Antigamente – coisa de cinco anos atrás –, as emissoras a cabo, como National Geographic, Discovery e History, dedicavam-se a documentários. Eram produções bem-feitas e, muitas, superinteressantes. Sintonizava no National Geographic e assistia a uma aula sobre a formação das montanhas himalaias. No Discovery, a jogada era escavação no Egito. No History, bombava retrospecto de alguma batalha da Segunda Guerra Mundial. Mas, infelizmente, as médias de audiência mostravam que ninguém estava interessado nisso. Mudaram-se, então, grades e conteúdos.

Tentaram no National Geographic os festivais de caçadas. Era leopardo correndo atrás de antílopes, leões disputando naco de búfalo com jacarés e por aí ia o festim sangrento. No Discovery, descobriram que o público se amarrava em tubarões e tascaram filmes do bichão. E o History exibiu descrições detalhadas sobre manufatura de armas.

Em princípio, a mudança deu certo. Mas, após um tempo, o público cansou. Quem aguenta ver 200 perseguições de grupos de lobos? Aqueles que assistiram a um leão correndo e pegando uma zebra já viram tudo. Não importa se o gatão está na captura de um javali ou de um macaco. E quantas vezes o espectador aguentaria acompanhar o processo de fabricação de uma espingarda? Ou a biografia de certo tubarão branco?

O resultado é que as emissoras em questão estavam novamente com baixo Ibope. Perdiam feio para os canais que repisavam ad nauseam seriados enlatados, como Friends e até Bonanza. O negócio era apelar para o denominador ainda mais baixo na escala da inteligência humana. Foi aí que mergulharam nesse flagelo do início do Terceiro Milenium: o reality show.

Trata-se, como se sabe, de um freak show – um espetáculo de excentricidades. Não é só amontoar um bando de cretinos em uma casa e deixá-los em autoflagelação contínua para ver quem aguenta até o fim. Ou colocá-los em um sítio para cuidar de animais e tomar banho de chuveiro na frente do público. A coisa aqui nos States foi ao paroxismo da bizarria. Exemplo: o dia a dia dos negócios em uma loja de penhores em Las Vegas. Multidões tentando pendurar algum bagulho. Parte deles sai dali e diz que vai comer algo com a merreca que recebeu ou, então, colocar gasolina no carro. Na verdade, essa turma volta à jogatina, claro. E essa obra-prima nem é a pior. Tem mais de quatro programas em lojas de penhores. Um deles é na famigerada 8 Milles – a zona mais barra pesada de Detroit, que vem a ser a cidade grande mais caidaça dos EUA. O que se vê, então, é o funcionamento dos mecanismos do inferno.

As emissoras apelaram para shows temáticos absurdos. Tem gente em luta livre com jacaré no bayou da Louisiana. Toda semana tem finalização de crocodilo em refregas que colocam o UFC na lona. Outros, ensinam turistas como pescar peixes a unha. Por que diabos aquela gente não compra uma vara, linha e anzol? Ou, pelo menos, uma lança.

O que me fascina é o show American Pickers. Uma dupla que sai pelo vasto território continental dos Estados Unidos, procurando objetos que um dia foram fabricados no país. Mostram a qualidade da indústria de uma nação onde se fazia de tudo. Vale desde máquina de torrar amendoim, passando por placas de publicidade, até lamparinas. Está tudo enferrujado e amontoado nos quintais de figuras que parecem perdidas no tempo e espaço. O programa é, sem querer, um documentário sobre a decadência de um império. Não a toa é exibido no History.


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