Odisseia Bowie

Entre os figurinos apresentados na mostra está o icônico macacão op art, criado para a turnê de Aladdin Sane (1973)
Entre os figurinos apresentados na mostra está o icônico macacão op art, criado para a turnê de Aladdin Sane (1973)

A partir do dia 31 deste mês, até 20 de abril, paulistanos e turistas poderão conferir uma exposição internacional das mais exclusivas. Promovida pelo tradicional museu londrino Victoria and Albert Museum, David Bowie (ingressos já à venda) presta tributo a um dos artistas mais singulares do século 20. Afinal, se é verdade que o rock e a música pop foram os gêneros mais cultuados do cancioneiro popular produzidos no período, Bowie é um dos deuses do Olimpo roqueiro, e foi além, ao aceitar para si dimensão similar no imaginário da cultura pop. Em constante processo de transformação, não por acaso chamado “Camaleão”, como raros artistas da seara musical ousaram e ousam fazer, ele rompe décadas, com brilhante capacidade criativa e continua ativo e instigante, aos 67 anos.

No começo de 2013, após dez anos sem registros, o cantor, compositor e ator sazonal surpreendeu seus fãs, ao colocar na praça um novo álbum, The Next Day, recebido com o entusiasmo recorrente pelos bowiemaníacos. O clip do primeiro single, Where we Are Now, causou frisson imediato ao cair na rede. Em menos de uma semana, superou 5 milhões de visualizações. A crítica musical também fechou consenso: mais uma safra de composições revelou, intacto, o vigor criativo do artista nascido em Brixton.

Era de se esperar. Bowie sempre foi além: criou personagens; reinventou-se a cada disco; teve feições festivas, como em Let’s Dance; outrora sombrias, como na Trilogia de Berlim (leia na edição de janeiro da Brasileiros, reportagem sobre o Hansa Tonstudio, onde foram gravados Low, Heroes e Lodger). Ao lidar com tantas facetas, Bowie deu à cultura pop irresistível apelo de espetáculo, criando maneirismos que seriam replicados, à exaustão, por um sem-número de artistas. Atribuindo ao papel de cantor a atitude de incorrígivel performer, estreitou divisas entre o rock e o pop sem o menor pudor de assumir facetas comerciais, mantendo a mesma qualidade artística. Com o Camaleão, o legado de Chuck Berry ganhou longevidade, mas também holofotes, maquiagem, saltos plataforma e gestos lascivos.  

David Bowie e William Burroughs
David Bowie e William Burroughs

Brilhante compositor e letrista, David Bowie despontou como estrela ascendente em 1969, com o sucesso Space Oddity. A epifania de acento lisérgico fez muitos interpretarem a canção como epopeia de uma viagem de LSD – a narrativa, em primeira pessoa, conta a saga do astronauta Major Tom a caminho da Lua, no mesmo ano em que Neil Armstrong pisou em solo lunar. Bowie pode até ter sugerido a alguns críticos apressados que não passava de um hippie tardio, mas, antes Davie Jones, ao mudar de nome artístico estava apenas dando início a sua “odisseia” particular de reinvenções.

Naquele mesmo 1969, John Lennon sentenciou: “O sonho acabou”; meses depois, os Beatles romperam, fechando um ciclo, e a década seguinte ganharia contornos sombrios. Mas por maior ressaca que a geração flower power fosse nela experimentar, a possibilidade de sonhar com mudanças, se não na própria existência ao menos no rock, foi defendida como ninguém, por Bowie. 

Fã declarado do artista, André Sturm, diretor executivo do MIS, que em 2013 apresentou Stanley Kubrick, outra mostra internacional de grande prestígio, enumera predicados do Camaleão: “Bowie sempre foi um artista pioneiro. Inovando a cada álbum, antecipava tendências de sua época, usando criatividade no design das capas de discos, na composição dos videoclipes e em seus personagens no cinema. Influenciou e continua influenciando diversas gerações de artistas”. 

A propósito dos filmes estrelados pelo cantor – em paralelo à exibição de instrumentos, figurinos originais, manuscritos de letras, set lists de shows e um rico acervo de fotos –, o MIS apresentará também a projeção de toda a obra audiovisual do artista. Oportunidade rara de ver ou rever na tela grande filmes que marcaram época, como o da turnê do álbum Ziggy Stardust & The Spiders From Mars (1973), e relembrar papéis antológicos interpretados pelo artista, como o vampiro John Blaylock, de Fome de Viver (1983), a estreia de Tony Scott (morto em 2013, era irmão de Ridley Scott, autor de Blade Runner, outro cult dos anos 1980). 

Na ocasião da abertura da exposição, também será lançado, em parceria entre o MIS e a Editora Cosac Naify, o livro David Bowie. Item de colecionador, a publicação foi criada para a exposição original no Victoria and Albert Museum. A experiência da visitação será enriquecida com o auxílio de um audioguia. Imperdível!

David Bowie
Museu da Imagem e do Som – MIS. De 31 de janeiro a 20 de abril. De terça a sexta-feira, das 12h às 22h; sábados, domingos e feriados, das 11h às 21h. 
Avenida Europa, 158 – Jardim Europa – São Paulo – 11 2117-4777

O camaleão aos 16 anos
O camaleão aos 16 anos


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