Pela diversidade

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O músico em sua casa, em São Paulo. Foto: Luiza Sigulem

Seja com rock pesado, iê-iê-iê, pop ou música romântica, seja com elementos do samba, tropicalismo, punk ou da poesia concreta, Arnaldo Antunes construiu uma das carreiras mais consistentes e originais dentre os músicos brasileiros que despontaram na década de 1980. E isso fica claro, mais uma vez, em Disco, álbum que percorre novos caminhos e ao mesmo tempo dialoga com facetas construídas em cerca de 30 anos de estrada.

A diversidade presente nas 15 faixas do CD – que passa por diferentes ritmos, traz parceiros de diferentes gerações e tem formações instrumentais variadas – não faz de Disco um álbum sem unidade. Ao contrário, é a própria diversidade, conduzida pela poesia e a voz de Arnaldo e pela produção musical de Betão Aguiar e Gabriel Leite, que se torna a marca do novo trabalho.

O Fogo, por exemplo, escrita com João Donato, tem arranjo apenas de violão e piano, no mesmo clima intimista de faixas como Morro, Amor, composta com Caetano Veloso, e Acalanto pra Acordar. Muito, Muito Pouco, por outro lado, ganha peso não só na sonoridade roqueira, mas também na acidez da letra, que questiona  a sociedade contemporânea em suas contradições mais profundas: “Tem muito carro e muito pouco chão/Tem muito papo e muito pouca ação/Muito parente e muito pouco irmão/Muito pouca ideia e muita opinião/Muita pornografia e muito pouco tesão”. 

Sintonizado com o que há de novo na cena musical, Arnaldo apresenta parcerias ainda com Céu, em Trato, e com os paraenses Felipe Cordeiro e Luê, na faixa mais humorada e dançante do disco, Ela é Tarja Preta. O álbum traz também arranjos de cordas e metais escritos por Ruriá Duprat – sobrinho de Rogério Duprat, maestro da Tropicália. A coincidência familiar não é a única ligação com o movimento: Mamma, lançada por Gilberto Gil em 1971, entra como a única faixa em que Arnaldo não é autor ou coautor. O pé tribalista do paulistano, por sua vez, está presente em três parcerias com Marisa Monte. 

Sentido, composta com Nando Reis, soa menos como uma música da carreira solo de um dos dois autores e mais como um rock a la Titãs. Não é por acaso, já que a faixa foi escrita pouco após a morte de Marcelo Fromer, e conta com a bateria de Charles Gavin. Na letra, apenas um verso, forte e preciso como o disco de Arnaldo: “Se a vida não faz sentido, por que é que morrer haveria de fazer?”.

 

FALA, ARNALDO ANTUNES

Brasileiros – De onde vem o nome Disco?

Arnaldo Antunes – Rolou essa brincadeira de ir mostrando músicas na internet, enquanto o disco ainda estava em processo de feitura. A internet permite essa liberdade de mostrar algumas faixas sem ter um disco inteiro. Ao mesmo tempo, sou um pouco reativo a essa ideia de as pessoas só consumirem músicas soltas. Sou apegado à ideia de álbum, acho que tem um ritual de parar para ouvir um disco, o conceito que existe entre as faixas, e mesmo a sonoridade de um álbum em relação a outros do mesmo artista. Então, o título é um comentário com esse paradoxo, do que é um disco nos tempos da música digitalizada, aproveitando as vantagens e desvantagens disso. Eu não acho que o consumo de músicas soltas vai substituir a ideia de se fazer discos. Vão conviver, são só formas diferentes de ouvir música.

Brasileiros – Esse álbum traz com mais força temas políticos. Isso tem a ver com o contexto do País?

A.A. – É espontâneo. E, para mim, é até muito mais política a maneira como abordo as coisas do que se o assunto é esse ou aquele. Às vezes, falamos de uma relação afetiva e estamos dizendo aquilo de um jeito que torna a canção tão ou mais revolucionária do que outra que fala de uma questão social. O jeito de dizer as coisas é o que mais prezo no meu trabalho.

Brasileiros – Dos seus 30 anos de carreira, apenas dez foram nos Titãs, mas muita gente ainda se refere a você como “ex-Titã Arnaldo Antunes”. Isso incomoda?

A.A. –  Isso já me incomodou, ser o eterno ex-titã, mas não é mais assim. As pessoas conhecem cada vez meu trabalho solo. De qualquer forma, isso mostra o quão forte foi minha presença nos Titãs. Tenho um carinho grande por esse passado. Enfim, tenho o maior orgulho do que a gente fez junto.


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