Qualquer lista é injusta e incompleta. Essa, nem tanto. Pois ela não reúne necessariamente “os melhores livros” de todos os tempos, mas simplesmente os favoritos de cada convidado aqui presente. E favorito não é “melhor”. É o que mais marcou, em algum momento da vida; ou o que trouxe algum insight poderoso; ou o que tem uma cena que não sai da cabeça. Pode ser, singelamente, aquele que mais divertiu, aquele que atravessou a noite nas mãos do leitor. Pode ser, ainda, aquele, que mesmo com suas imperfeições, despertou alguma conexão íntima com um personagem ou até com a voz do narrador.

Daí ser normal que Dom Quixote,  de Cervantes, tenha ficado de fora, assim como Madame Bovary, de Flaubert, e Ulisses, de Joyce. O próprio Graciliano só entrou na lista aos 46 do segundo tempo, num lançamento providencial de Beatriz Bracher, nossa entrevistada nesta edição. A verdade é que não é fácil fazer esse tipo de lista, mesmo que ela não traga o peso do epíteto “melhores”. Para o português Valter Hugo Mãe, “é muito terrível elencar livros por ordem de preferência. É quase mal-educado”. Afinal, como escolher O Vermelho e o Negro, de Stendhal, e não O Mestre e Margarida, de Bulgákov? Como deixar de fora Campos de Carvalho e Kaváfis?

Com tudo isso, e a ajuda de nossos colunistas e do pessoal da redação, a lista, colocada em ordem alfabética, ficou bem bacana. Inclui livros de reportagem e crítica literária, uns poucos não traduzidos e um ou outro que vai fazer alguns torcerem o nariz. Melhor assim. Cânones costumam ser chatos, idiossincrasias não.

Arte/Brasileiros
Arte/Brasileiros

 

Alice Sant'Anna - poeta, autora de "Dobradura" e "Rabo de Baleia". Foto: Arquivo pessoal/Luiza Sigulem
Alice Sant’Anna – poeta, autora de “Dobradura” e “Rabo de Baleia”. Foto: Arquivo pessoal

Poema sujo, Ferreira Gullar -“Pela importância no contexto da história brasileira, pela maneira como o livro chegou ao país, num gravador, via Vinícius de Moraes, mas sobretudo pelo poema em si, sua força e seu fôlego.”

Alguma poesia Não consigo lembrar de nenhum outro primeiro livro de poesia que tenha tido tanto impacto, tantos poemas memoráveis, como esse primeiro de Drummond, lançado em 1930.”

26 poetas hoje, organizado por Heloisa Buarque de Hollanda A antologia fundamental da poesia brasileira na década de 1970, que organizou os poetas da geração marginal (e também os não marginais, que seguiriam caminhos bem diferentes).”

Armadilha para Lamartine “É um livro cult em que o Carlos filho, internado no hospício, lê os diários íntimos do Carlos pai, com humor e inteligência extraordinários.”

A paixão segundo GHLivro incontornável, assim como A hora da estrela.”

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O estrangeiro – “Pelo cinismo e pela indiferença do protagonista, pela apatia, por não conseguir se arrepender de nada.”

Elogio da sombraUma defesa literal e metafórica da sombra natural, em oposição à sombra causada pela luz elétrica, que seria estática e artificial.”

A redoma de vidro, Sylvia Plath – “Único romance publicado pela poeta, mostra o desespero gradual de uma jovem americana na década de 1950.”

Fera na selva, Henry James- “É uma novela sobre esperar grandes acontecimentos e depois ver que as verdadeiras oportunidades passam sem que se dê conta.”

O segredo de Joe Gould – Reportagem histórica publicada na New Yorker sobre um boêmio que, embora vivesse como mendigo, prometia estar escrevendo um livro colossal, História oral do nosso tempo.”

Ana Luisa Escorel - autora de "Anel de Vidro" e "O Pai, a Mãe  e a Filha", entre outros. Foto: Luiza Sigulem
Ana Luisa Escorel – autora de “Anel de Vidro” e “O Pai, a Mãe
e a Filha”, entre outros. Foto: Luiza Sigulem

Ressureição

A mão e a luva

Helena

Iaiá Garcia

Memórias Póstumas de Brás Cubas, todos os cinco de Machado de Assis

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Viagens pelo interior do Brasil

Segunda viagem do Rio de Janeiro e Minas Gerais e a São Paulo, Auguste de Saint Hilaire

Uma ninhada de fidalgos, Ivan Turgueniev

Viagens no Brasil, George Gardner

O Leopardo


 
Por conta de um romance novo – que se passa em Minas Gerais nos meados do século XIX – de tempos para cá minhas leituras se concentra­ram em textos escritos ou ambientados nesse período. Então, para sentir a atmosfera da época, fui atrás d’O Leopardo, de Lampedusa, de Uma ninhada de fidalgos, de Turgueniev e reli os cinco primeiros romances de Machado de Assis. Também procurei, entre alguns outros, os testemunhos dos viajantes europeus – botânicos e mineralogistas – que se dedicaram a conhecer o Brasil, no século XIX.

No tocante aos ficcionistas, com diferenças entre si,  como preocupações temáticas e estilo, Turgueniev, Machado de Assis e Lampedusa mostram, no entanto, muita sensibilidade para os traços básicos das respectivas nacionalidades e estão voltados para o depuramento da escrita em que os três são mestres.

O Leopardo é um livro admirável, quase perfeito não fosse o epílogo, explicativo demais no tocante ao destino final do personagens. Uma ninhada de fidalgos, eficiente na descrição do desencanto do autor com seu meio, seu semelhante e seu país. Ceticismo que o aproxima de Machado de Assis, em geral também bastante desacre­ditado de tudo. Quanto a este, RessureiçãoA mão e a luva, Helena e Iaiá Garcia, como sabemos todos, são estágios preparatórios para a conquista da qualidade que apenas surge de verdade a partir de  Memórias póstumas de Brás Cubas. Isso no que se refere aos romances, porque, como contista, Machado de Assis foi quase sempre extraordinário.”

“Já os viajantes mencionados, são os que registraram a estadia no Brasil a partir da abertura do país ao resto do mundo, em 1808: John Mawe, Auguste de Saint Hilaire e George Gardner – todos também excelentes escritores. Não sendo artistas, nenhum usava o texto para se expressar, mas para descrever o que viam. E é curioso que, embora tendo feito suas incursões pelo Brasil em momentos diferentes, a visão que deixaram do país é muito parecida.

