O terror vai às compras

Militante exibe poder de fogo na província síria de Raaq. Foto: Handout/Alamy
Militante exibe poder de fogo na província síria de Raaq. Foto: Handout/Alamy


Estado Islâmico sabe fazer dinheiro. E sabe como ir às compras. Para montar um arsenal cada vez mais organizado, recorre a fornecedores do mercado negro. Claro, faz isso com habilidade – procura operadores de países como Iêmen e Sudão para calçar as transações com certa garantia. Nesses lugares, mas não só neles, os governos têm elevado grau de tolerância em relação ao trabalho dos Senhores das Armas, russos, ucranianos, irlandeses e ingleses, principalmente.

Com isso, a tropa de Abu Bakr al-Baghdadi, o ex-professor de Geografia e História que inventou o EI em seu formato atual, vai ganhando poder de fogo. Ainda não tem aviões de ataque, e seus poucos helicópteros são modelos civis. Mas já incorporou tanques T-72, feitos há 30 anos na extinta União Soviética e, mais recentemente, modernizados. Caminhões, veículos semiblindados de tração especial, e mesmo os onipresentes Humvees, os jipões americanos levados aos milhares para o Oriente Médio desde a Guerra do Golfo, em 1991.

Outra linha de abastecimento é a captura do equipamento deixado pelo caminho pelas forças regulares da Síria e do Iraque. Na ofensiva que criou o califado do EI, uma longa extensão de terra e areia da Síria até a fronteira da Turquia, há bases iraquianas da Aviação e do Exército. Em alguns pontos, também foram dispostas instalações sírias – depósitos de munições e suprimentos. Nesses núcleos as guarnições abandonaram, muitas vezes sem luta, enormes sistemas de armas. Um ex-militar da tropa de elite “ranger” do Exército americano que serviu por três períodos no Iraque – e hoje trabalha no Brasil, na indústria do petróleo – relata que frequentemente estoques de armas americanas do tamanho necessário para aparelhar um batalhão caíram em mãos dos radicais ainda nas embalagens.

O  movimento acumula mais de US$ 2 bilhões em reservas bem aplicadas no mercado financeiro, segundo cenário produzido pela Rand Corporation, agência privada americana de inteligência e análise estratégica. A carteira é o resultado da venda quase clandestina do caro petróleo fino e do gás extraídos de jazidas do Iraque das quais o EI se apossou. O dinheiro chega por outras fontes como doações feitas por simpatizantes de 90 diferentes nações – entre elas, o Brasil. A contabilidade do grupo radical registra a renda obtida por meio da extorsão exercida sobre empresas multinacionais, o pagamento de resgates milionários e ainda o roubo de valores de grande liquidez, como certos títulos europeus emitidos ao portador.

Governos europeus e dos EUA adotaram ações de repressão às finanças do EI. Uma delas é considerar terroristas as pessoas e as organizações que trabalhem com os extremistas.

Os milicianos do Estado Islâmico têm treinamento, ordem e agem sob consistente planejamento. Usam canhões russos de tiro rápido Shipunov 2A42, de 30 milímetros. Boa parte desse equipamento está montada em  caminhonetes comerciais – as peças assentadas sobre giroscópios, mecanismos destinados a estabilizar a plataforma de apoio permitindo tiros de precisão.

O EI se organiza de forma disciplinada em grupos de 240 militantes divididos em 20 times de 12 combatentes – um modelo muito parecido com o adotado pelas forças modulares dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha e da França. A equipe tem um líder. Os 11 homens do time avançam em ondas de fogo produzido por fuzis russos AK-102 (a versão de exportação do Ak-47), lançadores de granada de 40mm, morteiros de 60mm e foguetes leves antiblindagem do tipo RPG-7. 

*Roberto Godoy escreve no jornal O Estado de S. Paulo

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