O pé na jaca na “Big Cana”

Nova York está tomando todas. E aí, toma mais algumas. A Secretaria de Saúde Pública da cidade revelou recentemente dados que são de deixar qualquer um tonto. O aumento de internações de emergência em hospitais da cidade aumentou 250%, em 2010. E mais: 42% dos adultos pesquisados pela prefeitura reconheceram que são beberrões contumazes. Considera-se como cachaceiro oficial alguém que mande para o caco cinco ou mais biritas em uma única sentada em bar. Desse modo, a chamada Big Apple, virou Big Cana.

Estou fora. Aqui em Nova York sequer como bombom de licor. Não tomo nem uma cervejinha. Fora daqui, as comportas se abrem. Mas ninguém me pegará molhando as palavras nos pubs nova-iorquinos. Essa medida de abstinência foi adotada na procura de evitar o alcoolismo na pós meia-idade.

Mas não me transformei em ex-bebum intolerante. Tipo George W. Bush. Sou pela onda do “cada um sabe de si”. Porém, os números colhidos pelas autoridades sanitárias são suficientes para fazer alguém ir buscar refúgio nos Alcoólatras Anônimos. Em 2003, cerca de 22 mil pessoas chumbadas foram parar nos hospitais do município. Hoje, esse número pulou para 74 mil. Em 2008, nada menos do que 1.537 biriteiros saíram trôpegos desse bar da vida, rumo ao paraíso, ou inferno. Morreram com os pés plantados na proverbial jaca.

Conversando com amigos fiéis a Baco, chegamos à conclusão de que os americanos gostam mesmo do método chamado aqui de “binge“. Significa tomar todas no menor tempo possível. É comum ver um barril de cerveja, de onde sai grossa mangueira que deságua em um funil, com este último, finalmente, alojado na boca do beberrão. Trata-se da verdadeira turma do funil. Ou seja: é a versão humana do método usado em gansos para fazer foie gras. O fígado, de bicho ou gente, depois de uma aplicação dessas fica do tamanho de uma bola de basquete. E não pensem que isso ocorre apenas em hospícios. É atividade abraçada com entusiasmo em festas universitárias, estacionamentos de estádios antes de jogos, baladas em certos clubes e, se bobear, até em chá de bebe (ou chá de fralda, para os cariocas).

Tem um restaurante mexicano na Broadway onde a cada “parabéns a você” – em homenagem a aniversariantes verdadeiros ou falsos -, os garçons passam com uma garrafa de tequila e despejam uma dose inteira nos bicos abertos da clientela. E ai de você, caso não aceite. Fazem o estraga festas comer uma pimenta jalapeño.

Minha filha, que é bartender (servidora profissional de marvadas), diz que existem fregueses encostando os umbigos no bar às 11 da manhã e lá os mantêm até a meia-noite. “Só não ficam até as três da matina, quando fechamos, porque paramos de servir aos que já estão pra lá de Bagdá”, diz o orgulho de meu lar.

Essa ansiedade consumista, acho, é bem americana. No Brasil, por exemplo, tem pé de cana tipo competidor, mas a maioria das pessoas com quem bebo (pois aí, como disse, mando ver) é do tipo maratonista. Nada de velocidade, mas sim: constância. Alguns também soltam os índios (se me entendem). Conheço pessoas que parecem médiuns de mesa branca: sentam e mandam baixar os spirits. Descem: o Jack Daniels, os irmãos Johnny Walker (o Red e o Black), o Velho Barreiro e daí para baixo. Mas nunca cheguei a levar um espiritualista desses para o hospital. Para casa, sim. Às vezes, para a minha (com resultados variados).

Aqui, vão mesmo para a UTI. O bicho pega a quem, digamos, mata o bicho.


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