Mawe viajou entre 1808 e 1809; Saint Hilaire de 1816 a 1822, e Gardner, de 1839 a 1841. No entanto, para nos fixarmos apenas na passagem por Minas, os juízos e as observações acerca do ambiente natural; das vilas e lugarejos; dos tipos populares, da classe dominante e dos costumes de ambos esses extratos, são extremamente coincidentes, em linhas gerais.

E, seja dito a favor desses viajantes, tendo em vista a enorme distância que separava esses homens cultos – nascidos e criados no centro da civilização, em seu tempo – demonstravam boa vontade  tanto diante da precariedade cultural dos pobres diabos que encontravam pelo caminho, quanto dos embates com a natureza dura do interior do Brasil; esse conjunto todo costumava merecer deles comentários antes compreensivos e benevolentes. Pareciam frear conscientemente a manifestação do preconceito, cuja presença nos textos seria compreensível, se levado em conta o peso do etnocentrismo europeu, ainda mais pronunciado no século XIX do que em nossos dias.”

Antonio Xerxenesky - autor de "F" e "Areia nos Dentes", entre outros. Foto: Aruivo pessoal/Luiza Sigulem
Antonio Xerxenesky – autor de “F” e “Areia nos Dentes”, entre outros. Foto: Arquivo pessoal

Memórias póstumas de Brás Cubas “Todo mundo lista Machado pela profundidade psicológica dos personagens, pela crítica social. Escolhi esse livro por motivos frívolos: adoro o desvario narrativo, adoro o fato de que cada capítulo é um universo à parte, adoro o capítulo composto apenas por reticências.”

A rosa do povo “Li esse livro no colégio. Todos os moleques faziam piada com poesia e leitores de poesia, todo mundo achava poesia uma grande bobagem. Mas entendi o que a poesia podia ser. Só não tinha coragem de dizer em voz alta que achei legal. Continuo gostando do livro até hoje, embora talvez não seja o meu preferido de Drummond. Mas meu poema favorito de CDA está nele: ‘Áporo’.”

Uma aprendizagem, ou o livro dos prazeres, Clarice Lispector – “Nunca sei se odeio ou adoro a obra de Clarice Lispector. Mudei de ideia inúmeras vezes. Às vezes odeio G.H., mas idolatro Hora da estrela. A última vez que conferi, ainda gostava muito de Uma aprendizagem, que foi o primeiro romance que li da autora.”

Pornopopeia – “O livro dos trocadilhos. 600 páginas de puro malabarismo com a linguagem. Sou fã.

Um útero é do tamanho de um punho – “Acho Angélica Freitas a melhor poeta em atividade no país. Seu segundo livro é de quebrar a cabeça do leitor. Aguardo ansiosamente tudo que ela virá a publicar no futuro.”

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Antigo Testamento – “Não sendo religioso, passei muitos anos de minha vida ignorando a Bíblia. Que erro tremendo. O Antigo Testamento é um compêndio de imaginação e estilo. A potência poética do Eclesiastes me deixou boquiaberto na primeira leitura, Jó é de uma densidade impressionante. Não vou nem mencionar Gênesis e Êxodo…”

Ludwig Wittgenstein, o dever do gênio, Ray Monk – “A biografia escrita por Monk é tão incrível que pode ser lida por quem não tem o menor interesse em lógica ou Wittgenstein. Sua construção dos personagens de Wittgenstein e Bertrand Russell é tão boa que pode ser lida como ficção de primeiro nível.”

Poemas – Wislawa Szymborska – “O tipo de livro que deixa você alegre por estar vivo.”

O livro de travesseiro, Sei Shonagon – “No Japão do século XI, mulheres eram proibidas de escrever na forma poética oficial. Dane-se as regras, então. Sei Shonagon inventou e revolucionou a literatura com seu livro híbrido, inclassificável, e, sem dúvida, belo.”

Asterios Polyp, David Mazzucchelli – “Não é um dos cinco melhores livros do mundo, mas talvez seja a melhor HQ já escrita, e não queria fazer uma lista que não incluísse graphic novels, ainda mais uma tão bem construída como essa.”

Beatriz Bracher - autora de Meu Amor, Antônio e, entre outros, "Anatomia do Paraíso". Foto: Luiza Sigulem
Beatriz Bracher – autora de Meu Amor, Antônio e, entre outros, “Anatomia do Paraíso”. Foto: Luiza Sigulem

Quincas Borba, Machado de Assis   “É dos livros mais tristes de Machado de Assis, sem que haja nenhum grande drama. E o afeto de Rubião pelo cachorro Quincas Borba é de um sentimento que não me lembro em Machado. Quincas Borba é nossa primeira Baleia.”

O Louco do Cati, Dyonelio Machado “O ritmo alucinado, meio cortado, onde as cenas às vezes se parecem com pinturas cubistas, em contraste com um clima intimista, sem que seja exatamente introspectivo, é o que me encanta.”

AngústiaAlgumas cenas mais marcantes, em um livro todo impressionante: Luís na sala, depois de jantar, com uma corda na mão, alimentado sua raiva de Julião Tavares. A corda vai se transformando em um animal que ele não consegue e nem quer conter. Luís seguindo Marina, que vai fazer um aborto. Esperando no bar em frente e a amparando na volta. Sua raiva perpassa Marina, Julião, ele mesmo, e o erro de ortografia da frase no muro que prega a revolução.”

Galo das Trevas, Pedro Nava “É neste livro que Egon, alter-ego de Nava, assume a narrativa das memórias e ela se divide em duas. A do passado, tocada por Egon, o início da vida de médico de interior, um grande amor em Belo Horizonte. A do presente, em que Pedro Nava-narrador se defronta com a decrepitude do corpo e volta-se ao passado mais longínquo dos traços familiares que a velhice vai revelando em seu rosto.”

O Hospício é Deus, Maura Lopes Cançado “É um diário escrito por Maura em um dos períodos em que esteve internada. Me atrai a qualidade e violência da sua escrita. Além da sua maneira de ver o dia a dia de um hospício de um ponto de vista absolutamente pessoal.”

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Passeio ao farol, Virginia Wolff O passeio ao farol é a parte final do livro. Lá os filhos, finalmente, seguem com pai para o farol. Eles já são adolescentes e lembram-se dos dias narrados na primeira parte em que, no meio de várias pequenas ações e diálogos pacíficos, miúdos, e pensamentos lentos (porque não fecham as portas? Será que vai chover?) da família e um grupo de amigos na casa à beira mar, esperam o tempo firmar para poderem passear até o farol.”

