Em 1965, a convite do dramaturgo Augusto Boal, um grupo formado por cinco jovens baianos veio a São Paulo protagonizar o espetáculo Arena Canta Bahia e caiu de paraquedas na ascendente metrópole, de pouco mais de 5 milhões de habitantes. Um deles chamou a atenção do crítico paulistano Augusto de Campos, que lhe dedicou um entusiasmado artigo, no jornal Correio da Manhã, intitulado Boa Palavra Sobre a Música Popular. Augusto estava convicto de que o jovem Caetano Veloso, então com 24 anos, personificava uma renovação da música popular brasileira. Caetano veio a São Paulo acompanhado da irmã Maria Bethânia, dos amigos Tom Zé e Gilberto Gil e da inseparável Maria da Graça, também chamada de Gau (assim mesmo, com “u”). As profecias de Augusto se confirmariam em tempo recorde. Em 1968, o “Grupo Baiano”, como ele classificou a trupe, deflagrou a revolução tropicalista com o álbum-manifesto Tropicália ou Panis et Circencis. Dissidente, Bethânia preferiu seguir rumo sozinha. A escolha fez com que uma canção composta para ela, que inclusive sugeriu o título, Baby, fosse registrada em Tropicália por Gau, que, por sugestão do empresário Guilherme Araújo, trocou o “u” pelo “l” e adotou o nome artístico Gal Costa. Recentemente, Gal anunciou que voltou a morar em São Paulo, onde fez uma emocionante apresentação da turnê de seu aclamado último álbum Recanto. Rouca e afônica, por conta de uma laringite, ela pediu desculpas à plateia, quando desafinou e perdeu o tom em Divino Maravilhoso. Mas o susto foi passageiro. Aquecida, a maior voz feminina do País, já estava, como diriam os amigos dos Novos Baianos, tinindo e trincando, na interpretação de Baby, de onde extraímos e adequamos a frase que dá título ao nosso roteiro-reportagem da sexta maior metrópole do mundo, que hoje tem quase 20 milhões de habitantes e só fez multiplicar os hábitos cosmopolitas narrados por Caetano. Inspirados por esse acontecimento – sim, Gal entre nós é um acontecimento – destacamos uma equipe de reportagem e flanamos pelo Centro, Norte, Sul, Leste e Oeste da cidade. Constatamos que, a despeito do relato amargo do rapper Criolo, sim, ainda existe muito amor em SP. Revelamos, aqui, em retratos e perfis, a história de 20 paulistanos, nascidos ou acolhidos pela cidade, e 20 opções de passeio, cultura, lazer e gastronomia que – parafraseando o imperativo de Caetano – “Você precisa conhecer, você precisa…” |
PORNOCHANCHADAS E UM NOIVADO Inaugurado em 2010, o bar Suíte Savallas presta homenagem ao ator Telly Savallas, morto em 1994. Além de reverenciar o careca – eternamente associado ao sedutor e malandro detetive obcecado por pirulitos, Theo Kojak –, a decoração do pequeno bar reforça o clima seventies. Dezenas de pôsteres de filmes B e pornochanchadas brasileiras, como 19 Mulheres e Um Homem e Bem Dotado – O Homem de Itu, estampam as paredes vermelhas do bar. Com atrações musicais, como a Roda de Rock, uma paródia das rodas de samba, clima acolhedor e discotecagem discreta, mas primorosa, o bar é uma ótima alternativa ao vizinho turbilhão do Baixo Augusta. É nesse ambiente que o casal Michelle e Washington trabalha desde a abertura da casa. Tradutor e professor de inglês, Washington teve algumas experiências como barman e trocou os alunos e textos burocráticos por uma rotina noturna atrás do balcão. Contrariando o conselho que recomenda não misturar relacionamentos amorosos e profissionais, Washington e Michelle – que é formada em Educação Física e também abandonou os alunos para trabalhar como garçonete, depois de graves lesões – são noivos e dividem a rotina com discrição. Vez ou outra, são assediados por clientes desavisados e divertem-se ao revelar que os amigos que trabalham na casa procuram sempre uma forma elegante de dar pistas e evitar confusão: “Ah, você pede para a Michelle, a noiva do Washington, por favor…”. SUÍTE SAVALAS Rua Mato Grosso, 398 – Higienópolis – 11 3259-4355. De quarta a sábado, a partir das 21 horas. |
