Neste ano bissexto em que completaria 100 anos – no dia 10 de agosto – a Bahia e o Brasil se movimentam para homenagear o escritor Jorge Amado. Para que se tenha ideia de sua importância, a ele é atribuída a invenção da Bahia tal qual a conhecemos, bem antes de Caetano e Gil, Antonio Carlos Magalhães e Ivete Sangalo. Um País cheio de morenas saborosas, pescadores, vendedoras de acarajé e candomblé, musicado por Dorival Caymmi e desenhado por Carybé e Di Cavalcanti (este, um carioca, inventor da mulata), todos seus amigos e companheiros. Quem nunca usou uma fitinha de Nosso Senhor do Bonfim no pulso nem sequer sonhou.

A comemoração é um assunto tão sério que, desde o ano passado, passou a funcionar uma Comissão do Centenário, capitaneada por Cecília Amado e João Jorge Amado Filho, netos do escritor, envolvendo entre outras entidades a Fundação Casa de Jorge Amado, que funciona no Pelourinho, em Salvador, a Academia Brasileira de Letras, onde ingressou em 1961, e a editora Companhia das Letras, que publica seus livros desde 2008. O baiano vai sacudir o Carnaval sendo, ao mesmo tempo, tema da escola de samba carioca Imperatriz Leopoldinense e do Carnaval de Salvador. Inclusive os camarotes do circuito soteropolitano Barra-Ondina obedecerão o padrão País do Carnaval, título do primeiro livro que escreveu, aos 19 anos.

Jorge Amado começou tudo cedo. Dois anos após a publicação de estreia, casou-se com Matilde Garcia Rosa, de quem se separou em 1944 e com quem teve uma filha, Eulália, morta aos 15 anos. Comunista desde cedo, conheceu sua segunda mulher, seu grande amor, Zélia Gattai (1916-2008), durante um dos comícios pela libertação de Luiz Carlos Prestes. Jorge era um grande missivista. Deixou mais de cem mil páginas de cartas que estão sendo catalogadas pela Fundação Casa de Jorge Amado. Em agosto próximo, as cartas que trocou com sua amada serão publicadas pela Companhia – Jorge & Zélia, Correspondência Inédita. Entre outros lançamentos, a editora já colocou na rua uma caixa comemorativa com as mulheres-personagens de Jorge Amado, contendo os livros Tieta do Agreste, Gabriela, Cravo e Canela, e Tereza Batista Cansada de Guerra.

Essas mulheres voluptuosas tornaram-se cartão de visita para atrizes como Betty Faria e Sonia Braga, povoaram a imaginação de milhões de leitores e deram muitas alegrias para o próprio Amado. Sua famosa casa em Salvador foi comprada no início dos anos 1960 com o dinheiro obtido com a venda de Gabriela para Hollywood. O local é cercado de histórias. Uma delas, exclusiva, diz respeito a Naná Vasconcelos. No princípio dos anos 1970, já consagrado no exterior, o percussionista pernambucano ia muito nessa casa do escritor, que adorava vê-lo tocar chamando-o de “gênio”. Como Naná não conseguia ser recebido nas gravadoras de seu País, Jorge pegou o telefone e ligou diretamente para o poderoso André Midani, então na Philips. Um mês depois, o disco Amazonas chegava às lojas.

O fato é que o endereço ficou tão conhecido que os Amado resolveram manter um apartamento no Marais, bairro parisiense – adiantando-se a Chico Buarque!

Para completar as festividades que envolvem entre outras atividades cursos, peças, relançamentos de livros, como Navegação de Cabotagem, suas memórias publicadas em 1992 e agora em edição ilustrada, o filme Capitães de Areia e a exposição Jorge, Amado e Universal são a cereja do bolo. Dirigido pela neta, Camila, Capitães, livro de 1937, trata dos meninos de rua de Salvador naquela década. Profético e socialista até a medula, como o autor seria até morrer, em 2001 – o comunismo, que também “abraçou cedo”, abandonou em 1955 após uma militância notável. A exposição deverá ser inaugurada no Museu da Língua Portuguesa em São Paulo no mês de março, chegando a Salvador em seu aniversário, instalando-se no Museu de Arte da Bahia.

Universal. E Amado. Traduzidos em meia centena de países, seus livros venderam mais de 200 milhões de cópias. Salve, Jorge!

 


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