Na colônia penal, Franz Kafka “O subordinado do antigo comandante de uma colônia penal faz uma demonstração da enferrujada máquina para um militar estrangeiro. Através de hastes afiadas a máquina escreve na pele do prisioneiro o seu crime. Elas vão afundando na carne cada vez mais fundo, até a morte do condenado. O subordinado está atrapalhado e aflito, o militar constrangido e entediado, e prisioneiro curioso com as explicações sobre a máquina. Tudo é interessante e esquisito nesta pequena novela.”

Palmeiras selvagensDuas histórias são intercaladas. A de um casal que segue errante uma nova vida, sempre tumultuada, parando por pouco tempo em uma e outra cidade, cada vez mais enfraquecidos fisicamente e emocionalmente envolvidos. A de um homem negro em um pequeno barco ajudando pessoas enquanto tenta chegar a um porto seguro em meio à cheia dos rios e chuvas que não param. Nem os temas nem os personagens das histórias se tocam, e, ainda assim, a leitura de uma e de outra transformam completamente nosso entendimento sobre cada uma delas.”

Ficções, Jorge Luis Borges “Li este livro de contos na minha adolescência e eles são como memórias de coisas que vivi. Ter lido, nesta idade, os contos em que Borges mistura o fantástico com a enciclopédia Britânica, filosofia e aventura foi fundamental para a minha formação.”

A prisioneira, Marcel Proust Todos os livros de Em busca do tempo perdido são impressionante. Escolhi este por ser, talvez, aquele em que a reflexão, presente em toda a obra, está mais entremeada de excitação e quase descontrole. Trata, basicamente, do ciúmes.”

O templo dourado, Yukio Mishima – “Me comove a pureza e a loucura do protagonista, o amor que Mishima dedica a ele, e como exatamente a pureza, ou sua busca, o leva à destruição.”

Edyr Augusto - autor de "Pssica" e "Moscow", entre outro. Foto: Luiza Sigulem
Edyr Augusto – autor de “Pssica” e “Moscow”, entre outro. Foto: Luiza Sigulem

Menino de Engenho –  “Eu tinha uns 12 anos de idade e o professor mandou ler e escrever a respeito. Meu avô me emprestou. Estava com dedicatória e tudo. Me apaixonei pela Literatura Brasileira a partir daí.”

Eles eram muito cavalos – “Um dos grandes livros dos últimos tempos. O mosaico montado a partir de textos curtos, de grande impacto e emoção. Me influenciou a escrita.”

Nelson Rodrigues – O Anjo Pornográfico, Ruy Castro – “Meu pai adorava suas crônicas e me dava para ler. Fazendo teatro, já adaptei Senhora dos Afogados. O grande mestre, frasista, criador do Teatro Brasileiro, belamente biografado por Ruy Castro.

O Cobrador – “Básico para quem gosta de literatura policial, brasileira, direta e representando os tempos em que vivemos. Não há necessariamente detetives e seus casos, mas pessoas vivendo uma convulsão social.”

Rio de Raivas – “Paraense, Haroldo, na minha opinião, foi um dos maiores romancistas brasileiros. Sua escrita volumosa como maré cheia, pena agressiva, criativa, contando sobre a Belém dos anos 50, seus podres e chiques, com uma verve maravilhosa.”

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A Guerra do Fim do Mundo – “Adolescente, passei direto pelo ‘Homem’ e a ‘Terra’, para ler a ‘Guerra’, de Os Sertões, de Euclides da Cunha. Mario romanceou muito bem e é desses livros que a madrugada avança e vamos lendo mais e mais até perder a hora de acordar.”

O Grande Gatsby, Scott Fitzgerald – “Um escritor que esbanjava charme, simpatia, beleza e simplicidade na escrita, retratando os vendavais nas vidas de jovens ricos, bon vivants, mas também dramas e tragédias originados por amor e dinheiro.”

A Sangue Frio – “Capote inventa o romance investigativo, a partir de um crime no interior dos EUA. Na região árida, ele cria uma grande história, mesmo contestada anos depois. Obrigatório para jornalistas.”

O Falcão Maltês, Dashiell Hammett – “Livro essencial para quem gosta de romances noir. Tudo parece em p&b, como nos filmes. Há pouco espaço para sentimentalismo. Gosto dos comentários, do ritmo, da história.”

O Chefão, Mario Puzo – “Me impressionou desde a primeira vez. A condução da história. Os personagens, um por um, e após, o seu cruzamento, mantendo todos em perigo, sempre. Serviu como base para escrever meu primeiro romance, Os Éguas”.

Eiiane Robert Moraes -autora, entre outros,  de "Sade – A Felicidade Libertina" e organizadora da "Antologia da Poesia Erótica Brasileira". Foto: Arquivo pessoal
Eiiane Robert Moraes -autora, entre outros, de “Sade – A Felicidade Libertina” e organizadora da “Antologia da Poesia Erótica Brasileira”. Foto: Arquivo pessoal

caderno rosa de Lori Lamby – “Disfarçado de pornografia, o texto é uma fina reflexão sobre o ato de escrever como possibilidade de jogar com os limites da linguagem. Trata-se, para Lori Lamby, de conhecer o funcionamento da língua, no seu duplo registro: falar, narrar, fabular — assim como lamber, chupar e sugar –, exigem um aprendizado sutil e interminável, pois os prazeres da boca se desdobram em muitas modalidades. Não por acaso, a autora dedica o livro ‘à memória da língua’”.

Pornopopéia – “Figura exemplar do excesso, o protagonista de Pornopopéia nada constrói, nada edifica, nada produz, entregando-se por completo à vertigem da dilapidação. O resultado é uma ficção erótica que ‘corrige’ o mundo segundo as exigências do desejo, sem ter que observar qualquer constrangimento, seja ele de ordem moral, ética, política, religiosa ou psicológica. Epopeia vertiginosa na qual vale tudo, inclusive as cenas mais absurdas e irreais, já que são vividas por um personagem que diz estar ‘copulando em letras’”.

Poesia Erótica em tradução – “Não faltam razões para que o leitor se encante com essa antologia, que traz poemas da antiguidade helênica e latina, versos satíricos da Idade Média, trovas provençais do século XIII, exemplares do barroco espanhol, passando pela poesia libertina setecentista, pelo folclore da Calábria do século XIX, até a produção dos surrealistas franceses. As impecáveis traduções de José Paulo Paes dão a conhecer as formas poéticas da erótica ocidental, revelando as marcas que a história e a cultura imprimem na experiência carnal.”