ALICY NA CIDADE DO CAOS E DAS MARVILHAS Em meio ao caos da rua Augusta, uma pequena loja de antiguidades se transforma em balada ao cair da noite. Brasilidades, rock, soul, jazz e funk (claro, o original), saem das pick-ups e invadem o inusitado Caos. É lá que Alicy Genari Breda, de 21 anos, trabalha como garçonete e vende relíquias, muitas delas negociadas no período noturno, quando clientes mais ‘altos’ compram impulsivamente por afeto: “O namorado de uma cliente, apaixonada por caveiras, não a deixou comprar uma bem pequena, porque estava ‘alterada’. No dia seguinte, ela voltou cedo e disse: ‘Estou sóbria, vim buscar a caveira!’”. Alicy nasceu em Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul. Antes de vir para São Paulo, vivia em Araçatuba, onde estudou Turismo. Chegou em junho de 2011 e mora na Praça Roosevelt, no coração do Centro. Em uma tarde de agosto, subia e descia a Augusta, a procura de emprego. Foi contratada, de cara, pela gerente Dulce que “põe ordem” no Caos desde o primeiro dia da loja. Duas horas depois, já encarava o primeiro dia de trabalho. Solícita e eficiente, Alicy vem desvendando a arte de servir bem. Faz cursinho e quer prestar Física pela terceira vez. Entre os amigos de trabalho sente-se a “criança do bar”: “Não conheço quase ninguém em São Paulo e somos quase uma família. Por mais que você não goste daqui, se apega à cidade. Em meio a tantos prédios e concreto, há muita vida por aqui”. CAOS AUGUSTA Rua Augusta, 584 – 11 2339-0351. De terça a sábado, das 10 horas até o último cliente. |
A FEIJOADA DA ONÇA NO COPAN Projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, em 1951, o Edifício Copan é um marco da arquitetura moderna do País e um dos principais cartões-postais de São Paulo. Não por acaso, a imagem aérea que flagra sua impactante sinuosidade abre esse roteiro. Encomendado pela Companhia Pan-Americana de Hotéis e Turismo para se tornar um grande complexo hoteleiro, com teatro, cinema, restaurantes, lojas e garagens subterrâneas, o Copan foi inaugurado somente 15 anos depois e tornou-se um edifício residencial com 1.160 apartamentos. Uma pequena “cidade” com mais de 5 mil moradores, vizinhos de outro prédio histórico da cidade, o Edifício Itália. Do projeto comercial original do Copan restaram apenas as dezenas de lojas do térreo. Entre elas o charmoso restaurante Bar da Dona Onça, fundado em 2008 por Janaina Rueda, paulistana do Brás, que hoje vive no Centro. Com uma gastronomia que valoriza ingredientes do interior do Estado de São Paulo e uma equipe que conta com três barmen, 13 garçons e garçonetes, o Dona Onça vem ganhando cada vez mais admiradores e colecionando prêmios de melhor bar, concedidos por diversas publicações. Em 2010 e 2011, venceu, segundo o guia Melhor de São Paulo, da revista Época São Paulo, o disputado título de Melhor Feijoada da Cidade. BAR DA DONA ONÇA Avenida Ipiranga, 200 – Edifício Copan, lojas 27 e 29 – Centro – 11 3257-2016. De segunda a quarta, das 12 às 23 horas; de quinta a sábado, das 12 à 0 hora; aos domingos, das 12 às 17 horas. |
TONINHO, O REI DO PERNIL Há 30 anos, Seu Toninho serve clientes e repõe os pernis que recheiam o famoso lanche do Estadão, tradicional lanchonete do Viaduto 9 de Julho, que funciona sem parar desde 1968. Cearense de Iguatu, Antônio Alves de Moraes veio sozinho para São Paulo com 18 anos. Foi trabalhar no Estadão e casou-se, no mesmo ano, em 1981. Pela média de vendas da casa, já destrinchou mais de 360 mil peças de pernil. Em uma feliz analogia, Diego, parceiro de pauta, que clicou Toninho no estreito balcão, comentou:“É como dois maracanãs lotados de torcedores, cada um deles empunhando uma dianteira do suíno!”. Apaixonado pelo trabalho, Toninho mora na Zona Sul e formou uma família de mulheres, a companheira, duas filhas e duas netinhas, acostumadas a vê-lo trocar a noite pelo dia: “Amo esse lugar e amo trabalhar à noite. Aqui, vem todo o tipo de gente: empresário, vigilante, músico, jornalista, prostituta, político. O governador Alckmin volta e meia vem aqui. Já atendi o Luiz Gonzaga, o Raul Seixas. Dia desses, apareceu a Ana Maria Braga. O Jô Soares tinha um programa na Rádio Eldorado, que era aqui do lado, e não saía daqui”. O Estadão tem 75 funcionários acostumados a atender com agilidade e simpatia. A média de 250 peças semanais de pernis vem do Mercado Municipal desde a fundação da casa em 1968. O segredo do cultuado lanche? Toninho não revela, mas diz que o essencial é assar o pernil somente com sal refinado e, só depois, acrescentar outros temperos. ESTADÃO Viaduto 9 de Julho, 193 – 11 3257-7121. Aberto 24 horas, de segunda a domingo. |
