A prisão truculenta do ex-ministro Guido Mantega é vista com grande preocupação por ativistas e acadêmicos. Para Carlos Botazzo, professor sênior da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, a ação da Polícia Federal envolvendo o ex-ministro seguiu o modelo daquelas feitas por militares nos anos de ditadura. “As prisões ocorriam em qualquer circunstância, independentemente de você não ser uma ameaça ou representar a possibilidade de destruir provas, mesmo não podendo fazer isso ou não tendo como se evadir”, descreve o pesquisador. A prisão de Mantega foi pedida em julho, aprovada em agosto e conduzida de maneira espetaculosa no final de setembro.
Na opinião do bioeticista Botazzo, a ação da Polícia Federal representa “um agravo importante à situação de vulnerabilidade da família do ex-ministro, especialmente de sua mulher, que faz tratamento contra o câncer. “O professor se refere ao conceito de vulnerabilidade em saúde, que, resumidamente, vê no adoecimento um processo que envolve fatores individuais, sociais e a existência de políticas públicas. O tratamento do câncer, por si só, é uma situação geradora de estresse e muita apreensão. “O modo como essa prisão se deu agrava a situação de fragilidade dessa família e da paciente. E é sabido que isso necessariamente aumenta as exigências da recuperação após um procedimento e do tratamento oncológico.”
Outro aspecto ressaltado pelo especialista é a necessidade de avaliar eticamente a natureza da justiça balizada pela atuação do Ministério Público Federal e do juiz Sérgio Moro, que pediu a prisão do ex-ministro: “Que justiça esperar quando a sua prática não é justa? Se fosse boa justiça, com boas práticas, essa prisão, depois revogada, teria sido desnecessária.”
O professor diz ainda que as declarações dadas pelas autoridades responsáveis pela prisão do ex-ministro despertaram inquietação. O procurador geral da República, Carlos Fernando dos Santos, disse que a prisão no hospital, durante a operação da esposa de Mantega, foi uma “infeliz coincidência”. Já o juiz Sérgio Moro argumentou que desconhecia o estado de saúde de Eliane Berger, mulher de Mantega. Nos dois casos, diz o professor, as falas expressam graves falhas. “É sabido que o ex-ministro não mora no Hospital Albert Einstein ou no Sírio-Libanês”, diz o professor. Na fala de Moro, o professor do departamento de Práticas em Saúde Pública vê o reconhecimento da falta de investigação. “Fica claro que é uma polícia que não investiga.”
Para ele, até mesmo quem está circulando ao redor do poder deve se perguntar se os abusos contra os direitos individuais e coletivos irão cessar ou avançar mais. “A sociedade está ameaçada de não ter mais garantias legais. Essa é uma questão colocada quando se está às portas de um regime discricionário.”
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