A invenção da pornografia – A obscenidade e as origens da modernidade, 1500-1800, Lynn Hunt (org.) Em estrita fidelidade ao sentido moderno do termo ‘obsceno’, a tradição pornográfica que se inaugurou na Europa a partir do Renascimento caracterizou-se pela difusão de imagens e palavras que feriam o pudor, fazendo da representação explícita do sexo sua pedra de toque.  Os autores da coletânea investigam a emergência dessa cultura erótica na modernidade, tendo em vista a popularização do material licencioso que, pautado pela intenção realista, implicava uma transgressão deliberada da moral.”

Um mais além erótico: Sade, Octavio Paz “Publicado em 1961, o ensaio participa do grande interesse que Sade suscitou no pensamento europeu a partir do pós-guerra. Octavio Paz testemunhou de perto a inquietação de uma geração de intelectuais que, abalada com as atrocidades da Segunda Guerra, se via compelida a repensar as bases de um humanismo que a realidade havia colocado em cheque.”

Eros, tecelão de mitos – A poesia de Safo de Lesbos – “Escritos na idade de ouro do lirismo grego, por volta de 600 a C, os versos de Safo de Lesbos fundam a poesia amorosa do Ocidente, fazendo reverberar um Eros meditativo que o tradutor designa como ‘tecelão de mitos’. Além de oferecer uma tradução sensível dos poemas e fragmentos dessa lírica inaugural, Joaquim Brasil Fontes explora sua dimensão fantasmática em um ensaio notável, que gira em torno das sucessivas leituras da poeta grega, de Ovídio a Baudelaire.”

Sonetos Luxuriosos – “Entre os humanistas do Renascimento que se lançaram à ousada tarefa de desvendar os mistérios do mundo, Aretino ocupou um lugar único. Sua obra licenciosa tinha o objetivo de expor ‘a coisa em si’ e, por isso mesmo, tornou-se a principal fonte do moderno erotismo literário. Escritos em 1525, e condenados ao silêncio durante quatro séculos, os sonetos descrevem a atividade erótica sem qualquer reserva, colocando em cena um mundo livre e lúbrico, em que a retórica do orgasmo faz par com a lógica do olhar.”

As Relações Perigosas, Choderlos de Laclos – “Desde sua publicação, em 1782, o romance epistolar de Laclos vem intrigando leitores e críticos. Se o livro escandalizou seus contemporâneos, mais tarde encantou escritores como Stendhal, que via nele uma ‘ciência do coração’, e Baudelaire, que realçou seu ‘satanismo’, associando-o à obra de Sade. Obra-prima da literatura e obra-mestra da ambiguidade, o texto traduz uma convicção no poder performativo da palavra, revelando uma concepção produtiva da língua: entre os libertinos, o verbo constitui a ação. Nas mãos da Marquesa de Merteuil e do Visconte de Valmont, a carta é um instrumento de sedução, que busca trair –e não traduzir– a verdade.”

Os 120 Dias de Sodoma – “Primeiro romance de Sade, escrito em 1785 quando o autor estava preso na Bastilha, o livro se apresenta como ‘a narrativa mais impura já escrita desde que o mundo existe’. Trata-se da história de quatro libertinos que se associam para levar a termo o projeto de conhecer, representar e praticar ‘todas as paixões sexuais que existem na face da Terra’. O marquês desafia o leitor a imaginar um mundo completamente organizado segundo seus desejos; um teatro, a encenar exclusivamente suas fantasias; um banquete, que contempla a singularidade de seu paladar.

Do amor, Stendhal “O livro reúne uma série de fragmentos escritos cujo intuito inicial era ‘analisar in vivo’ as figuras essenciais do sentimento amoroso. Mas o plano sistemático que o autor promete ao leitor é, pouco a pouco, substituído por um diário íntimo que aborda a paixão como ‘uma bela e inevitável catástrofe’. Considerado ‘uma espécie de loucura raríssima na França’, o amor sobre o qual Stendhal discorre tem sempre como protagonista um sujeito sensível e solitário. Daí ele afirmar que escreve para poucos leitores: ‘aquelas pessoas infelizes, amáveis, encantadoras, nem um pouco hipócritas, nem um pouco morais às quais eu gostaria de agradar’”.

Três filhas da mãe, Pierre Louÿs “’Minhas três filhas são meu bordel’ – é assim que Teresa apresenta sua família ao jovem desejoso de conhecer as lascivas vizinhas do apartamento ao lado. A apresentação sumária da mãe contrasta com a do narrador que introduz as quatro personagens com a maior riqueza de detalhes. Da primeira à última página, ele descreve seus encontros lúbricos com as meninas Charlotte, Mauricette e Lili, dos quais a insaciável Teresa não deixa de participar. Com tal enredo, não estranha que o romance de 1926 seja considerado até hoje um dos livros mais obscenos da literatura francesa.”

Trópico de Câncer, Henry Miller Lançado em 1934, o primeiro romance de Miller suscitou testemunhos apaixonados por parte de Samuel Beckett, que aclamou o livro como ‘um evento monumental da história da escrita moderna’. O relato da vida boêmia de um escritor americano na Paris da época excedia a visada autobiográfica para transformar-se no espelho onde sua geração contemplava as próprias fantasias sob o sombrio pano de fundo do entre guerras. Ainda que a sensação de vazio e a embriaguez do narrador traduzisse a consciência dilacerada de uma sociedade em crise, seu voto de fé na devassidão criava um mundo à parte, onde prevaleciam os imperativos do desejo.”

Fabio Massari - autor de "Rumo à Estação Islândia" e organizador de "Alguém Come Centopeias Gigantes?", entre outros. Foto: Arquivo pessoal
Fabio Massari – autor de “Rumo à Estação Islândia” e organizador de “Alguém Come Centopeias Gigantes?”, entre outros. Foto: Arquivo pessoal

Falência da Crítica “Ensaio clássico (da não menos clássica coleção Debates, da Editora Perspectiva) da professora e crítica literária Leyla Perrone-Moisés, autora de Altas Literaturas e Inútil Poesia, dentre outros. No caso, o assunto é o próprio oficio, a critica literária e sua impossibilidade de lidar com o personagem-limite Lautréamont.” 

Cenários em Ruínas, Nélson Brissac Peixoto Editora Brasiliense, safra 1987. Ensaio de corte pós-modernista – com bossa, sem afetação acadêmica – do filosofo e professor NBP. O sujeito como estrangeiro em seu próprio espaço urbano, submerso em referências cinematográficas e literárias. Raymond Chandler, JimThompson, Jack Kerouac, Wim Wenders, Jim Jarmusch e dezenas de figuras desse calibre dão as caras nesse inquietante e vertiginoso ensaio-noir.”