UM ZAGUEIRO, ORQUÍDEAS E FHC Geraldo “Trisca” Neto, paulistano, 66 anos, nascido na Mooca, é uma autoridade em orquídeas. A paixão pelas flores de exuberante beleza, o levou a expedições na Mata Atlântica, ao Rodoanel Mário Covas e até a Genebra, na Suíça, como convidado de honra do Orchide 97, congresso internacional, realizado em 1997, que agregou orquidófilos dos cinco continentes. Trisca aposentou-se em 2001, mas não conseguiu se afastar das flores. Passou dez anos no Projeto Pomar, que provê soluções paisagísticas para as margens do Rio Tietê. Em 2011, foi convidado para ser o responsável pelo plantio e cultivo do Orquidário Ruth Cardoso. Instalado em um moderno viveiro, no Parque Villa-Lobos, o espaço presta homenagem à antropóloga e mulher do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, morta em 2008. Adolescente, morando na Água Funda, Trisca viveu dias de zagueirão, no vizinho time do clube do Instituto Botânico. Ordenava, aos berros, para os adversários “triscarem” (fugirem). Passou a ser chamado de Trisca e perdeu o nome. Seguindo conselhos do avô, Abel, Trisca ingressou de vez no Jardim Botânico, em 1965, onde trabalhou por 36 anos. Na inauguração do orquidário, intimidado com a presença de FHC, disse, de improviso: “Vou cuidar com zelo desse espaço para honrar a memória de sua esposa, presidente”. FHC deu nele um abraço e disse: “Obrigado, rapaz!”. Trisca revela, com um sorriso largo: “Aprovei o ‘rapaz’”. ORQUIDÁRIO RUTH CARDOSO Av. Professor Fonseca Rodrigues, 2001 – Alto de Pinheiros – 11 3023-0316. Diariamente, das 9 às 17 horas. |
A RESISTÊNCIA DO PAPEL Nesses tempos em que o papel perde cada vez mais espaço para a leitura em tablets e e-books, a jornalista paulistana Vera Julia Moraes Pereira Lima Matos, 56, é uma apaixonada por livros. Bisneta de Herculano Pires de Moraes, primeiro tradutor da Editora Melhoramentos, que deixou de herança para ela sua extensa biblioteca, Vera abriu o sebo Empório das Letras, com o marido, Otaviano Matos Filho, em 1990. Hoje, dirigem duas lojas. Uma no coração da Lapa, bairro de grande público flutuante, “quase um centro”, como atesta Vera, e a segundo no Brooklin, na Zona Sul. Otaviano é sociólogo, formado pela USP e chegou a assessorar o ex-presidente FHC. Vera foi funcionária do SESC, da TV Cultura, trabalhou para a Secretária de Cultura, na gestão do escritor Fernando Morais, durante o governo Quércia, e dirigiu oficinas culturais, iniciadas com uma primeira experiência em Itaquera, na Zona Leste, e depois replicada em outros bairros periféricos da cidade. Questionada sobre o que mais sai na loja, Vera deixa revelar uma constatação que parece óbvia: as listas dos mais vendidos em livrarias influenciam a compra da maioria de seus clientes. Sagas vampirescas também são os atuais best-sellers, no Empório das Letras, que além de ficção, livros técnicos, didáticos, revistas, graphic-novels e HQ’s, também tem milhares de LP’s com seletos títulos de jazz, rock, blues e música brasileira. EMPÓRIO DAS LETRAS Rua AntonioRaposo, 226 – Lapa – 11 3831-4899. De segunda a sábado, das 10 às 19 horas. |
A Nº 1 DO ATALA No final de abril, a revista inglesa Restaurant elegeu o restaurante D.O.M., do chef Alex Atala, o quarto melhor do mundo. Há sete anos, ele integra o San Pellegrino World’s Best Restaurant, prêmio criado pela revista e o mais prestigioso da gastronomia mundial. Defensor da culinária regional, como atestou em seu livro Por uma Gastronomia Brasileira (Bei, 2008), Atala alia modernas técnicas a tradições da culinária de estados, como o Amazonas e o Pará. Mas os segredos do carismático chef não residem apenas em fórmulas exóticas ou na valorização de produtos cultivados por pequenos agricultores e comunidades ribeirinhas. Seja no D.O.M. ou no Dalva e Dito, seu segundo restaurante, Atala lidera uma equipe de funcionários que preza pela excelência de seus conceitos. Maitre-sommelier das duas casas, a paulistana Gabriela Monteleone, 29, que desde maio de 2010 assina a coluna Bebidas, da Brasileiros, é