O pai de Max Bauer

Max Bauer nasceu em Blumenau. Menino ainda, com o pai aprendeu a tocar sanfona de oito baixos, a gaita ponto sulina. Aos quinze anos, ganhou uma Todeschini. Acompanhou o pai pelos bailes de fandango no Vale do Itajaí. Segurava valsa, mazurca, rancheira e chamamé. Ia na garupa da velha Norton Dominator 500 cc, com uma sanfona de cada lado. Anos felizes aqueles. Mas, sem que se apercebesse, o tempo o afastou da garupa e da sanfona.

Formado, foi para São Paulo, abaixou o chifre e investiu contra a vida. Sem pensar muito nas coisas, deu um duro danado. Aos 38 anos, ganhava dinheiro, mas não chegava a ser um sucesso. Também não era um fracasso. Longe disso. Apenas batera na trave, o que no futebol é muito claro.

Em momento de verdade, concluiu que o que buscava não era dinheiro. Ficou preocupado. Muito assustado, a ponto de só pensar nisso. Sentiu medo e ansiedade. Emoções estranhas ao seu peito. Desestruturou. Ruiu. Foi para a lona, onde ficou por meses. Perdeu o emprego e afundou mais ainda. Foram só dor e despesas.

Num pulso de energia, vendeu o que tinha e, com a velha Norton Dominator 500 cc que herdara do pai, foi para o Sul. Uma viagem de encontro, pensou. Como a afirmar que o problema não estava dentro de si. Na garupa, a Todeschini. Ainda tinha algum dinheiro no banco.

Na Feira de Passo Fundo, conheceu um casal que fazia o Globo da Morte. Não demorou muito, experimentou rodar sozinho no globo. Gostou. Logo mais, rodavam Eugenio, Michaela e ele. E rodaram juntos por todo o Sul.

Na Feira Internacional de Esteio, um empresário americano veio falar com eles. Três dias de conversa séria, Max entendia de negócios. Formariam uma trupe para um Golden Globe of Death. Lançamento das motos Golden Raptor no mercado americano. Tudo acertado, só faltava outra loira para a trupe.

Treinaram a vistosa irmã da Michaela, que morava em Pomerode. Deixou a Norton e a Todeschini na casa da irmã. Em dois meses, partiram.

O globo estava lá. Pronto, esperando. Gigante dourado, com seus sete metros de raio. Lindo. Tudo acertado, rodaram shows, feiras, rodeios. Começaram em Orlando, no inverno. Terminaram em Seattle, no fim do verão. Os Bauer Brothers. Todos loiros e contratualmente siliconados. As duas irmãs com 300 cc no peito e eles com enchimentos nos quadríceps, glúteos e bíceps. Todos com roupa dourada. Dentes porcelanizados. Sorriam permanentemente. Tudo no contrato.

Uma maravilha dessas logo os levou para uma longa temporada em Las Vegas. Shows diários no MGM Grand. Ao fim do show, recebiam os aplausos sob spots fortíssimos. As mulheres com os peitos de fora. Eles em suas calças justas e minirregatas douradas. A plateia uivava, coisa de americano.

Foram cinco entradas por dia, por cinco anos. Ganharam muito dinheiro. Mas, isso não satisfez Max. Não era o que Max queria. Largou sua loira Pomerode 300 cc. Largou a trupe. Largou tudo e voltou. Isso foi em 98.

Andou por toda parte e, por fim, montou uma pousada em Visconde de Mauá. Dois anos depois, incorporou uma hóspede. Bonita, ajeitada e inteligente. Hoje em dia, ela cuida da horta e dos serviços. Ele cuida do dinheiro, serve uns drinques e conta essas histórias. Diz que mudou. Que agora assentou.

De uns meses para cá, ele deu para tocar a Todeschini com um violinista cubano que mora por lá. Comprou uma Harley Heritage 900 cc e uns mapas.

A mulher está de orelha em pé. Madura, sabe que homem assim não muda. Pode até descansar, mas mudar não muda.

*Marcos Rodrigues é engenheiro civil, professor titular da Escola Politécnica da USP e dedica-se também à literatura.


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