Navios Iluminados“O prazer de encontrar um livro por acaso, a descoberta de uma pequena gema literária perdida… Ambientada na Santos do começo do século, essa emocionante e bem talhada novela do médico e autor sergipano, Ranulpho Prata, nascido ao final do seculo 19, cativa pela serenidade, ou aparente simplicidade das tramas. Mas tem algo de especial, de melancólico e envolvente na maresia desse realismo-portuário.”

O Anjo, Jorge de Lima “Contemporâneo de Ranulpho, o alagoano Jorge de Lima representa o alto escalão da nossa galeria de malditos. O autor do acachapante Guerra Dentro do Beco nos brinda (veneno!), nas poucas paginas desse Anjo, com uma das prosas poéticas mais impactantes e inclassificáveis da nossa literatura – pelo menos é assim que funciona lá na humilde biblioteca pessoal. É ler e reler e reler e se espantar toda vez…”

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The Unlimited Dream Company “Nessa novela de 1979, o autor de Crash, The Atrocity Exhibition e Império do Sol, dentre muitos outros, literalmente levanta vôo e atira sua literatura especulativa em direção a esferas nunca, ou raríssimamente desbravadas. Esquisitão na boa medida ballardiana e simplesmente maravilhoso.”

Naquele Exato Momento, Dino Buzzati “Narrativas curtas, minimalistas, ocasionalmente atômicas e sempre perfuro-contundentes, do versátil autor de Deserto dos Tártaros.”  

Os Cantos de Maldoror “O meu maior de todos, o imbatível. O mais feroz, e lindo, livro que já li. Nunca no original, infelizmente; mas tendo experimentado esses cantos parapsicodelicos e proto-surrealistas em espanhol, italiano e inglês, posso garantir que nossa versão brasileira assinada pelo poeta Claudio Willer é a mais eficiente.”

Lost Highway/Bad Wisdom “Livros complementares, trabalho a 4 mãos de folego e absoluto descontrole gonzo com assinaturas tipo rock’n’roll. Drummond, ex-KLF, e Manning, do Zodiac Mindwarp, ambos autores consagrados, descrevem suas viagens ‘temáticas’ aos confins do planeta (e da alma) com a graça de um Hunter Thompson à beira do precipício existencial. Pequenos clássicos que pouca gente vai ler, são relatos absurdamente divertidos e habilmente concebidos. Literatura ‘de viagem’ nao fica melhor que isso!”

Crystallography, Christian Bök “Estreia literária do poeta (professor e artista polivalente e vanguardeiro) canadense, trata-se basicamente de uma obra prima da poesia experimental. Transcendental. Os cristais e suas propriedades físico-químicas e as palavras com suas estruturas e mistérios. Retratos refratários da poesia em movimento. Um vislumbre das engrenagens em funcionamento! Dá para chorar com algumas dessas iluminações…”

Straight Life, Art Pepper“Representando os livros ‘musicais’, a mais rock’n’roll das autobiografias vem do universo do jazz e traz a assinatura do cultuado saxofonista da costa oeste norte-americana, o craque da geração pós-Charlie Parker, Mr. Art Pepper, senhoras e senhores. Personagens incríveis (e reais!) e tramas rocambolescas (idem). Vida louca e trilha de primeira. Cooleza total. Dava uma boa serie de TV, estilo HBO. As passagens (muitas) pela mítica prisão de segurança máxima San Quentin são impagáveis.”

Heloísa M. Starling - coautora, ao lado de Lilia M. Schwarcz, de "Brasil: Uma Biografia". Foto: Luiza Sigulem
Heloísa M. Starling – coautora, ao lado de Lilia M. Schwarcz, de “Brasil: Uma Biografia”. Foto: Luiza Sigulem

Visões do paraíso – “O livro de História do Brasil que pode ser lido como um romance. Magistralmente escrito, não exige conhecimento especializado do tema – Sérgio Buarque escreve para todo e qualquer leitor interessado no Brasil que ele investiga e narra. Visões do Paraíso é ‘a biografia de uma ideia’ – uma biografia construída sobre as diversas tópicas do imaginário edênico do Novo Mundo e ancorada nos relatos dos viajantes, na literatura medieval, nos fabulistas e nos poetas.”

O nome e o sangue, Evaldo Cabral de Mello – “O livro é de História do Brasil, mas a narrativa tem a estrutura do thriller policial. Evaldo investiga a história de uma fraude perpetrada pelo membro de uma rica família do Pernambuco colonial para obter a importante ordem militar de Cristo – e, com ela conseguir uma fonte extra de prestígio e de vantagens econômicas. O leitor vai se regalar com as burrices da Inquisição, as confusões familiares e as tramoias da sociedade colonial. Mas vai se espantar muitíssimo ao conhecer as raízes autoritárias da sociedade luso-brasileira, onde não existem direitos, mas troca de favores.”

Incidente em Antares, Érico Veríssimo – “A mais genial alegoria do Brasil em face à ditadura militar foi originalmente publicada em 1971. Numa sexta-feira 13, sete cadáveres que uma greve geral impede de serem sepultados, voltam à vida, caminham pela cidade e denunciam as vilanias cometidas por seus moradores. O pano de fundo dessa caminhada fantasmagórica: tortura, corrupção e a crítica feroz contra qualquer forma de tirania.”

Os olhos cegos dos cavalos loucos, Ignácio de Loyola Brandão – “Há pelo menos duas leituras possíveis desse livro. Uma delas nos diz que é através da memória que o homem permanece criança e a infância é a sede dos ensinamentos e dos preconceitos – as relações familiares, a culpa, o perdão e o arrependimento.  A outra leitura traz um aviso: é impossível recuperar os seres queridos do passado – eles não saberiam respirar na névoa do presente. Loyola Brandão inventou um livro triste e deslumbrante: um homem escava sua história entre a recordação do passado, o lusco fusco da memória e os anteparos do presente.”

Se eu fechar os olhos agora, Edney Silvestre – “O corpo mutilado de uma mulher é encontrado nas margens de um lago, num lugarejo do sul fluminense. O marido confessa, a polícia encerra a investigação e a cidade suspira aliviada com a explicação oficial do crime. Só tem um problema, avisa um personagem do livro: ‘Nada, nesse país, é o que parece’. Nem mesmo o racismo, a corrupção, ou os acordos políticos.”

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Poemas – Wislawa Szymborska – “A poeta nasceu na Polônia e era praticamente desconhecida no Brasil até ganhar o prêmio Nobel, em 1996. Seus versos são irônicos, muitas vezes sombrios e provocam surpresa e estranhamento. Através do manejo da poesia, Szymborska desestabiliza o convencional e corrói verdades – na história, na ciência, ou na religião.”

