Ondas dos eleitores derrubam as pesquisas

Passando a régua nos votos apurados em todo o país, uma constatação se destaca no conjunto da obra. Foram três ondas na reta final, nas três maiores capitais do país, que derrubaram feio os maiores institutos de pesquisa do país nas eleições de domingo.

O que aconteceu? Será que os eleitores passaram as últimas semanas fazendo molecagem com os pesquisadores só para rir por último? As metodologias dos institutos precisam ser revistas ou era absolutamente imprevisível que as três ondas se formassem no horizonte?

Até outro dia, a petista Marta iria com folga para o segundo turno e Alckmin disputava com Kassab para saber quem seria o outro candidato classificado para as finais no campo demo-tucano.

Márcio Lacerda, fabricado pelo governador tucano Aécio Neves e o prefeito petista Fernando Pimentel, estava eleito no primeiro turno em Belo Horizonte.

Eduardo Paes, o candidato inventado pelo governador Sergio Cabral, enfrentaria o evangélico Marcelo Crivella no segundo turno do Rio. O verde tucano Fernando Gabeira ainda disputava o terceiro lugar com a comunista Jandira Fegalli o voto da velha esquerda carioca.

Quando as urnas foram abertas domingo, Kassab chegou na frente em São Paulo, Leonardo Quintão colado no Márcio Lacerda em Belo Horizonte e Gabeira folgado em segundo lugar no Rio.

Na última pesquisa Datafolha, divulgada na véspera da eleição, as previsões eram estas:

Marta 36 X Kassab 30

Gabeira 20 X Crivella 19

Lacerda 48 X Quintão 35

Resultado oficial:

Kassab 34 X Marta 33

Gabeira 26 X Crivella 19

Lacerda 44 X Quintão 41

Quanta diferença! No Rio, o Ibope errou mais feio ainda. Na sua última pesquisa, divulgada no “Jornal Nacional” de sábado, apontava Crivella com 19% e Gabeira com 17% Uma semana antes, o maior instituto de pesquisas do país ainda dava Crivella com 24% e Gabeira com 17%.

Sei que é temerário cravar qualquer previsão para o segundo turno, mas algo me diz que, quando as ondas se formam, não há como detê-las no caminho. Por isso, arrisco-me a escrever aqui que os três candidatos, que surfam nas grandes ondas de outubro, são agora os favoritos para ganhar as eleições daqui a três semanas: Kassab, em São Paulo; Quintão, em Belo Horizonte, e Gabeira, no Rio. Vamos ver nos posts seguintes como está o mar neste momento nas três capitais.

A onda Kassab em São Paulo

Até ele mesmo deve ter ficado surpreso quando olhou para o lado e viu que chegou na frente de Marta no primeiro turno. Quando conversei com o jovem Gilberto Kassab pela primeira vez, em meados do ano passado, para fazer uma reportagem sobre um dia na vida do prefeito na revista “Brasileiros” (leia aqui), ele mesmo reconhecia que seu maior problema era ainda ser desconhecido de boa parte da população.

Kassab recebera meses antes de presente a Prefeitura da maior cidade do país quando José Serra resolveu trocá-la pelo governo do Estado, com menos de dois anos de mandato, mas já sabia o que queria.

Ficou mais conhecido com a campanha “Cidade Limpa”, quando combateu com coragem a poluição visual na cidade, tirando na marra a sujeirada da propaganda das ruas e fachadas. O tempo todo que conversei com ele, porém, só repetia em investir pesado na área social, quer dizer, em educação e saúde, nas áreas mais pobres, como se fosse um militante petista.

Já estava pronto o discurso que repetiu agora à exaustão em seu bem feito programa eleitoral, que ganhou mais tempo do que os outros graças à aliança que Serra costurou com o PMDB de Quércia. Pelo jeito, a estratégia deu certo.

Kassab tirou de Alckmin o voto anti-PT, que é muito forte em São Paulo, desde os tempos do malufismo, que os tucanos herdaram. E é esse voto que, a meu ver, lhe dá agora a condição de favorito, mais do que o apoio oficial e a presença do governador Serra nos palanques.

Em sentido contrário, tenho sérias dúvidas se a estratégia de federalizar e ideologizar a campanha do PT no segundo turno, como se anuncia, dará certo para Marta. Já não deu quando ela enfrentou Serra nas últimas eleições e nada indica que o eleitorado paulistano tenha mudado seu caráter conservador.

