Meu caro, poucas nações conseguem reunir tanta história, tanta cultura, e tanta hipocrisia, como a Itália. Lá nasceram os dois Michelangelos, o Buonarotti e o Merisi, e Leonardo da Vinci. O três eram homossexuais. Os papas são eleitos sob os afrescos de Buonarotti. Ele tirou do mármore o deslumbrante Davi, pelo qual se apaixonou, e quase não o entregou à cidade de Florença, que o encomendara. Mais tarde, caiu de amores pelo nobre italiano Tommaso Cavalieri, que o acompanhou até seu leito de morte.
O segundo, conhecido como Caravaggio, revolucionou a pintura renascentista criando a técnica do claro-escuro, e pintou marcos renascentistas como Martírio de São Mateus e o insinuante Baco. Aprontava todas nos submundos, chegou a matar um homem. Leonardo viveu anos com um de seus pupilos, Giacomo Salaï, a quem, dizem, chegou a legar a Monalisa após sua morte.
Estes homens viveram nos séculos 14 e 15. Antes deles, no século 2 a.C., viveu o Imperador Adriano, homossexual notório, apaixonado pelo jovem Antonino, mas casado por conveniência política. O cineasta Luchino Visconti também era. Algum desses homens fica menor quando revelada sua orientação sexual?
Mas é na Itália que fica a sede da Igreja Católica e, portanto, mesmo depois de muitos séculos, homossexualidade é tabu, a ponto de não ser mencionada. Não é à toa que foi sob o silêncio católico se organizou a máfia. Lá foi morto o papa João Paulo I, e que se calem sobre isso.
Há poucos dias morreu o maravilhoso compositor Lucio Dalla, autor de sucessos como Caruso e Caro Amico Ti Scrivo. A Igreja Católica impôs silêncio sobre sua sexualidade, e seu companheiro por mais de dez anos, Marco Alemanno, não pôde mencionar o assunto. Mas a jornalista Lucia Annunziata, prestigiadíssima, tirou-o do armário, com toda a dignidade. Ele merecia.
O maravilhoso padre James Alison, no livro Fé, Alêm do Ressentimento, mostra a perfeita compatibilidade entre catolicismo e homossexualidade. Dezenas de padres e monsenhores são homossexuais, isso é público e notório. Mas a Igreja de Ratzinger, que defendeu pedófilos, prefere assim. Hipocrisia mata pessoas e reputações. É desumana, mas católica. Até quando?
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