Presidente precisa falar de coisas que existem

Quem te viu, quem te vê! O tí­­tulo da canção, escrita por Chico Buarque em 1967, cai como luva para definir o atual bom momento da Fundação Bienal e da Bienal de São Paulo que iniciam agora sua 31a edição. A Bienal de São Paulo é um dos maiores ativos culturais do País e o maior em termos de prestígio internacional. “Brinco que até a derrota contra a Alemanha por 7 a 1, havia duas instituições brasileiras mundialmente respeitadas há mais de 50 anos. Agora, existe apenas uma.” O depoimento bem-humorado de Luis Terepins, atual presidente da Fundação Bienal, sugere que, enfim, a casa está mesmo em ordem. Na ocasião desta entrevista, em meados de agosto, ele mal desconfiaria que às vésperas da abertura da mostra enfrentaria mais um desafio, uma crise de ordem política e diplomática envolvendo 55 artistas, entre eles, palestinos e libaneses, contrários à participação do governo de Israel como um dos apoiadores econômicos do evento. Apesar da surpresa, encarar dificuldades não é novidade para Terepins.

Braço financeiro da diretoria reunida por Heitor Martins – seu antecessor na Presidência até a transição do posto em fevereiro de 2013 –, a partir de 2009 Terepins passou a contribuir para a guinada de 180° empreendida pela instituição. Engenheiro civil e pós-graduado em Finanças, com experiência de quase três décadas em empresariado, o novo presidente da Fundação Bienal procurou imprimir à sua gestão um grau de profissionalismo, segundo ele, fundamental para a instituição ter dado a volta por cima. “Foi uma reconstrução bastante complicada. Do ponto de vista administrativo tínhamos de reorganizar a Fundação, pagar as contas, estabelecer uma interlocução com a sociedade e fazer acordos com o MinC, com os governos estadual e municipal.

Hoje, temos um estatuto de princípios, com missões, visões e valores, e um regimento interno que trata do dia a dia, das relações da diretoria com os comitês e das atribuições de cada um. A Fundação Bienal tem agora uma gestão moderna e enxuta.”

Outra evidência de que a eficácia de um melhor planejamento da Fundação Bienal reflete di­­­­­­­­re­­tamente nas ações programáticas da mostra é que neste ano o material de apoio do núcleo educacional ficou pronto em tempo recorde. Apresentado sempre às vésperas da abertura da Bienal, o material didático foi concluído em fevereiro último e resultou de workshops criados por Stela Barbieri – curadora do núcleo educativo desde a 29a mostra – e com a participação de 30 profissionais. “Trabalhamos com a ideia de ‘lentes’, que permearão o olhar para os projetos dos artistas. As lentes foram propostas pela curadoria geral e os principais conceitos foram coletividade, imaginação, conflito e transformação. A partir daí, fizemos pistas educativas, proposições para serem realizadas na rua e nas salas de aula. O material é composto por cartazes que tratam de alguns dos projetos e essas pistas educativas. Faremos também uma ação inovadora com ‘malas ateliês’, que estarão dispersas em meio à exposição. A visitação começará permeada por essa ação poética feita com 40 malas, dessas de rodinhas, de vários tipos e tamanhos, com proposições diferentes em cada uma”, esclarece Stela. Empenhados em ações itinerantes em diversos estados do País desde 2010, neste ano os quase 300 integrantes do núcleo educativo deverão receber a visita de cerca de 200 mil crianças e adolescentes.

Desenvolvida a partir do tema Como Falar de Coisas que Não Existem, a curadoria geral da 31a Bienal ficou a cargo do escocês Charles Esche que elencou 81 projetos, individuais e coletivos, e um total de mais de 250 trabalhos, muitos deles de artistas emergentes, escolhidos a partir das discussões regulares entre Esche e seu grupo de seis curadores associados, o francês Benjamin Seroussi, a brasileira Luiza Proença, os espanhóis Pablo Lafuente e Nuria Enguita Mayo, e os israelenses Galit Eilat e Oren Sagiv, este último responsável pelo projeto expográfico da mostra, um diferencial da nova edição, segundo Esche: “O prédio foi dividido em três grandes espaços, cada qual com uma atmosfera própria. Para atrair o público do parque, vamos tirar as catracas do térreo e deixar o piso aberto para a turma do skate, os casais de namorados, as crianças que jogam bola. Todos poderão entrar na Bienal (a visitação é gratuita), sem que isso seja um exercício formal. O térreo será tão livre quanto o parque. A lógica do prédio pede por isso e nossa responsabilidade é seduzir as pessoas. A melhor maneira de mudar as relações no mundo da arte é pela sedução. Pensamos na arte a ser exposta, mas ao mesmo tempo na arquitetura do prédio. Colocamos as duas variantes na mesma equação”.

Questionado sobre as escolhas de Esche e seus curadores, mesmo afirmando não ser esse seu papel, Terepins demonstrou satisfação: “Quando esse grupo foi anunciado, houve questionamentos, pois eles têm uma maneira diferente de enxergar a arte.

Dedicam-se a investigar produções fora do circuito, como as do Oriente Médio, do Leste Europeu e da Ásia. Tanto que decidiram viajar por todo o País e fizeram 23 encontros regionais para selecionar artistas locais. Achei genial a proposta de segmentação da Bienal em três grandes espaços ligados por um intermediário. Algo que reduz a dimensão gigantesca do prédio e da exposição e torna a visitação mais fluída. Esta será uma bienal instigante e provocativa”.

Nas próximas páginas, apresentamos um guia de serviço, a lista completa dos participantes da mostra e dez destaques selecionados por Leonor Amarante, editora da ARTE!Brasileiros.
Boa Bienal e ótimas descobertas!


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