De Piedade, no interior de São Paulo, onde foi criada, Marta Soares fez um extenso movimento até se tornar bailarina e coreógrafa. Filha de pai comerciante e político da cidade e mãe geógrafa, ela recebeu uma educação sem grandes incentivos para a arte. Mas quando alcançou a capital, em 1980, para fazer cursinho pré-vestibular, começou a fazer aulas com mestres da dança, entre eles Klauss Vianna e Ivaldo Bertazzo. Marta tinha 20 anos, tecnicamente uma idade avançada para os primeiros passos. Mas seguiu.
Foi estudar em Londres, no Laban Centre for Movement and Dance. Depois, voou para Nova York, onde passou por outras importantes escolas de dança e concluiu o curso de Artes no Empire State College na State University of New York. Mais adiante, partiu para o Japão para aprender dança butô no estúdio de ninguém menos que Kazuo Ohno. Para quem não sabe, o butô nasceu no Japão nos anos 1950 como resultado das confluências das culturas ocidental e oriental. De volta a São Paulo, Marta fez mestrado em Comunicação e Semiótica na PUC, com orientação de Christine Greiner, especialista nesse tipo de dança e também na cultura japonesa.
Dona de quatro prêmios APCA, Marta Soares, que também foi indicada, no ano passado, para os prêmios Shell e Aplauso, comemora agora seus 20 anos de palco, apresentando quatro de suas obras coreográficas, todas premiadas. Em Vestígios, ela surge soterrada em areia, até que um vento mecânico escava lentamente seu corpo, em uma referência aos rituais indígenas da região de Laguna, em Santa Catarina. Em movimento solo, Marta aparece nua dentro de uma banheira cheia de água em O Banho e é nesse espaço que ela executa seus movimentos, todos inspirados por fotografias de mulheres histéricas, feitas pelo cientista francês Jean-Martin Charcot no início do século passado. Para essa “instalação coreográfica” também investigou a vida de Sebastiana de Mello Freire, a dona Yayá, diagnosticada como doente mental e mantida reclusa por mais de 40 anos em sua própria casa, no bairro paulistano do Bexiga, hoje tombada pelo patrimônio histórico.
Outros dois espetáculos, Deslocamentos e Les Poupées, têm como foco o corpo humano. O primeiro apresenta corpos acoplados apenas pelo figurino que, ao se movimentarem, geram imagens de figuras híbridas: homem-mulher, dentro-fora. O segundo tem como ponto de partida o trabalho do artista alemão Hans Bellmer (1902-75), que montava, desmontava e remontava bonecas para, depois, fotografá-las. Na concepção da coreógrafa, Bellmer procurava, em sua obra, expor os mecanismos dos desejos humanos e é isso que a peça propõe.
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