O homem que amava os cachorros – “Uma obra de ficção que não é só ficção: conta a história da União Soviética, de Cuba e da grande utopia revolucionária do século XX. Um thriller policial em que o leitor sabe, desde o início, quem é a vítima – o líder bolchevista Leon Trotski – e quem é o assassino – o comunista espanhol Ramón Mercader. E, mesmo assim, sua leitura é de tirar o fôlego. Uma vez começado, não há como parar de ler esse livro.”

Por amor ao mundo: a vida e a obra de Hannah Arendt, Elisabeth Young-Bruehl – “Hannah Arendt dizia que os livros deixados por um autor pertencem ao mundo e o seu destino depende do que o mundo irá fazer com eles. Mas a vida do autor do livro morre com ele se não existir, de algum modo, a atualização do tecido dessa vida através da lembrança, tornando-a real para sempre. Essa biografia acompanha a trajetória de vida de Hannah Arendt no tempo que lhe foi dado viver; as intervenções que protagonizou na cena pública de sua época com os recursos de que dispunha; e o que os episódios de um destino pessoal têm a dizer sobre as coisas da política, sobre o mundo e o tempo em que vivemos.”

Terra sonâmbula, Mia Couto – “A fábula é um gênero literário cujas raízes estão fincadas numa espécie de fronteira entre o sonho, a poesia e o mito – fábulas são recheadas de magia, de espíritos e demônios; campos, florestas e rios se animam, os bichos revelam subitamente sua condição de seres encantados, prodígios acontecem, a natureza se agita. O livro de Mia Couto lembra a prosa de Guimarães Rosa e ensina ao leitor a ‘doença de sonhar’ – mesmo em Moçambique, um país assolado pela devastação provocada pela guerra civil.”

Rio das flores, Miguel Souza Tavares – “Três gerações de uma mesma família – os Ribeiro Flores, do Alentejo – atravessam os principais acontecimentos da primeira metade do século XX. A narrativa se desenrola entre Portugal, Espanha e Brasil e os personagens descobrem que a liberdade não é plácida, seu traçado não é reto, seus caminhos não são claros.”

Leandro Sarmatz - autor de "Uma Fome". Foto: Arquivo pessoal
Leandro Sarmatz – autor de “Uma Fome”. Foto: Arquivo pessoal

A rosa do povo – “O maior conjunto de poemas da língua portuguesa e um dos mais agudos depoimentos sobre o século da barbárie.”

Nove noites – “A melhor e mais afiada incursão de um autor de língua portuguesa no movediço terreno do contemporâneo.”

Minha formação – “Brasileiro é bom de memória. E as páginas de Nabuco, ah, leia nem que seja apenas pelo prazer sensorial.”

A idade do serrote – “Brasileiro se realiza na memória II. Aqui, Murilo roça os domínios de Mandelstam  e seu O rumor do tempo (que deveria estar na minha lista).”

O galo branco, Augusto Frederico Schmidt – “A prosa brasileira alcança o ápice na memória III.”

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Pais e filhos – “Sem histeria e com calculada leveza, Turguêniev mostra o nó nunca desfeito do conflito geracional.”

Na Patagônia – “Cada vez mais atual, graças aos procedimentos chatwinescos: viagem, ensaio, anedota e ficção.”

A ilha, Gianni Stuparich – “Pai morrendo. Nostalgia. Encantamento terminal pelo mundo. E o início de uma linda história.”

Diários, Kafka – “Está tudo em Kafka, e todo Kafka está nestas páginas íntimas.”

A lenda do santo beberão, Joseph Roth – “Um poema etílico.”

 

Noemi Jaffe - autora de "Írisz: as Orquídeas" e "O que os Cegos Estão Sonhando?", entre outros. Foto: Luiza Sigulem
Noemi Jaffe – autora de “Írisz: as Orquídeas” e “O que os Cegos Estão Sonhando?”, entre outros. Foto: Luiza Sigulem

Poesia Completa e Prosa, Manuel Bandeira – “A poesia que me fez descobrir que é possível, e desejável, escrever e ser simples.”

Grande sertão, veredas – “Se o livro tivesse sido escrito em língua inglesa, teria a dimensão de James Joyce.”

A paixão segundo G.H. – “Para mim, foi a descoberta da dificuldade de ser mulher e de como é possível escrever sobre o pensamento.”

Os ratos – “Um livro muito pouco reconhecido e que, na minha opinião, está entre os melhores de nossa literatura, lembrando, por exemplo, O Capote, de Gogol.”

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José e seus irmãos – “O desespero de Jacó, quando fica sabendo da suposta morte de seu filho José, me fez repensar minha relação com a fé de forma decisiva.”

Austerlitz– “Neste romance, a confusão proposital entre ficção e realidade faz pensar em como a guerra é o que existe de mais falso e de mais verdadeiramente humano.”

Submundo, Don Delillo – “Uuma escrita que, na minha opinião, se equipara, contemporaneamente, ao que Tolstoi deve ter sido para sua época.”

O homem comum, Philip Roth – “Uma crítica ao mesmo tempo cínica e lírica sobre o burguês americano e, portanto, sobre o burguês de São Paulo também.”

Obras completas de William Carlos Williams – “A ideia exemplar de que poesia é condensação.”

Rua de mão única, Walter Benjamin – “A demonstração de como é possível fundir filosofia e poesia.”

Pilar Del Rio - jornalista, tradutora e presidente da Fundação José Saramago. Foto: Arquivo pessoal
Pilar Del Rio – jornalista, tradutora e presidente da Fundação José Saramago. Foto: Arquivo pessoal

Memórias póstumas de Brás de Cubas – “Só uma pergunta: como se pode escrever assim?”

Budapeste – “Um contemporâneo que me fala como se no existisse o tempo”

Gabriela, cravo e canela – “Podia ser qualquer outro de Jorge Amado, preciso estar sempre perto de seu universo transbordante.”

A rosa do povo – “Na biblioteca de Saramago se entra por Drummond, quem sou eu para ignorar esse nome?”

A república dos sonhos, Nélida Piñon – “Em seu aniversário, celebrando a amizade e o prazer de ler.”

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O evangelho segundo Jesus Cristo – “A mais bela meditação sobre a culpa e a responsabilidade na civilização ocidental.”

Carta ao Pai, Kafka – “Um golpe no estômago. Ainda dói, quase cinquenta anos depois que o li.”

O Livro do Desassossego– “Um redemoinho que nos atrai e expulsa com a mesma violência”

História universal da infâmia – “O desconcerto inicial, a fascinação literária e a sedução do estilo”  

Arenas movedizas, Henning Mankell – “ A última obra de Mankell, confidencias ao pé do ouvido.” 