um desses braços fortes do chef. Descendente de italianos, Gabriela cresceu observando tonéis de vinho sendo entregues e comercializados no armazém dos avós, na Avenida do Estado. Cursou hotelaria, mas migrou para o curso de gastronomia. Na reta final da graduação, estagiou em uma enoteca e a paixão pelos vinhos a fez voltar às origens familiares. Foi para a Itália, aprofundou os estudos e, pouco depois de voltar ao Brasil, integrou a equipe do premiado chef. A paixão pelos vinhos foi eternizada no próprio corpo. Gabriela ostenta uma parreira tatuada no braço direito e cachos de uvas nos dois punhos. D.O.M. RESTAURANTE Rua Barão de Capanema, 549 – Jardins. Informações e reservas pelo telefone: 11 3088-0761 |
André Millan carrega no DNA a paixão pelas artes visuais. É filho do antiquário e também galerista Fernando Millan que integrou a comissão da Exposição do IV Centenário da Cidade de São Paulo, atuou no MASP e na Bienal Internacional de Artes de São Paulo. Desde 1986, André dirige a Galeria Millan, importante espaço do mercado de arte contemporânea sediado em Pinheiros, na Zona Oeste. A região é prolífica em reunir importantes espaços expositivos, como as galerias Raquel Arnaud, Luisa Strina, Nara Roesler, Fortes Vilaça, Virgílio, Leme, a recém-inaugurada DOC e Imã – especializadas em fotografia –, o Instituto Tomie Ohtake e o Museu da Imagem do Som – MIS. Formado em História, assim que encerrou o bacharelado, Millan partiu para a França, onde cursou História da Arte. De volta ao Brasil, fundou a Galeria Millan, que representa alguns dos mais expressivos nomes de nossa produção contemporânea, como Dudi Maia Rosa, Artur Barrio, Lenora de Barros e Miguel Rio Branco. Millan continua a revelar nomes promissores e celebrados, como a paulistana Tatiana Blass e o mineiro, de Tiradentes, Thiago Rocha Pitta. GALERIA MILLAN Rua Fradique Coutinho, 1560 – Pinheiros. Confira a programação pelo telefone: 11 3031-6007 |
ROCK’NROLL E SONHOS EM UM DOMINGO NO PARQUE A poucos quilômetros da Marginal Tietê, o Horto Florestal ainda é segredo para muitos, mas é um lugar especial. Logo na entrada, em meio ao entra e sai dos portões, saguis fazem estripulias nas copas das árvores e anunciam um passeio encantador. Adiante, um extenso lago, repleto de marrecos, gansos, garças e tartarugas, enche os olhos. À direita da rota que leva às trilhas, ciclovias e áreas de piquenique, avista-se o Palácio de Verão, antiga residência de verão do governo do Estado, que hoje funciona como museu, aberto para visitação, de hora em hora. Ilhados em uma das margens do lago, avistamos um grupo de seis adolescentes que, nitidamente, formam uma banda de rock. O flagrante contrasta com a imagem de rebeldia atribuída à tribo de preto. Os quatro rapazes – o baixista Leon, o guitarrista Zena, o baterista Hito, e o guitarrista e vocalista Joni – formam a banda Proelio, do latim, que significa “batalha” em português, pois dizem se sentir “em constante batalha”. Gabriela, 16, ganhou a primeira câmera profissional e quer dedicar-se a fotografia. Nátalie, 17, namorada de Joni, concluiu o ensino médio e é roadie da banda. Os seis amigos vão ao Horto com frequência, mas este foi um domingo especial. Gabriela produziu fotos para a divulgação de um show, que aconteceria em três semanas. Rock’n’roll, reverência à natureza, paixões e sonhos, certamente, foram flagrados em seus primeiros cliques. HORTO FLORESTAL Rua do Horto, 931 – Tremembé – 11 2232-3117. De quarta a domingo, das 9 às 15 horas. |
MESTRE ALAMBIQUEIRO Cultuado restaurante e cachaçaria, fundado em 1974, o Mocotó tem levado cada vez mais paulistanos ao modesto bairro de Vila Medeiros. A casa começou servindo caldo de mocotó e revendendo produtos típicos do Nordeste, como carne seca, farinha de mandioca e rapadura, é tocada, hoje, por Rodrigo Oliveira, 30, filho do fundador, seu Zé Almeida, pernambucano que veio para São Paulo fugindo da seca. Mesmo aposentado, seu Zé ainda costuma dar as caras por lá, meter a mão na massa e espalhar sua simpatia entre os clientes e funcionários. Desde 1994, quando encerrou as atividades de empório, o Mocotó passou a atuar como restaurante, cada vez mais disputado, e apostou em requintes, como a