“Preparem suas almas, pois seus corpos já nos pertencem.” A frase dita por um coronel do BOPE no primeiro Tropa de Elite revela muito sobre a sequência do filme. Tropa de Elite 2, com previsão de estreia para dia 8 de outubro, promete provocar ainda mais polêmica.
Quando estiver correndo os olhos por estas linhas, provavelmente você já saberá que capitão Nascimento, personagem de Wagner Moura em Tropa de Elite, agora é coronel, vive em conflito com o filho adolescente e tem, nas milícias das favelas cariocas, um novo inimigo. Além de muito mais que nossa reportagem pôde apurar até aqui. O motivo: o filme mais aguardado do ano chega aos cinemas envolto em mistério graças a uma operação de segurança digna de segredo de estado.
Se o filme anterior, ganhador do Urso de Ouro no Festival de Berlim (2007) e dirigido por José Padilha, virou notícia e era assunto de cidadãos a caminho do trabalho, em bares e em filas de banco três meses antes da estreia, para a sequência, a produção tomou medidas rígidas a fim de evitar que o filme circulasse antes da data prevista. Uma cláusula contratual impede que os envolvidos no projeto revelem qualquer informação sobre o filme. Todo processo de pós-produção contou com um serviço de segurança formado por policiais selecionados por Rodrigo Pimentel, ex-capitão do BOPE, especialista em segurança e coautor do roteiro original do primeiro Tropa de Elite. Até a estreia, o filme ficaria em um cofre, e todas as cópias que seguem para os cinemas contariam com uma numeração que torna possível identificar em que estabelecimento foi feita a cópia pirata, caso venha a surgir uma.
Em entrevista à Brasileiros, o cineasta José Padilha justifica a ação, tendo como base uma pesquisa do IBOPE comprovando que, devido à pirataria, cerca de dois terços do lucro que poderia ter sido gerado pelo primeiro filme se perdeu. Padilha, que estreou no cinema como produtor de Tanga – Deu no New York Times (1987), dirigido por Henfil, acredita no bom cinema como veículo para o debate de questões pertinentes ao País. Essa característica já era visível em seu primeiro trabalho como diretor, Ônibus 174 (2002), e promete estar ainda mais evidente em Tropa de Elite 2. Agora, a trama salta do poder paralelo existente nas favelas cariocas para a esfera política com o propósito de discutir uma ameaça à segurança pública, talvez ainda maior que a dos traficantes: a das milícias que tomam de assalto os morros cariocas.
Brasileiros – O primeiro Tropa de Elite já entrou para a história do cinema brasileiro como um dos maiores fenômenos de nossa cinematografia. Quais os desafios de dar sequência a um filme com toda essa carga?
José Padilha – O principal desafio, em qualquer projeto de cinema, é o de fazer um bom filme. E no caso do Tropa 2, esse continua sendo o principal desafio, a despeito de o filme ser a sequência de um outro filme que funcionou. Além disso, há o desafio que motiva meus filmes em geral: o de comunicar de maneira interessante e inteligível algo que motive o debate em torno de questões que considero importantes para o Brasil.
Brasileiros – Testei o esquema de segurança para evitar que o filme vazasse no mercado pirata (veja quadro). Há quem defenda que, no caso do primeiro filme, a pirataria acabou funcionando como “marketing alternativo”. Você acha que o boca a boca gerado pelas cópias piratas de alguma forma ajudaram?
J.P. – Depois da pirataria ocorrida, contratamos o IBOPE, que mensurou que o filme perdeu cerca de dois terços de seu público. A pirataria, portanto, não funcionou como “marketing alternativo”, na medida em que a função do marketing é vender produtos. Vendemos menos por causa da pirataria. Com relação ao Tropa 2, montamos um esquema de segurança complexo, com o apoio da nossa coordenação de pós-produção e de um grupo de policiais apresentados a nós pelo Rodrigo Pimentel. Garanto que até o filme abrir, não vai haver pirataria não.
Brasileiros – Quando fizeram o primeiro Tropa de Elite, passou pela cabeça de vocês que poderia haver uma sequência?