Pola Oloixarac - autora de "As Teorias Selvagens". Foto: Arquivo pessoal
Pola Oloixarac – autora de “As Teorias Selvagens”. Foto: Arquivo pessoal

Metafísicas Canibais – “O que há de mais interessante no pensamento mundial”

Nove Noites – “Um thriller antropológico, denso como a floresta, espiralado e louco; uma masterpiece demais!”

Perto do Coração Selvagem – “Nesse livro inventou uma nova língua, escura, filosófica e sensual.”

Pão de Corvo – “Nuno Ramos é um gênio!”

Berkeley em Bellagio

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Fogo Pálido – “Toda a teoria e prática da literatura do século 20 estão aí. A melhor comédia intelectual do feiticeiro russo.”

Frankenstein – “Obra-prima sobre um monstro imortal”

Vampyrotheutis Infernalis, Vilem Flusser – “Fenomenologia de outro mundo, que se lê como um romance alienígena, pelo maior filósofo brasileiro”

Terras Sombrias

Panteleão e as Visitadoras, Mario Vargas Llosa“Grande comédia sobre a fala e a autoridade latino-americana. E, claro, o sexo.”

Rodrigo Lacerda - autor de, entre outros, "O Fazedor de Velhos" e "A República das Abelhas". Foto: Luiza Sigulem
Rodrigo Lacerda – autor de, entre outros, “O Fazedor de Velhos” e “A República das Abelhas”. Foto: Luiza Sigulem

I-Juca Pirama – “Foi uma das minhas primeiras paixões literárias. Um exemplar maravilhoso do indigenismo e do romantismo brasileiros. Uma poesia de ritmo impressionante, com muita ação.”

Testamento de Pasárgada, poesia de Manuel Bandeira com organização de Ivan Junqueira – “Foi por meio deste livro que entrei em contato com a poesia de Manuel Bandeira, desde então o meu poeta brasileiro preferido.”

Alguma poesia – “Um livro maravilhoso, já influenciado pelo modernismo dos anos 20 e com poemas inesquecíveis. Também um marco nas minhas leituras de Drummond.”

Viva o povo brasileiro – “Um livro no qual o passado e o presente da língua portuguesa se encontram. Um resumo de tudo que foi feito em matéria de escolas literárias no Brasil até então, e até hoje.”

Auto do frade – “Um poema narrativo sobre Frei Caneca e a Conferência do Equador. Não é dos livros mais comentados do João Cabral, mas acho uma injustiça.”

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Hamlet – “A peça é um exemplar perfeito da combinação de dramaturgia e poesia, típica do teatro da época.”

Palmeiras selvagens – “Duas histórias que se desenvolvem paralelamente, ambas com grande força literária e humana. A história que dá título ao livro é uma história trágica de amor na modernidade.”

Os Maias – “O mais belo, e divertido, romance realista de todos os tempos na minha opinião. Um painel abrangente da sociedade e do universo mental do século XIX.”

A feira das vaidades, William M. Thackeray – “Outro painel impressionante, agora da sociedade inglesa. O autor, contemporâneo de Dickens, é um estilista espetacular e dono de um senso de humor inteligentíssimo.”

Os moedeiros falsos, André Gide – “Um livro moderníssimo para a época em que foi escrito, anos 1920, tanto na estrutura quanto na temática. Continua moderno até hoje, e é uma leitura que, depois de começada, é impossível parar.”  

Valter Hugo Mãe - autor de "A Desumanização" e "A Máquina de Fazer Espanhóis". Foto: Arquivo pessoal
Valter Hugo Mãe – autor de “A Desumanização” e “A Máquina de Fazer Espanhóis”. Foto: Arquivo pessoal

Grande Sertão: Veredas – “Pela exuberância da forma e excelência do conteúdo. Poucas obras contribuíram mais para o imaginário da escrita em português quanto esta. Rosa é o super poeta em prosa. Não é perfeito, é melhor do que perfeito, porque comporta todas as coisas, até as desalinhadas, feias. Tudo vira legítimo.”

Carlos Drummond de Andrade, toda a poesia – “Racional e capaz de evidenciar o absurdo. Drummond concretiza cada recanto da subjetividade. É a elegância e a inteligência.”

Poema sujo, Ferreira Gullar – “Um dos mais fortes e importantes manifestos da humanidade. Torrencial e certeiro, austero no sentido profundo e rigoroso do termo. Gullar é ouro sapiente.”

O labirinto da saudade – Psicanálise mítica do destino português – “Eduardo Lourenço é nosso mais deslumbrante filósofo em Portugal. A sua visão dura sobre o país é uma lição de humildade mas também de força. Uma espécie de exuberância do pensamento, conseguida por uma expressão profundamente poética e encantatória.”

Livro do Desassossego – “Tão disperso quanto maravilhoso. O livro de Pessoa que mais convive com a eternidade. Uma visão desenganada da vida, feita da sagacidade espontânea e do efeito de estranha intimidade que podemos estabelecer com o narrador.”

Obra, Adília Lopes – “A poesia portuguesa chegou a Adília Lopes e perdeu toda a academia. Durante quase vinte anos ninguém parecia saber falar dela. Hoje, escondida nas suas preces, a autora é a mais estranha e fecunda oportunidade da poesia contemporânea. Não será nunca fácil de catalogar, mas a evidência de que nos diz respeito, a nós, os cidadãos de hoje, isso é inequívoco.”

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Satan Says – “Sharon Olds é Minha poeta estrangeira favorita. Adoro o seu sujo, a sua mágoa, a violência de que se lembra, adoro o seu amargo universo infantil, o modo como nos conta coisas incômodas. Amo Sharon Olds. Entendo muito mal que não seja uma estrela mundial.”

A metamorfose – “Todos os livros de Kafka serviriam para escolha, mas este foi o que me mudou quando tinha tenra idade. A hipocrisia desmontada a partir de uma fantasia, o retrato da decadência humana mais inusitado e simples. Kafka é o mestre absoluto da simplicidade. Depois de o fazer a literatura parece fácil.”

O estrangeiro – “Que filho da puta de personagem odioso e, no entanto, irresistível. A filosofia prepara-se para uma desumanização. Camus anuncia uma nova consciência do homem. Este livro brilhante é das piores coisas que podemos ler.”

Os cantos de Maldoror – “Outro texto abjeto. Outro livro que descobrimos com pasmo, incrédulos. Importa-me muito pela liberdade que reclama. Um texto denso e sem concessões. Uma poética negra, ascorosa, que revela à humanidade a fragilidade da sua própria ingenuidade ou hipocrisia.”