contratação do sommelier decachaças, Leandro Batista da Silva, 31, responsável por selecionar e administrar um rico acervo de mais de 340 marcas de cachaça. Leandro, que diz preferir o título de mestre alambiqueiro, cresceu nas imediações do Jaçanã, bairro vizinho da Vila Medeiros, eternizado por Adoniran Barbosa em Trem das Onze, e confessa: experimentou o destilado aos 14 anos. Desde 2006, integra a equipe do Mocotó. É procurado por sommeliers dos mais renomados restaurantes do País, em busca dos segredos de sua excelência. Fez e continua a fazer expedições em busca de novos alambiques e potenciais fornecedores e aposta: “A cachaça ainda vai ser reconhecida como o mais rico e sofisticado destilado do mundo”. O MOCOTÓ Av. Nossa Senhora do Loreto, 1.100 – Vila Medeiros – 11 2951-3056. De segunda a sábado, das 12 às 23 horas; domingos e feriados, das 12 às 17 horas. |
VOO LIVRE NO CARANDIRU Instalado na extinta penitenciária do Carandiru,o Parque da Juventude agrega lazer e cultura e vem apagando da memória dos moradores da Zona Norte os dias sombrios daquele que foi um dos maiores complexos carcerários do País. O parque reúne quadras poliesportivas, que funcionam até a meia-noite, pistas de skate e a Biblioteca de São Paulo, um dinâmico espaço, informatizado e acessível, que recebe milhares de visitantes e comprova que a população, a despeito do que muitos dizem, tem grande interesse por cultura e informação. É no Parque da Juventude que, aos sábados e domingos, o comerciante Lúcio Alexandre Oliveira Santos, 37, encontra lazer para ele e a família. Lúcio nasceu e cresceu em Santana e ganha a vida comprando e vendendo sucatas. Vai ao parque com a mulher Mirela, 34, e os filhos Pedro, 5, Maria Eduarda, 4, e Maria Luiza, 3, para longas tardes de diversão, nos playgrounds, e também para andar de skate e praticar aeromodelismo. Despojado e criativo, ele conta que com parcos R$ 250,00, montou seu avião, rádio-controlado. Atrai dezenas de curiosos, encantados com as manobras que rasgam o céu azul da Zona Norte. “Tem muita gente que ainda acredita no estigma de que esse é um lugar com energia ruim. Acho isso uma grande bobagem, que nunca me incomodou. Penso exatamente o contrário: o parque só veio acrescentar lazer e cultura à Zona Norte”, comemora Lúcio. PARQUE DA JUVENTUDE Avenida Zachi Nacri, 1300 – 11 2251-2706. De segunda a domingo, das 6 às 18 horas. As quadras poliesportivas funcionam das 6 à meia-noite. |
UMA JOGADA DO ACASO A Zona Norte de São Paulo se estende até a Serra da Cantareira, reserva ecológica, onde, na divisa do município de Mairiporã, se concentra uma série de bares e restaurantes. Um deles, O Velhão, é um pequeno complexo liderado pelo tradicional restaurante, onde é possível encontrar doces e bebidas regionais, patchworks, objetos de decoração, fazer fotos usando figurinos de outras décadas, e até mesmo integrar uma verdadeira “Conspiração do Jogo”, nome dado pelas jovens irmãs Ursula e Beta Schnitz ao bar que abriram no segundo andar do Velhão há 12 anos. Ursula e Beta cresceram na Serra da Cantareira com mais quatro irmãos. Na infância, a diversão dos seis era garantida com os jogos comprados pelo pai, o alemão Gunter, dono de restaurante que, por alguns anos, teve um bar dentro do complexo do Velhão. As irmãs cresceram fascinadas com a rotina do pai e montaram o Conspiração do Jogo em 2000, inicialmente oferecendo mesas de bilhar e pebolim. Com os parcos clientes dos primeiros dias, as velhas caixas de jogos guardadas em casa começaram a ir para o bar, providenciais para furtivas jogatinas. Clientes, curiosos com o hábito, começaram a se interessar pelos jogos. Hoje, como constatamos no domingo em que Beta estava de folga, o bar reúne dezenas de jogadores apaixonados. Adolescentes, jovens e até duas senhoras, que jogavam Ludo, enchiam o Conspiração. O passatempo virou coisa séria para as irmãs Schnitz. CONSPIRAÇÃO DO JOGO Estrada Santa Inês, 3000 – Jardim das Samambaias – 11 4485-4194. De quarta e quinta-feira, das 17 à 0 hora; sextas e sábados, das 18 às 4 horas; domingos, das 14 à 0 hora. |