J.P. – Não. Quando fiz Tropa de Elite, não sabia que as pessoas iam se relacionar com o filme da forma como se relacionaram e não sabia que o filme continha um personagem tão forte como o de Nascimento. A ideia da sequência veio depois, a partir de uma série de conversas com a equipe do primeiro filme, como o Bráulio Mantovani, o Wagner Moura e o Marcos Prado. Chegamos à conclusão de que Nascimento nos dava a chance de fazer um filme ainda mais importante que o primeiro.
Brasileiros – É possível imaginar um Tropa de Elite 3?
J.P. – Não. Quando assistir ao filme, você vai entender por quê.
Brasileiros – Sei que a questão das milícias é um dos temas do novo filme. Você costuma citar o deputado Marcelo Freixo em suas entrevistas e, inclusive, já declarou apoio à sua reeleição. De alguma forma, o trabalho dele no combate às milícias influenciou o roteiro?
J.P. – Influenciou, sim. Pesquisamos o filme na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, vendo todo o material de CPI das milícias, que o Marcelo comandou, e construímos um personagem que tem uma trajetória semelhante à dele, mas que não é ele, diga-se de passagem.
Brasileiros – Logo depois do sucesso do primeiro filme, circularam notícias sobre um seriado para TV, com base no longa. O que houve com esse projeto?
J.P. – Namorei um pouco esse projeto, mas depois percebi que em uma série de TV eu perderia o controle formal do processo e também levaria muito tempo para fazer, o que atrapalharia meus próximos projetos. Além disso, com Tropa 2 se encerra a história de Nascimento.
Brasileiros – Pelo jeito, você pretende manter o dedo firme nas feridas nacionais. Seu próximo filme irá se chamar Nunca Antes na História deste País e terá como tema o Mensalão. Dá para adiantar algo sobre esse projeto?
J.P. – Adianto que é um filme nunca antes feito na história deste País!
Brasileiros – A atriz Maria Ribeiro está no elenco das duas edições de Tropa de Elite. Sei que, além de primos, vocês têm uma relação de amizade e respeito profissional muito forte.
J.P. – Além de a Maria ser bonita, divertida e inteligente, ela tem uma personalidade muito forte, que não só a torna a atriz perfeita para fazer a mulher de Nascimento, como também a torna uma pessoa ainda mais interessante.
TROPA DE ELITE 2, 3, 4… Nos camelôs, filme já ganhou muitas sequências |
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“Pode falar o filme. Se eu não tiver aqui, passa amanhã que eu trago.” Diz seu Matias, em sua barraquinha de DVDs piratas no centro de São Paulo. Todos têm capinhas mal impressas, mas a satisfação é garantida. “Se não rodar ou a cópia não estiver boa, eu troco!”, afirma. Estima-se que cerca de 11 milhões de brasileiros assistiram ao primeiro Tropa de Eliteem cópias piratas.
Para impedir que Tropa de Elite 2vazasse, desta vez, a produção do filme montou uma verdadeira operação de segurança. Na edição do Fantástico, de 19 de setembro, o diretor José Padilha garantia: “No Tropa de Elite 2não vai ter pirataria!”. Aceitei o desafio e decidi testar. Após andanças infrutíferas por camelódromos da cidade, minha última esperança foi seu Matias. Pergunto: “Tem Tropa de Elite 2?”. E, para minha surpresa, ele responde: “Não só o 2, |
como o 3 e o 4!”, já tirando de uma sacola DVDs com a caveira do BOPE e numeração romana II, III e IV, como nos filmes do Rambo. A verdade é que o mercado pirata já havia transformado o fenômeno Tropa de Eliteem franquia muito antes de os produtores pensarem em uma sequência. Os filmes, no entanto, nada têm a ver com a saga do capitão Nascimento, como você vê abaixo.
Tropa de Elite II: Na verdade, trata-se do documentário Notícias de Uma Guerra Particular (1999), de João Moreira Salles. Tropa de Elite III: Nada além de uma colagem de imagens de operações do BOPE em favelas. Tropa de Elite IV: Nova forma que encontraram para chamar o drama Quase Dois Irmãos (2004), dirigido por Lúcia Murat. |
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