Tropa Elite 2 e nossos políticos, ossos duros de roer

Uma força tarefa foi montada na noite de terça-feira (5), na entrada do Theatro de Paulínia, onde seria exibido, para convidados e jornalistas de todo o Brasil, o esperado Tropa de Elite 2, O Inimigo Agora é Outro, de José Padilha. Ninguém pôde entrar com qualquer aparelho eletrônico (os celulares ficaram guardados com as recepcionistas, que entregaram uma senha para a pessoa receber o aparelho ao final da sessão) e as bolsas, mochilas e sacolas foram todas revistadas. Havia, inclusive, detector nas portas de entrada do teatro. Pode parecer exagero, mas não é.

O diretor José Padilha já experimentou o amargo desprazer de ver o primeiro filme, Tropa de Elite, pirateado antes mesmo de chegar aos cinemas, em 2007. As 1.300 pessoas que lotaram o teatro gostaram bastante do que viram, pois em três ocasiões aplaudiram em cena aberta o filme. Em uma das cenas, o capitão Nascimento (Wagner Moura) espanca o personagem de um deputado estadual carioca e depois o ameaça de morte, caso alguém de sua família seja molestada (em tempos de notícias de corrupção de políticos e fichas sujas, quem não gostaria de estar no lugar do Nascimento?). Talvez por isso os fervorosos aplausos.

Anatomia do tráfico e da violência
O longa-metragem avança na história do capitão Nascimento, que agora é o comandante geral do Batalhão de Operações Especiais (BOPE). Em uma ação desastrosa no presídio Bangu I, por culpa de um dos seus subordinados, Mathias (André Ramiro) é transferido para a Secretaria de Inteligência da Polícia Pública do Rio de Janeiro. É nesse tempo presente que Nascimento começa a entender como funciona o sistema.
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Agora, o inimigo não é somente o policial corrupto, o bandido e o traficante. Ele é menos nítido, ganha outros contornos, poderes e tentáculos dentro da sociedade. São políticos corruptos, membros da segurança pública carioca e apresentadores de programas sensacionalistas com interesses políticos (no início do filme, há uma legenda dizendo que o longa é uma obra de ficção, mas a semelhança do personagem Fortunato, vivido pelo ator André Mattos, com um dos deputados estaduais carioca mais votados nas eleições deste ano, não é mera coincidência. O eleito, inclusive, é apresentador de um programa sensacionalista). Nascimento agora terá de refazer suas convicções para tentar entender quem é, de fato, seu maior inimigo.

Tropa de Elite 2 é bastante ágil nas cenas de ação e acertadamente ganha mais densidade no tratamento dos personagens. Ao ampliar o entendimento do tráfico e da violência nos morros e favelas cariocas, colocando em evidência os políticos e o poder público, José Padilha torna seu filme mais simpático perante o público. No entanto, o longa perde em sutilezas e verossimilhanças, por não conseguir compreender como, de fato, se processam os mecanismos do sistema (o filme se aproxima de teorias conspiratórias, tão em voga no cinema americano de ação de hoje). Quando Nascimento espanca um deputado estadual e nada acontece com ele, o filme perde um pouco sua relação com a realidade. Apesar de se tratar de obra ficcional, sabemos que é fortemente calcada no que acontece no Rio de Janeiro real.

José Padilha diz que faz um cinema genuinamente político. Foi assim com seu primeiro documentário, o excepcional Ônibus 174, com Tropa de Elite, com Garapa e, por fim, com Tropa de Elite 2.

“De certa maneira, Ônibus 174 e Tropa de Elite têm a mesma premissa: tentam mostrar como o Estado contribui para a violência urbana, administrando muito mal as instituições que deveriam coibi-la, como o sistema prisional, os educandários para pequenos criminosos, e as polícias. Tropa de Elite 2 retoma este mesmo tema, mas agora em um ponto mais perto das instâncias decisórias, mais perto da política. Em Tropa 2 eu não tentei produzir puro entretenimento. Tentei abordar um tema que me é caro”, explicou Padilha no press book da apresentação do filme.

Em Tropa de Elite 2, o diretor consegue esse intento (afastar o filme do puro entretenimento), mas a custa de uma simplificação que dilui o seu tema mais caro: a politicagem de alcova praticada no Brasil desde tempos idos, que gera uma sociedade desigual, violenta, perversa e animalesca. O final do documentário Ônibus 174, quando a mãe de criação do Sandro (morto pela polícia) acompanha solitária o caixão do filho e diz que ele não deveria ter terminado daquele jeito, é muito mais humano e contundente sobre nosso País do que o sobrevoo por Brasília, já quase no final de Tropa de Elite 2. Falar do quintal às vezes é mais importante do que falar da casa.

Trailer de Tropa de Elite 2

Padilha, cenas da vida real no sertão


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