POESIA TRANSALTÂNTICA O bom bibliotecário pode atender 500 visitantes por dia, mas se deixar de cuidar bem de apenas um, vai para casa com a impressão de que não atendeu ninguém.” A confissão do paulistano, da Mooca, Odenir Vinhato, 42, é seguida de uma história divisora para ele. Em um dia ordinário, um senhor perguntou se havia ali alguma espécie de sarau ou concurso de poesia. Odenir disse que não e o velho partiu. Depois, ficou intrigado: “Mas por que ele quis saber isso? Seria ele um poeta?”. Decidiu reparar a “falha imperdoável” criando um concurso. A primeira edição, em 2007, não foi o que pode ser considerado um sucesso retumbante, mas na base do boca a boca, poetas locais se revelaram, a banca de jurados foi crescendo e, em 2010, centenas de inscrições chegavam via internet de todo o Brasil e, até do outro lado do Atlântico, de Portugal. Odenir foi condecorado pela iniciativa. A biblioteca pública onde ele trabalha, completará 60 anos em julho. Reúne literatura brasileira e estrangeira, livros didáticos, um núcleo musical, que oferece um pequeno acervo de livros de pesquisa, e réplicas digitais de boa parte da discoteca do Centro Cultural São Paulo. Entre desenhos doados pelo artista Paulo Von Poser, o compositor Itamar Assumpção, vizinho ilustre do bairro da Penha, surge estampado em duas paredes da biblioteca que, para a alegria de Odenir, artista plástico nas horas vagas, presta homenagem ao jornalista e poeta, paulista, Cassiano Ricardo. BIBLIOTECA PÚBLICA CASSIANO RICARDO Av. Celso Garcia, 4.200 – Tatuapé – 11 2092-4570. De segunda a sexta-feira, das 10 às 19 horas; sábados, das 9 às 19 horas. |
32 ANOS NO “PAI DOS BOTECOS” Fundado em 1959, quando o neto de italianos, Elídio Raimondi, recuperou o ponto comercial que era do pai, o clássico bar da Mooca que leva seu nome, é um marco da boêmia paulistana. Inspirou sucessivos botecos que surgiriam na cidade e ganhou fama por oferecer uma sortida bancada, com mais de 80 tira-gostos. Elídio também fez de seu bar um reduto de amantes do futebol. Em suas paredes estão expostas mais de 40 camisetas autografadas por craques. Algumas delas pelo Rei Pelé, obtidas quando Elídio visitava o ilustre amigo, na Vila Belmiro, a despeito de ser um apaixonado são-paulino. Elídio morreu no dia 2 de maio, aos 76 anos. As filhas Celeste, Suzete e Solange, garantiram: manterão vivo o legado do pai. “Com 32 anos aqui, convivi mais com ele do que com minhaprópria família”, confessa, emocionado, o garçom e amigo Antônio Alves Cavalcante, um cearense de 49 anos, que encontrou no bar de Elídio a página em branco que registrou sua feliz história em São Paulo, iniciada em 1980. Logo que chegou, Antônio foi morar na Mooca e encontrou uma oportunidade de trabalho no Elídio. Jamais tirou os pés do bairro e do bar. Casou-se com a dona de casa Elenita, e teve duas filhas, a advogada Helenice, 29, e a estudante de moda, Elaine, 26. Viu passar pelo bar craques como Rivelino, Carbono e Ademir da Guia. Astuto, diz não pegar bem revelar o time do coração, para a clientela, mas para a reportagem da Brasileiros, confessou: é corintiano roxo. ELÍDIO BAR Rua Isabel Dias, 57 – Mooca – 11 2601-1343. Terça, das 17 à 0 hora; quarta, das 12 à 0 hora; de quinta a domingo, das 17 à 0 hora. |
O ZELADOR DE 11 IBIRAPUERAS O Parque Ecológico do Tietê ocupa uma área de 12 milhões de km² de várzea do Rio Tietê. Equivale a 11 parques do Ibirapuera e oferece trilhas para caminhada, passeios de bicicleta, quadras poliesportivas, represa com pedalinhos, pista de bicicross, complexo aquático, pista olímpica gramada, academia esportiva e 17 campos de futebol, que acolhem mais de 140 times de várzea. Fundado em 1982, o parque abre gratuitamente todos os dias e é dirigido por profissionais nomeados pelo DAEE – Departamento de Águas e Energia Elétrica, administrador do espaço. A gigante área verde, com mais de 150 espécies nativas, é dirigida pelo arquiteto, urbanista e ferroviário Edson Cândido. Ex-funcionário da CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, onde atuou por 33 anos, Edson foi nomeado pelo DAEE em julho de 2011. Enérgico, como um bom zelador, ele tem feito pequenas revoluções no parque. A começar pela aparência. Onde antes havia muito cinza, uma profusão de cores ganhou vida. Com o simples ajuste da vasão de torneiras e chuveiros, economizará mais de 6 milhões de litros de água em 2012. Transformou galões vazios em lixeiras, onde o usuário é obrigado a vedar o lixo que dispensa, e afastou quatis da nociva alimentação humana. Dia desses, recebeu a visita de policiais à procura do diretor. Na cabine do trator, aparando grama do parque, ouviu o seguinte comentário: “Poxa, mas, quando viemos aqui, o diretor usava paletó e gravata e estava na sala dele, não em cima de um trator!”. PARQUE ECOLÓGICO DO TIETÊ Av. Dr. Assis Ribeiro, altura do no 3000 – Penha – 11 2958-1477. De segunda a domingo, das 8 às 17 horas. |
