ver futebol e abri o laptop uma única vez apenas para informar à distinta freguesia que não tinha condições de escrever, com mãos e braços ocupados por tubos e agulhas, e a cabeça oca de tudo.
Na breve trégua que a vida me deu, notei como a internet mudou as relações de trabalho. Antigamente, quando ficava doente, a primeira coisa que fazia era avisar meu chefe imediato e explicar o que estava acontecendo.
Nas poucas vezes em que fui chefe, me senti tantas vezes enganado por subordinados “doentes” ou que perderam os mesmos parentes pela segunda ou terceira vez, que deixei de dar importância a estas coisas.
Como ninguém sentiu minha falta nem me ligou, nem depois que avisei aos leitores no blog a razão de estar fora de combate, temo que no dia em que morrer só vão descobrir um ano depois
Também as moças que me convidaram para o II Fórum até hoje não me ligaram para saber como estava passando, mesmo tendo acompanhado minha agonia para cumprir o compromisso assumido naquele dia.
De outro lado, fiquei bastante sensibilizado com as manifestações dos leitores preocupados com a minha ausência, que me enviaram rezas, votos, receitas e conselhos. Da mesma forma como mudaram as relações de trabalho, mudaram também, e para melhor, as relações com os leitores, humanizando-as, o que conforta bastante quem vive de escrever.
Para falar bem a verdade, acho que vocês não perderam grande coisa. Ao dar uma olhada hoje nos jornais empilhados sobre a mesa da cozinha me dei conta que lá estavam as mesmas notícias enguiçadas (patente by Alfredo Ribeiro, o Tutty Vasquez) de sempre – da crise econômica à gripe suína , dos abusos no Congresso à reforma política, das entrevistas do Gilmar Mendes à lei antifumo. Nada de novo no front.
Números da semana
Com atraso, pelos motivos já explicados acima, publico abaixo o levantamento dos três assuntos mais comentados da última semana no Balaio, na Folha e na Veja, balanço que costumo divulgar aos domingos. Como era de se esperar, foi uma semana fraca para o Balaio, que saiu do ar no meio da semana.
Balaio
Menor infrator: 220
Corinthians e Ronaldo: 83
Sustentabilidade: 49
Folha
Abusos no Congresso: 134
Governo Lula: 93
Educação: 70
Veja
Dilma Roussef: 67
Diogo Mainardi: 33
José Antonio Toffoli: 18
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