Mesmo a decisão de optar preferencialmente pelos mais pobres, como tem feito em seus últimos discursos, é de resultado duvidoso para Marta. Em São Paulo, ninguém gosta de admitir que é pobre _ no máximo, fala que é “remediado”.

Além disso, se Marta continuar falando para seu eleitorado cativo das periferias das zonas leste e sul não vai conseguir atrair o voto da classe média, predominantemente anti-PT.

O mar, neste momento, está para Kassab. Nem acho que o segundo turno em São Paulo seja a antecipação da disputa presidencial de 2010. Por mais que o presidente Lula, com todo seu prestígio, venha dar apoio a Marta em São Paulo, assim como Serra a Kassab, penso que esta será uma disputa bem local, bem paulistana: é PT e anti-PT.

Em todas as projeções para o segundo turno, antes mesmo da onda Kassab, ainda que o candidato anti-PT fosse Alckmin, Marta já começaria a etapa decisiva com 10 pontos de desvantagem. Para mudar isso, só se aparecer outra onda, um tsunami vermelho, que não consigo vislumbrar no horizonte desta segunda-feira chuvosa em São Paulo.

A onda Gabeira no Rio

Carioca gosta de uma novidade, gosta de contrariar os institutos de pesquisa e de surfar numa onda nova, sempre foi assim. E a novidade destas eleições é um jovem de 67 anos, de rebeldes cabelos grisalhos, o eterno candidato alternativo Fernando Gabeira, que trocou a fantasia de guerrilheiro por uma sunga e foi à luta como militante ecológico, com breves escalas no PT antes de cair nos braços dos tucanos.

Vai enfrentar no segundo turno um candidato fabricado pelo governador Sergio Cabral, um político obscuro, que se tornou conhecido nas CPIs do fim do mundo quando bateu pesado no governo Lula, depois de naufragar a tentativa do governador de fazer uma aliança com o PT.

Cristão novo do PMDB, ex-demo e ex-tucano, Eduardo Paes, político revelado por Cesar Maia, abriu apenas seis pontos de vantagem sobre Gabeira no primeiro turno mesmo contando com todo o apoio da máquina estadual. Quer dizer, o jogo está aberto.

Gabeira tem história, tem carisma, é bom de marketing e agora resolveu ampliar suas alianças, buscando apoios do DEM de Maia ao multirachado PT carioca, sem medo de ser feliz. Além de tudo, leva a vantagem de que sua filha, Maya, é uma campeã de surf, sabe para onde batem as ondas.

A onda Quintão

Confesso que nunca tinha ouvido falar em Leonardo Quintão, jovem deputado federal do PMDB, de 33 anos, que atrapalhou os planos de Aécio e Pimentel de eleger um poste em Belo Horizonte já no primeiro turno.

O problema é que se eu não sabia quem era Quintão, a população de Belo Horizonte tampouco sabia quem era Márcio Lacerda, do PSB, o candidato lançado pelo laboratório político tucano-petista dos dois bem avaliados líderes mineiros.

Belo Horizonte confirma a tese de Carlos Augusto Montenegro, o homem do Ibope: depois do trauma Collor, o brasileiro dificilmente elegerá candidatos fabricados, sem currículo político, sem história. Lacerda, do PSB, começou lá no fundão, com 6 pontos nas pesquisas, e disparou com o apoio dos padrinhos no latifúndio do seu programa eleitoral e parecia que ia levar a eleição assobiando, mas na reta final deu chabú.

A deputada federal Jô Moraes, do PC do B, que saiu na frente nas pesquisas, ficou pelo caminho, mas agora pode ser um importante trunfo para Quintão no segundo turno, levando com ela os ministros dissidentes do PT, Patrus Ananias e Luiz Dulci, mais o vice-presidente José Alencar, sem falar no ministro Hélio Costa, que é do PMDB e bancou a sua candidatura. Se Quintão chegar na frente na onda mineira, onde nem tem mar, Costa passa a ser automaticamente um forte candidato contra Fernando Pimentel ao governo de Minas.

Quintão já foi o vereador mais votado de Belo Horizonte, quer dizer, tem laços fortes na cidade, como Jô Moraes e ao contrário de Lacerda, que nunca foi candidato a nada nem teve vida política em Minas. Mineirinho esperto, não falou mal de ninguém na campanha, sempre que pode elogia Aécio e saiu do primeiro turno surfando forte em direção ao segundo e à vitória.

Quem poderia prever este desfecho quando a campanha municipal de 2008 começou para valer dois meses atrás?


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