O PANETONE MAIS ANTIGO DE SÃO PAULO A saga dos Di Cunto em São Paulo faz lembrar o roteiro de um desses filmes com histórias de superação. Teve início no final do século 19, quando Donato Di Cunto, um jovem do sul da Itália, veio para o Brasil, aos 17 anos. Por recomendação da mãe, que vivia dias difíceis, o garoto viajou sozinho para encontrar um tio que morava em Montevidéu, no Uruguai. Mas o acaso pregou uma enorme peça em Donato. Nos 60 dias de travessia do Atlântico, as precárias condições de higiene do navio forçaram uma ancoragem em Recife. Orientado a descer na terceira parada, Donato se confundiu, não acrescentou Pernamubo a sua contagem e imaginou estar em Montevidéu quando desceu em terra firme, no litoral santista. Se deu conta do erro e o navio já havia partido. Mas a garra do adolescente abriria amplos horizontes. Pouco antes de partir da Itália, havia feito um curso de carpintaria e foi trabalhar na construção civil. Em pouco tempo, na capital, liderou uma equipe de carpinteiros do arquiteto Ramos de Azevedo. Fez seu pé-de-meia e, em 1896, abriu uma das primeiras padarias de São Paulo. Desde então, sucessivas gerações vem tocando os negócios dos Di Cunto, como comprova o bisneto, Marco Alfredo Di Cunto Jr., formado em Publicidade e Propraganda e responsável pelo marketing da empresa, que orgulhoso narra essa bela história diante do retrato de Donato, o “guardião” da casa que ignora a sazonalidade natalina e serve diariamente, há 76 anos, o mais antigo panetone comercializado em São Paulo. DI CUNTO Rua Borges de Figueiredo, 61/103 – Mooca – 11 6292-7522. Segundas, das 12 às 19 horas; de terça a sábado, das 9 às 19 horas; domingos, das 8h30 às 17 horas. |
GOLFE PARA TODOS O golfe existe há mais de 500 anos. Registros históricos revelam que ele foi, inicialmente, praticado naInglaterra, na Escócia e na Itália, masé impossível precisar sua origem. O esporte integrou os jogos Olímpicos de 1900 e 1904 e voltará à Olimpíada no Brasil, em 2016, País onde ainda carrega o estigma de ser um esporte para poucos. Nos EstadosUnidos, o golfe mobiliza 30 milhões de praticantes. No Brasil, são 25 mil jogadores. É nesse universo de grandes desafios que Kiko Pádua Soares, 53, professor da FPG – Federação Paulista de Golfe, vem atuando há mais de 40 anos. A paixão surgiu na infância, quando acompanhava o pai, Augusto de Pádua Soares, ex-presidente da FPG, que jogou até os 82 anos. Kiko orienta usuários em busca de prática recreativa, de 5 a 80 anos, em um campo de 21 mil m², com acesso gratuito e custo de R$ 15,00 para jogar 50 bolas: “Quando comecei não existiam bate-bolas, nem local de treinamento. Democratizar o acesso será fundamental para popularizar o esporte”, enfatiza Kiko, de olho na Olimpíada de 2016. FPG – GOLFCENTER Rua Dep. João Bravo Caldeira, 273 – Jardim Ceci – 11 5070-5844. Segundas, das 14 às 22 horas; de terça à sexta, das 7 às 22 horas; sábados, domingos e feriados, das 7 às 20 horas. |
O BRAÇO DIREITO DA RAINHA DOS PETISCOS O forte acento lusitano que surge do outro lado da linha delata que a ligação foi atendida por Norberto Pires, português que, desde 1957, conduz, ao lado do primo, Alberto Pousa, o tradicional A Juriti. Dispensando falsa modéstia, a cinquentenária casa – célebre pela rã à dorê, a codorna alho e óleo, o bolinho de bacalhau, e a Joana D’Arc, um espeto de linguiça, assado em fogareiro a álcool – autointitulada “A Rainha dos Petiscos”. É mesmo um lugar único. O amplo salão preserva o mesmo ambiente do final dos anos 1950. Mas nossa intenção não é desvendar a rotina de Norberto e, sim, de seu vizinho de balcão e dedicado servo