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Reinado Morais

Memórias de um sargento de milícias,  Manual Antônio de Almeida

Memórias póstumas de Brás Cubas,  Machado de Assis

Memórias sentimentais de João Miramar, Oswald de Andrade

Asfalto selvagem,  Nelson Rodrigues

O amanuense Belmiro, Ciro dos Anjos

Os três mosqueteiros, Alexandre Dumas

No caminho de Swann, Marcel Proust (O único volume que eu li da Recherche…)

O bravo soldado Schweik, Jaroslav Hasek

O jogo da amarelinha, Julio Cortázar

Cem anos de solidão, Gabriel Garcia Marque

Nossos colunistas:

Lincoln Secco

Satiricon, Petronius – Primeiro Romance. Antecipou uma forma burguesa por excelência e que só surgiria na época moderna. Obra inacabada que retrata artisticamente uma decadência e que ainda se lê como um livro atualíssimo. Encólpio, o seu amante e um servo, vivem entre o ciúme e as discussões. Dos fragmentos que restaram, nada é mais delicioso do que o Banquete de Trimalquião, perfeito retrato de um parvenu.

A Divina Comédia, Dante Alighieri – Se alguma obra atingiu a perfeição foi a Commedia dantesca. Poema matematicamente perfeito em terza rima. Uma viagem mística plena de humanidade. Quem leu não se esquece do amor impossível de Francesca da Rimini e Paolo Malatesta; de Ugolino e os filhos esfaimados; da grandiosidade de Farinata e Cavalcante, da lamentação de Dante ao ver que Virgilio não mais o acompanhava…

O Manifesto Comunista, Karl Marx – Manifesto é representativo da noção de práxis: exposição sumária do materialismo histórico, história-síntese, guia para a compreensão das contradições básicas da sociedade, programa para a ação, proposta de um “partido político” com dois postulados fundamentais: organização dos trabalhadores como classe e realização de uma revolução social para destruir violentamente a sociedade burguesa. Enfim, um documento histórico de divulgação da teoria comunista que pode ser lido e compreendido por qualquer pessoa interessada.

O Mediterrâneo, Fernand Braudel – O mais importante livro de história do século XX. Uma pintura da paisagem mediterrânica, uma descrição geográfica de rara beleza, uma análise do capitalismo nascente e, por fim, uma narrativa vibrante da história política do século XVI. Obra escrita durante vinte anos, pensada no Brasil, concluída num campo de concentração na Alemanha e, agora, com uma edição brasileira pela Edusp.

Da Guerra (Von Krieg), Carl Von Clausewitz – Clausewitz diz que há três elementos básicos da guerra: a violência cega e natural; o jogo das probabilidades e do acaso; e a política. É a tríade. Ao primeiro elemento corresponde o povo; ao segundo o comando militar; ao terceiro, o governo. Seu realismo foi para os séculos XIX e XX o que Maquiavel representa para nós ainda hoje.

Os Sertões, Euclides da Cunha – O intuito era a reportagem; o método era a ciência de sua época; a perspectiva a de condenar uma revolta monarquista. O resultado: um monumento literário, na linguagem; uma opção humanista, na conclusão.

Grande Sertão Veredas, Guimarães Rosa – Riobaldo é o homem dividido. A carta que Nhorinhá jamais recebeu teria mudado sua vida? O amor por Diadorim doeu em seu corpo. Zé Bebelo, em trânsito da guerra para a política é a “raposa que demorou”. Obra prima de oxímoros e significados em pleno fluxo de consciência.

O Guesa, Sousandrade – Por trinta  anos este poeta maranhense oitocentista desconhecido compôs treze cantos inspirados em uma lenda andina na qual um adolescente foge do sacrifício a que estava condenado. Ele foge para… Nova York, mas em Wall Street ele reencontra os sacerdotes disfarçados de investidores e especuladores da bolsa de valores. Como bons capitalistas, eles querem o seu sangue.

Macunaíma, Mário de Andrade – Romance, novela, rapsódia, interpretação do Brasil, ironia, preguiça, busca frenética da Amazônia à capital paulista, mistura de raças, esperança, pessimismo. Tudo isso num livro cuja leitura pode ser acompanhada de dois estudos magníficos: Roteiro de Macunaíma, por M. Cavalcanti Proença e A fortuna crítica de Macunaíma: primeira onda (1928-1936) de José de Paula Ramos. O anti-herói sem nenhum caráter expressa um país multicultural em diferentes estilos narrativos como a belíssima e irônica Carta pras Icamiabas.

Catatau, Paulo Leminsky – O Romance-ideia, hermético, poema-prosa, última grande experimentação da poesia (?) brasileira.

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Paulo Vasconcelos

O vento que arrasta –Selva Almada – Chaco Argentino, estrada. Súbito problema no carro, pai e filha fazem uma parada na oficina mecânica – Gringo, local onde se desenrolará  a trama. Conhecem o jovem ajudante Tapioca. O divino e o cotidiano e o imaginário, medeiam a vida dos personagens. A obra finca uma narrativa de beleza humana,  ao mesmo tempo realista, contundente, como não se via na literatura argentina, surpreendendo-nos com tamanha atualidade universal.

Eles eram muitos cavalos, Luiz Ruffato – Luiz Ruffato busca numa narrativa explosiva sintetizar algo não sintetizável,  por sua absurda complexidade: a cidade de São Paulo. São 69 episódios em que Ruffato usa de recursos formais para construir uma  narrativa de  caos e seus personagens comuns e incomuns,” gente habituada a ser coadjuvante em sua própria biografia”.

Becos da memória, Conceição Evaristo – Desmonte de favela em Belo Horizonte. A partir de então a autora faz aparecer um conjunto de personagens, com destaque para as mulheres, que se deslocam caregando consigo seus corpos e suas histórias. Uma síntese de um Brasil anÔnimo e gritante.

Vermelho Amargo, Bartolomeu Campos de Queirós

Desonra, J.M. Coetzee

Os Cus de Judas, Antonio Lobo Antunes

Geografia do Romance, Carlos Fuentes

Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra, Mia Couto

Casa de Papel, Carlos Mariá Dominguez

Poesia Completa Manoel de Barros – A obra contém toda sua produção até 2010, são vinte e um livros,em que o poeta fala dos deslimites da palavra, da medida que aciona uma poética do falar nacional, de seu imaginário e do canto da terra e seus convivas. É um elogio ao verso simples com um estardalhaço lírico pouco antes visto em nossa literatura.


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