Quando a diretora artística adjunta da São Paulo Companhia de Dança, Inês Bogéa, terminou de falar sobre a história do balé russo e de explicar um pouco do ensaio da peça de balé Les Noces (As Bodas), da coreógrafa russa Bronislava Nijinska, a que tínhamos assistido, ninguém esperava o que estava por vir. “Agora vamos dançar um pouquinho”, ela disse. O pânico foi geral. Todos se entreolharam com uma mesma expressão: “Como me safo dessa?”. Já acostumada com situações como essa, Inês tentou restabelecer a calma. Aos poucos, fomos aceitando a proposta.

Abrimos uma grande roda e acabamos montando uma pequena coreografia com movimentos inventados na hora. No final, estávamos todos pulando, girando e rolando no chão, como se tudo aquilo fosse muito natural. O que pareceu uma grande brincadeira, na realidade faz parte de um amplo projeto criado pela São Paulo Companhia de Dança com o objetivo de tornar a dança uma arte mais popular, principalmente entre os jovens em formação.

Sentir para conhecer
Criada em janeiro de 2008, a Companhia dividiu o seu projeto em três linhas principais: a formação de platéia, com o Corpo-a-Corpo; a difusão e memória da dança, com o Figuras da Dança e o Canteiros de Obras, e os espetáculos em si. “Quando eu e a Iracity (Cardoso, diretora artística da Companhia) fomos convidadas pelo secretário de Cultura João Sayad para pensar em uma companhia de dança que representasse em alguma medida a cidade de São Paulo, achamos que somente os espetáculos não teriam tanta aproximação e diálogo com o público variado, além dos interessados por dança. Por isso, estruturamos o projeto nessas três linhas de ação”, explica Inês.
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O Corpo-a-Corpo visa atingir professores e estudantes em espetáculos abertos. “Pretendemos dar alguma formação sobre a dança, algo que os estudantes ainda não têm. Com ele, acabamos por desmistificá-la e, assim, formamos um público com informação suficiente para assistir ao espetáculo. Quanto mais o jovem tiver ferramentas e conhecimentos para entender o que está vendo, maior será o interesse em assistir aos espetáculos de dança”, diz Iracity Cardoso.

O trabalho com os professores é feito na própria sede da Companhia. Eles assistem a uma palestra com Inês, que explica quais são as peças que serão dançadas no próximo espetáculo, acompanham o ensaio dos bailarinos e fazem um exercício de dança. “Eu faço todo mundo dançar. Acredito que para ver a dança é preciso se predispor a colocar o corpo em movimento”, diz Inês. Já com os estudantes, o trabalho acontece no próprio teatro onde a Companhia fará a apresentação. Eles assistem ao ensaio e assim conseguem entender melhor a criação de um espetáculo. Alguns são chamados para subir ao palco e dançar com os bailarinos, enquanto a platéia segue os movimentos propostos pelo coreógrafo. Até o folder distribuído para os alunos, com desenhos, fotos e textos dinâmicos, é pensado para atrair o público jovem para a leitura sobre a peça em questão. A terceira atividade da formação de platéia é o espetáculo aberto. Quando a Companhia está prestes a entrar em cartaz, faz uma apresentação para adolescentes, totalmente gratuita. “Os projetos são voltados para que a população seja beneficiada, tanto na capital quanto no interior. Cerca de 1.600 estudantes já vieram assistir ao espetáculo Les Noces, por exemplo”, contabiliza Iracity.

A diretora explica que, desde o esboço do projeto da Companhia, o Corpo-a-Corpo e o Figuras da Dança já tinham sido pensados. Mas, algumas idéias nasceram depois. “Existem algumas coisas que foram acrescentadas ao projeto depois, como a circulação do espetáculo. É muito importante dividir esse trabalho com as cidades do interior, afinal é uma companhia do Estado. O mais interessante, é que levamos o projeto todo, as palestras com os professores e alunos e o ensaio aberto para os jovens.”

A história da dança
“Quem é que faz a história da dança se não os seus artistas?”, indaga-se Inês. Foi pensando em ouvir grandes bailarinos, coreógrafos e professores de balé, como forma de resgatar a história dessa arte, que a Companhia criou o Figuras da Dança. Na série de depoimentos públicos, aberto pela bailarina e coreógrafa Ivonice Satie, em 8 de abril, a “figura” escolhida conta a sua história no mundo da dança, que é ilustrada por fotos e vídeos do artista. Além de assistir ao vivo a palestra, o público poderá acompanhá-la pela TV Cultura.

No Canteiros de Obras, que também faz parte da difusão e memória da dança, a própria história da São Paulo Companhia de Dança é mostrada ao público por meio de vídeos. “São três vídeos que contam a formação da companhia, da criação à boca de cena. Só ensaio, sem espetáculo. Isso também tem um pouco da idéia de revelar o processo de trabalho, o dia-a-dia do bailarino”, explica Inês. O último, mas não menos importante projeto da Companhia, é também o seu carro-chefe: o espetáculo. Inês esclarece que esse é o ponto de partida que impulsiona todas as outras atividades. Em sua primeira apresentação, os bailarinos levaram ao palco a peça Polígono, do coreógrafo italiano Alessio Silvestrin e música de Bach. “A idéia da Companhia é dançar balés tanto do século XIX quanto os contemporâneos, preocupando-se com um diálogo entre os diversos momentos da dança. Com a Companhia, uma pessoa pode amar o balé clássico, mas vir assistir a um espetáculo contemporâneo”, diz Inês, que completa, “por isso, ter estreado com Polígono foi essencial. Esse balé apresentava essa diversidade de forma bastante particular e muito acentuada. Em um momento era possível ver um clássico bastante estruturado e em outros você via algo bem contemporâneo”.

Com o próximo espetáculo, que estréia em novembro, a São Paulo Companhia de Dança mostrará a diversidade de seus bailarinos e do seu repertório, com a apresentação de peças que representam três momentos da dança. A primeira será Les Noces, balé russo do início do século XX. A segunda, Entreato, é uma dança contemporânea do coreógrafo brasileiro Paulo Caldas, que criou essa peça especialmente para a Companhia. A terceira, Serenade, de 1935, do coreógrafo russo George Balanchine, é a peça que marca o início do balé neoclássico.


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