da Rainha, o barman Ramiro Novaes Luiz, 42. Baiano da Chapada Diamantina, Ramiro veio para São Paulo, em 1986. Quatro anos depois, foi parar no bar dos primos lusitanos. Tornou-se amigo leal dos patrões e querido pelos clientes. Casado e pai de três filhos, transmite, na cadência pausada da voz, a serenidade de suas origens. Apegado à natureza, Ramiro vive com a família em Embu das Artes, município vizinho de São Paulo, onde o artesanato ainda é uma importante forma de renda e a natureza respeitada e preservada. Ramiro conta que não mede esforços e enfrenta quatro horas diárias de transporte público para servir bem e servir sempre no A Juriti. Ficou mudo, por longos segundos, quando perguntei como era a vida na Chapada para, depois, afirmar que era “ótima, mas precisava ganhar a vida”. Não por acaso, diz encontrar “sossego” em Embu das Artes. A JURITI Av. Lins de Vasconcelos, 1048 – Vila Mariana – 11 3207-3908. De terça a sábado, das 8 à 0 hora; domingos e feriados, das 8 às 16 horas. |
A EMBAIXADA DA LINGUIÇA Contrariando a máxima “amizade é amizade, negócios à parte”, a história do Legítimo, inaugurado em 2009, é sobretudo um exemplo de como grandes amigos podem protagonizar casos exemplares de sucesso comercial. Fundado pelos advogados Deuvequiu Jerônimo e Edson Bezerra, o bar, que aposta no conceito boteco chic, oferece 18 diferentes tipos de linguiças provenientes de Bragança Paulista, algumas, customizadas especialmente para a casa. A escolha do fornecedor, naturalmente não revelado, demandou visitas frequentes a Bragança, considerada a “capital da linguiça” em São Paulo. Logo, a aposta de que o cardápio sortido faria sucesso foi confirmada com números que quadruplicaram a expectativa dos sócios. A estimativa mensal de venda de 200 kg, em pouco tempo superou a casa dos 800 kg e o fornecedor passou a atender o Legítimo com exclusividade. Deuvequiu veio do interior de São Paulo para estudar Direito e conheceu Edson, seu primeiro amigo na capital, em sala de aula. Ao longo de 10 anos, os dois sonharam em montar um negócio juntos e foram tocando suas carreiras profissionais. Aprovados pela OAB, Deuvequiu hesitou em abandonar a carreira de bancário, onde ainda atua como gerente de grandes contas jurídicas, e Edson advogou para grandes empresas, como a Casas Bahia, até assumir o comando do bar, que ganhou o nome Legítimo, por significar, no âmbito do direito, um estabelecimento lícito, e ao mesmo tempo denotar autenticidade. LEGÍTIMO BAR Rua Luís Góes, 1728 – Mirandopólis – 11 2799-2730. De terça a sexta-feira, das 17 à 1 hora; sábados, das 12 à 1 hora; domingos, das 15 às 23 horas. |
O BARQUEIRO DA BILLINGS A Zona Sul de São Paulo é banhada por duas grandes represas: a Guarapiranga e a Billings. Repleta de bares e restaurantes em seu entorno, a Guarapiranga, que tem intensa vida noturna, propicia a prática de esportes de vela e, aos finais de semana, se transforma em uma verdadeira praia para as comunidades dos bairros periféricos vizinhos a ela. A Billings se estende por municípios do ABC, como Santo André, São Bernardo do Campo e Ribeirão Pires, é um dos maiores reservatórios de água da região metropolitana de São Paulo. É nela que, há 22 anos, o artista plástico e ex-publicitário, Jackson Bergamo mantém uma escola de construção naval e ministra cursos de fabricação de barcos de madeira à vela. Filho de nadadores, Jackson foi um dos primeiros surfistas da baixada santista, chegou a integrar uma equipe amadora, e viveu em contato com o mar. A paixão pelas embarcações começou em 1970, quando ele comprou seu primeiro barco de madeira. Indignado com a dificuldade de encontrar alguém para reformá-lo, ele começou a pesquisar publicações estrangeiras para literalmente saber com quantos se paus faz um barco e tocou ele mesmo a reforma do seu. Hoje, acumula 42 anos de experiência, detém um acervo com mais de 300 títulos, e foi nomeado pela Marinha do Brasil, Mestre-Amador. Jackson divide seu amplo conhecimento com alunos, aspirantes a construtores, e apaixonados por embarcações. CURSO DE CONSTRUÇÃO NAVAL Represa Billings – São Bernardo do Campo. Informações sobre o curso: 11 5564-4554. |
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